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Novas tecnologias são ditadas pela sustentabilidade

Projeto elege Economia do Conhecimento como recurso estratégico do país

A inovação continua a desenvolver-se num estilo defensivo no Brasil. Ainda não se chegou àquela agressividade necessária para fazer frente aos diversos problemas que desafiam a economia contemporânea. Uma das principais razões para os resultados insuficientes é a ausência de uma perspectiva mais ampla e, em particular, ao pouco conhecimento de variáveis culturais e organizacionais que influenciam o processo.

É um cenário complexo, em que avanços importantes têm sido registrados. Avanços esses, porém, incapazes de reduzir a distância frente a outros países, como a Índia e a China, mercados emergentes, de extremo potencial para a nova dinâmica global do consumo, e onde projetos de investimentos caminham integrados a outra estrutura produtiva, baseada na sustentabilidade socioambiental.

Para destrinchar várias questões, o Projeto PIB - Perspectivas de Investimentos no Brasil elegeu a Economia do Conhecimento como recurso estratégico diante das oportunidades que se abrem ao desenvolvimento nacional. "É preciso audácia para alcançar a escala global de competitividade", avalia o professor José Eduardo Cassiolato, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "O conhecimento é hoje o principal fator de produção e o único capaz de proporcionar o desenvolvimento sustentável".

Na coordenação do debate sobre o tema, ele aponta os quatro sistemas produtivos que precisam ser priorizados para que o Brasil avance nessa frente: Tecnologias da Informação e da Comunicação; Cultura; Saúde, cujo complexo industrial engloba química e biotecnologia, farmacêutica, mecânica, eletrônica e de matérias, incluindo serviços; e Ciência, que compreende a biotecnologia, a nanotecnologia e a indústria aeroespacial. "O estudo revela um atraso estrutural, inclusive na formação de mão de obra", diz. "E está na inovação uma alternativa para driblar esse gap".

Potencial para que o Brasil arranque existe. Dinheiro também. Dos cofres da União estão reservados mais de R$ 40 bilhões para o período entre 2007 e 2010. "A oferta de crédito via Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES) tem sido recorde", diz o secretário executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Luiz Elias.

"Aos juros baixos somam-se os incentivos fiscais da Lei do Bem e a subvenção econômica à inovação, criada pelo marco regulatório em 2006". Ele destaca também o fomento de instituições como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entre tantas outras.

Mesmo diante desse ambiente favorável, Elias reconhece que é preciso superar desafios importantes para melhorar a competitividade. Um deles é a divulgação desses instrumentos existentes, desconhecidos de boa parte do empresariado, protagonista da disseminação da cultura da inovação. Nesse sentido, aponta o Manifesto pela Inovação nas Empresas, lançado recentemente pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), como um passo importante. A proposta é estreitar os laços entre o setor produtivo e o governo nos investimentos em pesquisas.

O presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Marco Antonio Raupp, destaca que a produção científica brasileira está a toda, contribuindo consideravelmente com o conhecimento mundial. Cita as cadeias petroquímica, aeronáutica e do agronegócio como modelos excelentes no tocante à disseminação das pesquisas. Mas falta, na sua avaliação, um mecanismo eficiente para difusão maciça do conhecimento a toda nação.

"Muito mais tem de ser feito para generalizar essa cultura e isso requer um esforço hercúleo de toda a sociedade", diz. "A falta de qualidade nada mais é que uma marca da desigualdade social, sinal disso é que sempre se investiu no ensino voltado para a elite".

Se o saber ainda não é visto como a solução para todas as mazelas do país, ao menos está aí o ponto de partida. A necessidade de redobrar a atenção aos investimentos em recursos humanos é consenso independentemente do sistema produtivo. Entre 2015 e 2030 o Brasil terá o maior número de jovens em idade produtiva da sua história.

Existe um potencial para se aumentar em cerca de 10% ao ano a oferta de graduados contra 3% em países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Mas para isso precisa atacar de forma sistêmica um mal secular, a má qualidade do ensino básico, fundamental e médio.

As empresas brasileiras, segundo o professor Julio Gomes de Almeida, do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), também precisam respirar inovação, seja tecnológica, nos métodos de produção ou na gestão. "Uma alavanca é a exportação, mas a política voltada aos manufaturados é morna", diz Almeida. Sem dúvida, uma indústria inserida no mercado internacional terá muito mais cancha para se adequar ao ritmo imposto pela velocidade das informações com as novas tecnologias e pela nova ordem do planeta, pautada pela sustentabilidade.

É o caso da Natura, que há mais de uma década, comprova a viabilidade de aproveitar o valor comercial da biodiversidade da floresta amazônica sem qualquer agressão ao ecossistema. É conservacionismo, mas também é marketing: a empresa ganhou o mundo pela sedução das essências que produz. "Mais do que no uso sustentável dos ativos, inovamos ao decidir atuar como coordenador de um grande mosaico de atores", diz o co-presidente do Conselho de Administração da Natura, Pedro Passos, presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI).

Para desenvolver o processo que hoje recebe elogios foi preciso arriscar. Nesse caminho, a empresa teve de tirar da gaveta o conhecimento acadêmico, além de lidar com o conhecimento das comunidades locais, cuja comunicação foi articulada pelo conhecimento das ONGs. "É uma grande confusão, que organizada resultou num valor intangível à marca".

Com essa experiência, Passos reforça a opinião de Almeida, para quem é preciso reduzir a pulverização de iniciativas. "O Brasil precisa aproveitar suas riquezas e fazer escolhas em cima das vantagens que têm", avalia. "Ao eleger áreas prioritárias, como se tornar uma economia de baixo carbono, fica mais fácil equacionar os problemas, alinhar incentivos e disseminar o conhecimento produzido".

(Valor Econômico, 14/12)


Data: 14/12/2009