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País tem 11,5% de crianças analfabetas

Dados do IBGE apontam que entre 2001 e 2007, a redução de analfabetos com 8 e 9 anos de idade foi só de 2,5 pontos. Se a queda for na mesma velocidade, dificilmente o Brasil cumprirá a meta de ter até 2022 todas crianças alfabetizadas aos 8 anos

Apesar dos avanços, o Brasil ainda tem 11,5% das crianças de oito e nove anos analfabetas. Este percentual já foi bem maior (47% em 1982), mas, na atual década, vem caindo em ritmo mais lento, segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), do IBGE. De 2001 a 2007, a redução foi de apenas 2,5 pontos.

Uma criança não alfabetizada com mais de oito anos de idade apresenta dificuldades não apenas em português, mas em todas as outras disciplinas, já que sua capacidade de compreender textos é limitada.

É normal que, a medida que um indicador melhore, seu ritmo de queda reduza. O problema é que, se continuar caindo na mesma velocidade de 2001 a 2007, o Brasil dificilmente cumprirá a meta de ter até 2022 toda criança plenamente alfabetizada aos oito anos de idade, estipulada pelo movimento Todos Pela Educação.

A situação é mais grave no Nordeste (23% de crianças analfabetas), especialmente no Maranhão (38%), Alagoas (29%) e Piauí (27%).

O dado do IBGE, porém, não dá um diagnóstico completo, pois se baseia só na informação de pais sobre se seus filhos sabem ler e escrever um bilhete simples. O instrumento que mais se aproxima deste objetivo é a Provinha Brasil, teste do MEC que avalia o nível de alfabetização no 2º ano do ensino fundamental. Como a prova é feita e corrigida pelas próprias redes, sua divulgação fica a critério do Estado ou município.

Resultados obtidos pela Folha com as secretarias que já divulgaram o exame mostram que, na cidade do Rio, em Belo Horizonte e no Distrito Federal, mais de um terço dos estudantes estavam abaixo do nível considerado adequado.

Eles não necessariamente são analfabetos, mas apresentam dificuldades até mesmo para ler frases curtas ou palavras mais complexas. No Rio e no Distrito Federal, o percentual de alunos abaixo do adequado foi de 37% e, em Belo Horizonte, 35%. São Paulo ainda não divulgou os dados.

Repetência

Para o especialista em avaliação educacional Ruben Klein, a principal explicação para o analfabetismo entre crianças cair em ritmo mais lento é a repetência na primeira série.

Uma tabela elaborada por ele mostra que a trajetória da repetência na primeira série tem comportamento idêntico ao verificado na taxa de analfabetismo aos 8 e 9 anos. Em 1982, o censo escolar do MEC registrava que 60% das crianças desta série eram repetentes. A taxa diminuiu quase pela metade até o ano 2000, quando registrou-se 32% de crianças repetentes.

O problema foi que, a partir daí, a queda se deu em ritmo mais lento e, em 2005 (último ano da série histórica do pesquisador), ela estava em 29%, uma redução de apenas três pontos percentuais na primeira metade da década.

Klein pondera que essas crianças não alfabetizadas na idade correta acabam aprendendo tardiamente. Prova disso é que, aos 15 anos, o percentual de analfabetos na Pnad oscila entre 1% e 2% desde 2002.

"Mas é uma alfabetização muito simples e grosseira, longe de ser suficiente, e que compromete a qualidade da aprendizagem, já que eles chegam aos 14 ou 15 anos de idade com um atraso muito grande em relação à série que deveriam estar cursando", diz o especialista.

Os dados do IBGE mostram também que a alfabetização varia de acordo com a renda. Em famílias mais ricas (mais de cinco salários mínimos per capita), aos cinco anos de idade, quase metade (47%) das crianças já se alfabetizaram. Entre as mais pobres (menos de 1/4 de salário mínimo per capita) o percentual é de 10%.

Aos sete, praticamente todas as crianças mais ricas já se alfabetizaram, mas a taxa entre as mais pobres é de 49%.

Cidades mudam estratégias de alfabetização

Logo que assumiu, na escola municipal Azevedo Sodré (zona norte do Rio), a responsabilidade de acelerar a alfabetização de 20 alunos com dificuldades, a professora Consuelo Baduê pediu que eles escrevessem bilhetes no mural com seus compromissos.

Uma das alunas da turma, de 10 anos, escreveu assim sua promessa: "Não xigrar as professoras e não jogra lixo no xão". Os bilhetes continuam pendurados no mural, mas os alunos, aos poucos, já começam a identificar os erros.

"Outro dia, esta aluna me chamou a atenção, dizendo que tinha percebido que escrevera chão com xis", conta ela.

A novidade neste ano na rede municipal do Rio foi a aplicação, no início do ano letivo, de um teste para identificar os alunos com necessidade de reforço urgente na alfabetização.

Em cada escola, eles estão sendo agrupados em turmas menores e passaram a utilizar metodologia do Instituto Ayrton Senna, que capacitou os professores para trabalhar com seu material didático.

Consuelo conta que uma das vantagens da metodologia é que os alunos passaram a ter uma rotina fixa de trabalho. "Se eu deixo de dar uma atividade, eles me cobram", diz.

Ainda não foram feitas avaliações externas na turma para verificar se houve melhorias. O que as mães mais têm verificado é o aumento do interesse pela leitura. "Percebi que meu filho passou a ler mais", diz Rosenilda Oliveira, mãe de Jeferson, 9. Mesmo relato fez Aline Azevedo, mãe de Ana Carolina, 9. "Todo dia ela leva um livro para casa e faz os deveres."

Estratégias

Outras redes que já elaboraram seus diagnósticos a partir de avaliações próprias ou da Provinha Brasil também tiveram que reforçar as ações de alfabetização de crianças.

No Distrito Federal, por exemplo, a decisão foi dobrar o número de centros de referências de alfabetização, escolas-modelo que criam uma equipe própria para ajudar outras unidades a melhorar seus indicadores. "Cada equipe é responsável por ajudar de sete a oito escolas", diz Fábio Pereira, gerente de ensino fundamental.

Em Belo Horizonte, Sérgio Eustáquio da Silva, da gerência de avaliação e políticas educacionais, diz que a estratégia foi aumentar o quadro docente.

MEC pretende ampliar rede de pré-escola

A secretária de educação básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, diz que as principais ações da União para combater o problema são a criação da Provinha Brasil, a melhoria na formação de professores alfabetizadores, a distribuição de livros adequados para crianças pequenas e o investimento em creches e pré-escolas.

No caso da Provinha Brasil, Pilar relata que seu objetivo é ser um instrumento de diagnóstico para que o professor detecte as dificuldades dos alunos.

Na formação profissional, diz a secretária, a principal iniciativa é o programa Proletramento, que capacita 280 mil professores (de 1,8 milhão) em atividade nas séries iniciais.

A ampliação da rede de creches e pré-escolas também é citada como fundamental, já que quanto mais cedo o acesso à escola, mais fácil será preparar o aluno para estar aos oito anos alfabetizado.

O MEC discute com os municípios -principais responsáveis pela educação infantil- a possibilidade de tornar a frequência à pré-escola obrigatória. Hoje, a proporção de crianças de 4 a 6 anos fora da escola é de 22%.


(Folha de SP, 12/7)


Data: 13/07/2009