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Piso dos professores é lei, mas ainda não foi implantado

Falta de recursos é a principal razão apresentada pelos governadores e prefeitos para explicar a não implantação plena do piso salarial dos professores

Apontada como uma dos mais importantes medidas para valorizar a educação pública do país, a Lei 11.738/08, que criou o piso nacional salarial dos professores, entrou em vigor em 1º de janeiro passado mas, até agora, produziu como principais resultados uma disputa judicial em torno de alguns de seus dispositivos e ameaça de uma greve nacional dos docentes, sob a alegação de que a maioria dos estados e municípios não estaria cumprindo a lei e pagando o patamar salarial à categoria.

As questões que se discutem no Supremo Tribunal Federal (STF) não têm relação com o valor em si do piso (R$ 950). Mas é justamente a falta de recursos a principal razão apresentada pelos governadores e prefeitos, em geral, para explicar a não implantação plena do piso salarial dos professores.

Segundo levantamentos preliminares da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), pelo menos quatro estados ainda não implantaram o piso (Goiás, Rondônia, Rio Grande do Sul e Tocantins) e aqueles que o fizeram "falharam" na interpretação da lei, provocando prejuízos na remuneração de muitos educadores. A maioria das prefeituras também não tem aplicado a lei e muitas delas praticam vencimentos vinculados ao salário mínimo.

Pelos dados do IBGE, 37% dos professores ganhavam abaixo do piso salarial nacional hoje em vigor para uma jornada de 40 horas. Para a CNTE, entre 60% e 65% dos professores brasileiros ganham menos que R$ 950. "Ainda tem professor no Brasil ganhando menos do que um salário mínimo", diz o presidente da CNTE, Roberto Franklin Leão.

O atraso no cumprimento da lei foi duramente criticado pelo autor da proposta, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), para quem governadores e prefeitos não têm justificativas palpáveis para seu comportamento. Como lembrou, há um mês o ministro da Educação, Fernando Haddad, defendeu no Encontro Nacional com Novos Prefeitos e Prefeitas, em Brasília, a implantação do piso e assegurou que o governo federal não hesitará em ajudar com o repasse de recursos necessários.

O país reflete na questão salarial dos professores a enorme desigualdade regional e social brasileira. O Distrito Federal ostenta salário inicial que é quatro vezes o piso, enquanto no vizinho e rico estado de Minas Gerais o patamar não chega a R$ 850. Isso serve de combustível para os que já acenam com uma greve geral no mês que vem.

Contribui para isso o fato de que a categoria dos professores do país, em termos de insatisfação, só perde para o Uruguai, como mostrou pesquisa em 11 países divulgada no ano passado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

O resultado foi que 83,2% dos alunos brasileiros de quarta série têm professores que reclamaram de sua remuneração. O Uruguai, campeão da insatisfação salarial dos docentes, apresentou 89,4% de alunos com profissionais que se consideram mal remunerados.

CNTE defende greve nacional

A CNTE não tem muitas esperanças de que a maioria dos estados e municípios vá implementar a lei do piso salarial em curto prazo, por isso prepara a realização de uma greve nacional para o mês de abril, como forma de pressionar prefeitos e governadores.

Segundo Heleno Araújo Filho, secretário de Assuntos Educacionais da entidade que congrega um milhão de trabalhadores da educação (a base total é de 2,5 milhões), a orientação aos sindicatos filiados é avaliar a situação local durante março e decidir que rumo tomar no dia 3 de abril, em uma reunião em Brasília.

Pelo levantamento preliminar da CNTE de meados de fevereiro, pelo menos quatro estados ainda não haviam implantado o piso de R$ 950 (Goiás, Rondônia, Rio Grande do Sul e Tocantins) e aqueles que o fizeram, em muitos casos, interpretaram a aplicação da Lei 11.738/08 "de forma a causar prejuízos na remuneração de muitos educadores". Nas redes municipais a situação seria bem mais grave, principalmente no interior dos estados do Sudeste e do Sul e nas regiões Nordeste, Norte e Centro-Oeste.

Em outubro passado, após a sanção da lei, a entidade divulgou levantamento apontando que pelo menos 12 estados tinham professores recebendo abaixo do piso nacional - na maioria, docentes formados apenas em ensino médio. Em quatro estados (Ceará, Pernambuco, Santa Catarina e Sergipe) existiam educadores que, mesmo com curso superior, ganhavam menos que os R$ 950.

- Na maioria dos estados e municípios, o piso não está sendo cumprido. Dos 26 estados e o DF, 17 têm hoje valores abaixo do exigido em lei, considerando como parâmetro o vencimento inicial, que é o entendimento da CNTE - justifica Heleno, citando um dos pontos de discórdia entre os executivos locais e a categoria dos professores, que ainda será decidido pelo Supremo Tribunal Federal.

Na interpretação da CNTE, o conceito de piso seria aquele em que nenhum estado ou município possa pagar abaixo de R$ 950 para uma jornada de no máximo 40 horas semanais, não consideradas as vantagens pessoais. Muitos estados e prefeituras, porém, têm adotado a lei, levando em conta não o vencimento inicial, mas o salário integral do professor, que inclui tais vantagens.

- A nossa orientação é que o piso tem que ser aplicado para cada sistema de remuneração. Pernambuco alega que, desde setembro passado, está pagando o piso integral. Só que os R$ 950 pagos para a professora é de quarenta horas, quando o que achamos é que seria para as trinta horas, que é a jornada oficial do estado. Deveria ser adotada a proporcionalidade para os que trabalham quarenta horas.

Segundo a CNTE, muitos professores acabaram tendo prejuízos. Um exemplo são as vantagens pessoais, que, ao invés de se manterem como valor extra, foram incorporadas ao vencimento básico, diminuindo a renda dos profissionais e extinguindo os ganhos da carreira docente.

Ministro diz que MEC pode complementar o pagamento

Há um mês, o ministro da Educação, Fernando Haddad, defendeu no Encontro Nacional com Novos Prefeitos e Prefeitas, em Brasília, a implantação imediata, pelos municípios, do piso nacional do magistério. Haddad garantiu que, após o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) dos três pontos que tiveram sua aplicação suspensa por uma medida cautelar, o MEC vai avaliar os casos em que os municípios não tiverem condições de pagar o valor e, se necessário, fará a complementação.

"O Congresso Nacional só aprovou a lei após a garantia dos recursos. Não foi um gesto irresponsável, mas louvável", disse o ministro aos prefeitos. Haddad lembrou que o governo federal fez as contas antes da sanção da lei e está preparado para assumir as despesas.

- Fizemos a conta de quanto o governo investia no antigo Fundef. Uma média de quinhentos milhões de reais por ano. Depois, quanto a União está investindo no atual Fundeb. Este ano, cinco bilhões e cem milhões de reais. No ano que vem, oito bilhões de reais. Com esses valores que estamos aportando no fundo, é possível pagar o piso salarial de novecentos e cinquenta reais - afirmou Haddad, em entrevista ao portal UOL no final de fevereiro.

Aos prefeitos, Haddad insistiu que a valorização dos professores é o caminho para melhorar a qualidade da educação.

- Vocês [prefeitos] prestarão um grande serviço à Nação se os professores tiverem destaque na sua cidade e forem vistos como as pessoas responsáveis pelo futuro país. É a partir dele [professor] que vamos motivar a escola pública, garantir o aprendizado e transformar a realidade.


(Agência Senado)


Data: 09/03/2009