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Brasil investe em ''doutorado sanduíche''

Além de mais barato, curso ajuda a evitar que bolsista não volte ao país

 

O Tribunal de Contas da União condenou, na semana passada, o engenheiro ambiental Luciano Fleischfresser a devolver aos cofres públicos R$ 282,3 mil. Ex-bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Fleischfresser decidiu não voltar ao Brasil quando terminou seu doutorado e ficou por sete anos dando aula no estado americano de Oklahoma. O engenheiro é o caso mais recente de condenação para uma prática que se tornou comum.

 

Em 2008 e neste ano, o TCU condenou 23 ex-bolsistas da Capes e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) a devolverem R$ 10,1 milhões ao Tesouro por terem se recusado a voltar ao país depois de concluídos os estudos pagos pelo governo brasileiro. Fleischfresser, hoje professor na Universidade Tecnológica Federal do Paraná, voltou ao Brasil em 2007, mas o processo continuou correndo no TCU. Procurado pelo Estado, disse que não tinha sido avisado nem quis comentar o caso.

 

Até hoje, Capes e CNPq têm registrado 316 bolsistas inadimplentes, além dos já condenados pelo TCU. São 76 na Capes e 240 no CNPq. Outros 66 fizeram acordos com os órgãos e estão devolvendo os recursos investidos na formação. Só a Capes está recebendo, em parcelas, outros R$ 2 milhões.

 

"O número é pequeno. O Brasil tem uma das mais insignificantes fugas de cérebros entre todos os países em desenvolvimento, porque nós temos emprego. Falta pessoal aqui", explica o presidente da Capes, Jorge Guimarães. "Mas não há perdão. Nos casos das pessoas que não voltam, não abrimos mão de receber os recursos de volta. A lei nos garante isso."

 

As condenações são sustentadas por uma decisão do Supremo Tribunal Federal de setembro de 2008, em que se considerou uma quebra de contrato o fato dos doutorandos não voltarem ao Brasil - essa é uma norma prevista no acordo assinado na hora da concessão da bolsa. De fato, o número de bolsistas que não retornam ao país é pequeno, especialmente se comparado a bolsas concedidas para o exterior.

 

Em 2008 foram 4,2 mil apenas na Capes, entre doutorado, especialização e mestrado. Nos últimos dez anos, mais de 30 mil pessoas foram estudar fora do Brasil financiadas pela Capes, e número semelhante pelo CNPq.

 

Ainda assim, os dois organismos (que mais concedem bolsas no Brasil) decidiram, paulatinamente, diminuir os investimentos nos doutorados plenos, em que o candidato faz todo o curso no exterior - e se concentrar no chamado doutorado sanduíche, em que parte dos estudos é feita lá fora, mas a conclusão acontece no Brasil.

 

"É mais seguro, mas também é mais barato. Com os recursos que se manda um no pleno, manda-se quatro no sanduíche", afirma Guimarães. "É mais bem selecionado, é mais eficiente." O número de doutorado sanduíche subiu de 424 em 1998 e alcançou 1.564 em 2008. Já o pleno passou de 1.106 há dez anos para 724 no ano passado.

 

Os doutorados plenos concentram-se hoje em áreas em que o Brasil ainda tem poucos cursos. É o caso das engenharias - especialmente na área marítima. "Estamos mandando doutorandos para o exterior nessa área. É um investimento necessário. O que se espera é que eles voltem a ajudem a formar novos cursos no Brasil", explica o presidente da Capes.

 

Dados gerais

 

R$ 10,1 milhões é o valor total das condenações aplicadas pelo Tribunal de Contas da União a ex-bolsistas

 

R$ 2,03 milhões é o valor que foi devolvido até agora pelos condenados

 

76 é o número de bolsistas inadimplentes na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)

 

40 é a quantidade de bolsistas que fizeram acordo

 

(O Estado de SP, 18/10)


Data: 19/10/2009