Isto é, o modelo de expansão do ensino superior baseado no incremento às instituições privadas dá mostras de insustentabilidade econômica, o que, aliado ao próprio perfil acadêmico da imensa maioria dessas instituições - no geral muito distantes de atingirem a excelência das instituições públicas, especialmente no que tange à indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão - nos remete a uma visão de futuro bastante preocupante para os nossos jovens e, conseqüentemente, para o próprio "projeto de nação" (Cf. Genro, 2005) que almejamos construir.
Por outro lado, quando analisamos a distribuição das matrículas em relação ao local de instalação das instituições de ensino superior, percebemos outras dimensões da desigualdade no acesso. Em primeiro lugar, verificamos que há uma grande concentração de matrículas nas regiões Sudeste e Sul - 2.663.197 - o que representa 68,7% do total, enquanto a região Nordeste detém apenas 645.441 matrículas (16,6%), embora apresente uma população de 47.741.711 habitantes, cerca de 30% da população total do País.
|
Em segundo lugar, observamos que a situação dos jovens que moram no interior dos Estados é ainda mais dramática, pois embora no conjunto das matrículas em cursos de graduação presencial haja até uma pequena vantagem para as cidades do interior em relação às Capitais - 54,43% contra 45,67% - tão somente 33,71% das matrículas em Universidades Federais (191.421) são efetuadas em instituições localizadas no interior dos Estados. Isto representa apenas 5,08% do total geral das matrículas e 16,83% do total de matrículas em instituições públicas de ensino superior.
Em suma, o quadro atual das matrículas em cursos de graduação presencial aponta para uma realidade caracterizada pelo predomínio do ensino particular sobre o público, das regiões mais desenvolvidas sobre as menos desenvolvidas e das capitais sobre as cidades do interior no que tange particularmente ao acesso às Universidades Federais.
Os Jovens de 18 a 24 Anos
Um conjunto de dados bastante relevante para analisarmos o atual quadro da educação superior no Brasil é o que se refere aos jovens na faixa etária entre 18 e 24 anos, o principal "público alvo" das Instituições de Ensino Superior (IES).
De acordo com dados do último censo do IBGE, 5,68% destes jovens são analfabetos e 46,23% têm menos de oito anos de estudo. Ou seja, cerca da metade dos jovens brasileiros com idade para ingressar na universidade não chegou sequer a cursar o Ensino M édio. Na Paraíba, a situação é ainda mais dramática, pois esta realidade atinge nada menos do que 80% dos jovens entre 18 e 24 anos (15% analfabetos e 65% com menos de oito anos de estudos), o que coloca o Estado em 25º lugar no ranking nacional, à frente apenas do Piauí e Alagoas.
Quando, entretanto, analisamos os dados referentes aos jovens nesta faixa etária que estão cursando o Ensino Superior, a situação da Paraíba melhora bastante em termos comparativos, pois o Estado passa a figurar em 13º lugar no ranking nacional e em 2º lugar no Nordeste, superando ainda todos os Estados da região Norte.
|
É importante ressaltar, ademais, que, no Estado, em torno de 70% das matrículas em cursos de graduação presencial estão na rede pública (Cf. MEC, 2004), o que demonstra que a estratégia de interiorização do ensino superior público tem surtido efeitos bastante positivos no quadro educacional da Paraíba. Com efeito, a criação do campus da UFPB em Campina Grande na década de 1960, a fundação da Universidade Estadual da Paraíba (atualmente com campi em Campina Grande, Guarabira e Catolé do Rocha) na década de 1980 e a criação dos campi de Areia, Bananeiras, Patos, Sousa e Cajazeiras da UFPB nas décadas de 1970 e 1980 colocam o Estado numa posição de destaque em nível regional e nacional. É o que podemos concluir a partir da comparação entre a razão entre o número de matrículas em IES e a população dos Estados nordestinos, conforme o gráfico abaixo.
A criação da Universidade Federal de Campina Grande, em 2002, através do desmembramento dos campi da UFPB instalados no semi-árido da Paraíba, veio a dar um novo impulso à interiorização do Ensino Superior no Estado, pois a autonomia conquistada recolocou na pauta da sociedade a necessidade de aprofundar o processo de inclusão universitária das populações interioranas em face de uma demanda que cresce exponencialmente. Neste sentido, a UFCG tem uma missão a cumprir, dando continuidade histórica ao seu peculiar modelo multicampi e indo ao encontro das aspirações de educação, desenvolvimento e cidadania do povo do interior do Estado, pois, afinal, a instituição nasceu com esse modelo específico e tem experiência acumulada na prática de gestão acadêmico-administrativa descentralizada.
Ora, apesar da Paraíba estar comparativamente melhor aquinhoada do que muitos Estados quanto ao acesso ao Ensino Superior, a situação dos jovens entre 18 e 24 anos é ainda bastante dramática no Estado, pois, segundo dados do último censo do IBGE, apenas 4,71% deles estavam cursando o Ensino Superior em 2000. Assim, não há muito a comemorar, pois como ressaltou o ex-ministro Tarso Genro em discurso recente, no Brasil, "o nível de acesso é um dos mais baixos do Continente; a proporção de estudantes nas instituições públicas reduziu-se a um terço do total; o peso da matrícula nas instituições privadas de educação superior tornou-se o mais alto da América Latina". Além do mais, constatou o ex-ministro na mesma ocasião, "é dramático dizer que no Brasil de hoje somente 11% dos jovens na faixa etária de 18 a 24 anos estão na universidade, e, destes, em torno de 70% dos matriculados estudam em instituições privadas, jovens com famílias de baixo poder aquisitivo" (Genro, 2005). Com efeito, segundo o próprio ex-ministro, a situação nacional é bastante desoladora, pois, na Argentina, este percentual está próximo a 40%, na Alemanha, a 50%, na França, a 60%, nos EUA, a 80% e, no Canadá, atinge a quase 90% dos jovens nesta faixa etária (Cf. Genro, 2004).
Quando analisamos mais detidamente a situação dos jovens paraibanos entre 18 e 24 anos, verificamos tendências de forte concentração no acesso ao Ensino Superior, pois em 214 dos 223 municípios do Estado, menos de 4% deles cursa o Ensino Superior, sendo que em 58% do total dos municípios esta taxa é inferior a 1% (Cf. PNUD, 2003).
Assim, pudemos identificar grandes zonas de exclusão universitária, as "diagonais" da Zona da Mata (sob a área de influência da UFPB), do Cariri-Curimataú-Seridó e do Sertão, estas últimas em pleno semi-árido, sob a área de influência da UFCG.
Quando verificamos que, de 1998 a 2002, houve um incremento de 37% no número de concluintes do Ensino Fundamental e de 32% no de Ensino M édio (Cf. Paraíba, 2005), índices que projetam o montante de 36.000 alunos aptos a ingressarem no Ensino Superior no final de 2005, a responsabilidade pela expansão do sistema público se aprofunda. Com efeito, embora a Paraíba tenha conseguido avanços importantes no processo de interiorização do ensino superior público e também nos níveis fundamental e médio, a situação da maioria dos jovens em idade universitária é ainda bastante precária, especialmente nos municípios mais distantes.
Desta maneira, estamos diante de uma situação paradoxal: por um lado, o Estado tem um acúmulo histórico importante no que tange à interiorização do ensino superior público no Brasil, o que o coloca comparativamente em posição de destaque nas regiões Nordeste e Norte; por outro lado, a Paraíba ainda não atingiu níveis satisfatórios de oferta de educação superior, deixando a grande maioria de seus jovens alijada do acesso aos bancos da universidade.
Isto é, temos capacidades desenvolvidas e necessidades prementes: cabe a nós, que fazemos a universidade pública, colocarmos uma a serviço da outra e transformamos a realidade educacional do Estado, dando a nossa contribuição ao esforço do Governo Federal em prol da expansão do parque universitário federal, projeto em pleno curso nesta conjuntura favorável, depois de anos de desmonte do Estado, de sucateamento das instituições públicas de Ensino Superior e de concentração de oportunidades para os jovens mais abonados financeiramente.
As Metas do Plano Nacional de Educação
A expansão do ensino superior público, gratuito e de qualidade é um dos principais objetivos da Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001, o Plano Nacional de Educação (PNE). Elaborado por força do Art. 214 da Constituição da República Federativa do Brasil - a chamada "Constituição Cidadã" de 1988 - e do Art. 87 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, o PNE consolida um intenso e participativo programa de debates levado a efeito no Congresso Nacional entre os anos de 1998 e 2000 e constitui-se numa "lei de compromisso, a opção ética por um ideal de educação para o País, o pacto político e técnico por metas necessárias" (MEC, 2001, p. 15).
De maneira a atingir o objetivo da expansão do Ensino Superior no Brasil, um conjunto de metas foi definido, entre as mais importantes das quais "estabelecer uma política de expansão que diminua as desigualdades de oferta existentes entre as diferentes regiões do País" e "prover até o final da década, a oferta de educação superior para, pelo menos, 30% da faixa etária de 18 a 24 anos" (MEC, 2001, p. 67).
Conforme demonstramos acima, os números da educação superior na Paraíba colocam o Estado, como de resto todo o Nordeste, no foco prioritário da lei, uma vez que a região detém apenas 16,6% das matrículas em cursos de graduação presencial efetuadas no ano de 2003. Por outro lado, a situação dos jovens paraibanos entre 18 a 24 anos é de tal maneira dramática que exige uma ação não apenas urgente, mas, sobretudo abrangente. De fato, se, de acordo com o último censo do IBGE, há 473.609 jovens nesta faixa etária no Estado e apenas 22.307 freqüentam o Ensino Superior, para se atingir a meta determinada pela lei - isto é, prover educação superior até 2.010 para 30% jovens de 18 a 24 anos (ou seja, 142.082 jovens paraibanos) - seria necessário abrir 119.775 novas vagas em cinco anos, isto é, criar 23.995 novas vagas por ano.
É bem verdade que a meta se afigura praticamente inatingível, uma vez que teríamos que quintuplicar o contingente de matrículas em cinco anos para cumprirmos o que determina a lei, mas estes números, mais do que estarrecedores são desafiantes. Um primeiro passo tem que ser dado para a expansão do parque universitário público na Paraíba. Neste sentido, nossa meta com a criação dos novos campi é abrir mais de 10.000 novas vagas em quatro anos, o que representa cerca de 9% da meta estabelecida no PNE para o Estado da Paraíba.