topo_cabecalho
Cresce total de alunos em universidade ruim

Instituições com notas baixas em avaliações federais tiveram aumento de 11% nas matrículas em 2008, segundo censo do MEC


Universidades com notas baixas nas avaliações federais tiveram aumento de 11% no número de matrículas, aponta o Censo da Educação Superior 2008, divulgado ontem pelo Ministério da Educação. As 588 instituições reprovadas pelo governo concentram 16% dos alunos universitários do país (em números de matrículas, foram de 737 mil em 2007 para 817 mil).

O crescimento das escolas ruins é maior que o do ensino superior como um todo, que registrou um aumento de 4% no total de alunos matriculados.

 Para educadores consultados pela Folha, os dados mostram que os alunos ainda não levam a qualidade dos cursos como critério principal na hora de escolher uma faculdade.

 João Ferreira de Oliveira, professor da Universidade Federal de Goiás, afirma que o valor da mensalidade é o fator fundamental para muita gente. E que as instituições mal avaliadas crescem mais justamente porque suas mensalidades são mais baixas -a maioria das reprovadas no indicador do MEC é da rede privada.

 Já as melhores, diz, crescem menos porque têm de manter a qualidade e, para isso, não podem reduzir muito seus custos.

 Edson Nunes, vice-reitor da Universidade Cândido Mendes e membro do Conselho Nacional de Educação, afirma também que muitos alunos procuram escolas mal avaliadas porque, para eles, o simples fato de obter um diploma já significa aumento salarial. "É tão bom ter diploma no Brasil que é irrelevante de onde é o diploma."

 Corte de vagas

A secretária de Educação Superior do MEC, Maria Paula Dallari Bucci, diz não concordar com educadores que defendem o fechamento dos cursos ruins. Para ela, o correto é supervisioná-los e aplicar punições como o corte de vagas (recentemente, cursos de medicina e de direito foram punidos). Com menos alunos, na lógica do MEC, seria mais fácil melhorar os cursos. "O Brasil precisa continuar a expandir a educação superior. Mas com qualidade." O país tem menos universitários proporcionalmente que Argentina e Bolívia.

 O MEC considera reprovadas as escolas que, numa escala até 5, ficaram com 1 ou 2 no Índice Geral de Cursos - que leva em conta o desempenho dos alunos numa prova e a qualificação dos docentes (número de doutores), entre outros.

 O educador Edson Nunes critica o IGC como índice de qualidade, por comparar escolas com números diferentes de cursos, entre outros pontos.

 Já o presidente do Inep (instituto de pesquisas do MEC), Reynaldo Fernandes, pondera que, pela metodologia do IGC, sempre haverá escola mal avaliada, pois a ideia é comparar as instituições entre si -ainda que, hipoteticamente, todas tivessem bom nível.

Sobram 12 mil vagas em instituições públicas

O dado está no Censo da Educação Superior: de 2007 para 2008, o número de vagas ociosas nas instituições estaduais aumentou 9%; nas federais, mais do que dobrou, passando de 3.400 para 7.387 (aumento de 117%). Nessa conta estão incluídas universidades e institutos federais de educação tecnológica, que oferecem ensino técnico de nível superior.

 Para Reynaldo Fernandes, presidente do Inep (instituto ligado ao MEC), o fenômeno nas instituições públicas está relacionado, principalmente, aos alunos que acabam mudando de graduação, o que faz sobrar vagas nos cursos de origem.

 Outro problema é a evasão, seja por falta de dinheiro ou dificuldade de acompanhar as aulas. O secretário-executivo da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), Gustavo Balduíno, disse que esse é um problema que sempre se enfrentou nas universidades. Segundo ele, as instituições estão buscando atacá-lo aumentando a assistência estudantil, com verbas para moradia e alimentação, por exemplo, e investindo em acompanhamento pedagógico dos alunos que entram com mais deficiências trazidas do ensino básico.

 Segundo ele, também pode ter contribuído para o aumento das vagas ociosas o baixo interesse e a pouca divulgação de cursos recém-abertos, principalmente no interior do país.

 Outro problema, no entanto, pode ser um desinteresse dos próprios alunos em concluírem seus cursos no tempo certo. Para João Ferreira de Oliveira, professor da UFG (Universidade Federal de Goiás), uma justificativa pode ser a ampliação dos prazos de jubilamento. "O aluno começa a trabalhar, tranca disciplinas e acaba estendendo o curso", diz.

 Além das vagas ociosas, o censo revelou que, apesar do aumento expressivo das matrículas nas federais, o número de alunos formados caiu 6%. Segundo a Andifes, isso se deve ao término de diversas turmas especiais criadas nas universidades para professores.

 É o caso da Fundação Universidade Federal de Rondônia, que apresentou a maior queda no número de formados entre as federais: de 3.238 para 772. A federal de Rondônia afirma que em 2007 o número de graduados teve um aumento devido ao Programa de Habilitação de Professores Leigos do governo do estado, que ofereceu curso superior a professores que não tinham graduação.

Próximo do limite, ensino superior vive fusões e fechamento de escolas

Os dados apresentados ontem mostram que o modelo atual de ensino superior está próximo do limite de crescimento. Houve até redução no número de instituições (29 desapareceram; agora, são 2.252 no total), ainda que tenha ocorrido em 2008 pequeno aumento de ingressantes no sistema. É a primeira vez desde 1997 que esse número recua. Para o MEC, isso ocorreu por conta de fusões e compras de escolas.

 Pesquisadores afirmam que, como o crescimento no número de alunos se desacelerou, instituições mais frágeis não conseguem sobreviver - segundo o censo, o ritmo de expansão diminui desde 2006. "Havia uma grande demanda por universidade. A expansão ocorreu e atingiu certa estabilidade", afirmou Reynaldo Fernandes, do Inep. "Precisamos aumentar o número de alunos que saem do ensino médio e de outras medidas, como [ampliação do] Fies", disse ele, referindo-se ao programa de financiamento estudantil do governo.

 Fernandes afirma que o Prouni, programa de bolsas para alunos pobres que impulsionou as matrículas em 2006, não apresenta mais condições de ampliar os ingressos na rede. Ele admite que o país não deverá chegar à meta, presente no Plano Educacional de Educação, de ter no ensino superior 30% dos jovens entre 18 e 24 anos até o final desta década. Hoje, o índice está em 13,7%.


MEC precisa fazer algo, diz pesquisador

Ex-diretor do Instituto de Física da USP de São Carlos, Oscar Hipólito defende que o governo tenha mais controle sobre a abertura de vagas em escolas reprovadas. "Se o próprio MEC indica que essas instituições não têm qualidade, ele precisa fazer alguma coisa", afirma Hipólito, atualmente pesquisador do Instituto Lobo (consultoria de ensino superior).

- Como o sr. avalia o crescimento de matrículas em instituições reprovadas?


A divulgação das avaliações do MEC parece ainda não ter surtido efeito. Os estudantes continuam procurando essas instituições, e os que estão lá não pediram transferência. Isso vai mudar com o tempo, todos vão priorizar a qualidade.

- Qual o papel do poder público nesse ponto?

- Se o próprio MEC indica que essas instituições não têm qualidade, precisa fazer algo. As medidas anunciadas até agora, de corte de vagas em alguns cursos, parecem inócuas, uma vez que boa parte das vagas já não estavam preenchidas. Os dados mostram que escolas reprovadas continuam crescendo.

- Como o sr. avalia as universidades federais?

- O número de vagas ociosas aumentou muito. Isso quer dizer que ou o governo abriu vaga onde não precisava ou abriu em cursos sem demanda. Mostra um erro de planejamento, desperdício de recursos públicos. Outro problema foi a queda no número de concluintes. Ou estão reprovando mais ou estão evadindo. Considerando que grande parte dos jovens está fora do ensino superior, as falhas ficam acentuadas.

(Folha de SP, 28/11)


Data: 01/12/2009