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Artigo - Sobre o vestibular unificado (Parte I)

Wagner Braga Batista

 

O governo federal está implementando política de expansão e de reestruturação do ensino superior. Parte integrante desse projeto é a utilização do Exame Nacional do Ensino Médio como vestibular unificado. A proposta de adoção desse mecanismo foi encaminhada às instituições de ensino superior.

 

O que dizer sobre vestibular unificado?

 

Em princípio, algum interlocutor pode argumentar que estamos discutindo uma falsa questão. Ou seja, qualquer alternativa que incida sobre o exame vestibular não constitui uma solução, apenas posterga um problema. Adiantamos nosso pleno acordo, posto que estamos adiando uma solução que possivelmente seria encontrada com a melhoria de qualidade e a progressão automática dos estudantes dos cursos médios para o ensino superior. Acrescentamos que a opção de acesso ao ensino superior deveria ser oferecida na rede pública, assegurando o pleno direito à educação. Ou melhor, à educação progressiva e continuada que reconhecidamente se torna indispensável na atualidade.

 

Contudo, persiste uma indagação: essa opção é factível nas atuais condições de ensino do país?

O que fazer?

 

Sabemos que há uma indústria do vestibular que provocou a distorção do sistema educacional brasileiro. Graças a ela, o ensino médio tem sido direcionado para esse exame, comprometendo conteúdos, vocações e aptidões de jovens.

 

Essas distorções podem ser identificadas em vários níveis.

 

Em redes de cursinhos que se constituíram ao longo dos anos setenta para viabilizar a perspectiva de ascensão das camadas, lograda por meio da obtenção das poucas vagas oferecidas no ensino público superior de então. O regime militar eliminou a figura dos excedentes, estudantes que obtinham média para passar, mas não dispunham de vagas nas instituições de ensino superior, por meio da expansão do ensino privado. Cursinhos e instituições de ensino superior privadas foram coadjuvantes nesse desenvolvimento anômalo da educação. Alguns desses cursinhos transformaram-se em enormes e poderosas universidades pagas. Estão, hoje, entre as maiores universidades do país em número de matrículas, fazendo consórcios e atuando no país fora de suas sedes.

 

Dentro de universidades públicas, o vestibular também produziu distorções. Criou estruturas empresariais altamente rentáveis. Atividades gerenciadas por fundações, que movimentavam vultosos recursos financeiros e amplo espectro de professores e funcionários técnico-administrativos em diferentes circunstâncias cujo disciplinamento ainda está por se consumar.

 

Sob esse prisma, podemos dizer que, congênere do ensino pago, o vestibular é um grande negócio.

Diante da constatação da impossibilidade de reverter bruscamente esse quadro, somos levados a retomar a “falsa questão”.

 

Nesse debate, entre tantos outros, dois aspectos tem avultado. O primeiro é fruto de um argumento tipicamente provinciano. Apela a interesses locais para sinalizar possíveis patrocinadores de demandas não qualificadas. O argumento não está centrado na defesa do ensino público, de direitos sociais, mas de uma espécie de reserva de mercado que se preste a barganhas com segmentos sem inserção no meio acadêmico. Esse argumento, que pouco contribui para o debate educacional, foi muito utilizado por uma vertente que defendia o desmembramento da Universidade Federal da Paraíba- UFPB e a criação da UFCG em nome de Campina Grande.

 

A nosso ver é apenas um expediente ideológico. È inócuo seja para assegurar o que se propõe, seja para se constituir numa alternativa eficaz frente ao vestibular unificado. Não se materializa em proposições concretas que barrem a escalada de candidatos de diferentes origens a vagas na universidade pública. Não nos parece que seja capaz de conter essa disputa desigual e, portanto, não atende de fato às demandas de estudantes que residem em áreas periféricas onde se localizam instituições de ensino superior. Na realidade tende a se revestir de um viés supostamente clientelista.

 

A análise da participação de professores e estudantes na vida acadêmica não pode estar circunscrita a sua origem geográfica.

 

A disjunção entre elementos exógenos e autóctones é explorada de antanho. No entanto, convém lembrar que a expansão multicampi da UFPB contou com expressiva participação de “gente de fora.” Essa participação não deve ser depreciada a partir de juízos maniqueístas ou chauvinistas, posto que teve efeitos bastante controversos no passado. Produziu resultados positivos, duradouros, permanentes, bem como conseqüências pífias, fruto do esgotamento de surtos migratórios de professores. Surtos que não se reproduziram em avanços consistentes para programas instalados nos campi do interior da UFPB.

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


Data: 25/05/2009