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Opinião - Os agraristas e a revolução de Caio Prado Jr.

Os agraristas e a revolução de Caio Prado Jr: duas leituras indispensáveis (Parte II)

Wagner Braga Batista

 

No trabalho “Agraristas políticos brasileiros”, Raimundo Santos destaca as principais vertentes teóricas que instruíram o debate no interior do PCB.

 

No ambiente acadêmico, esse debate contextualizado oferece balizamento para a reflexão sobre os movimentos de trabalhadores rurais e sobre a reforma agrária.  Para estudiosos e militantes nessa esfera, a leitura do livro torna-se indispensável. No debate político que precede o golpe militar, os articulistas analisam a articulação anômala entre a industrialização dependente e estruturas agrárias defasadas.  Movidos pelo objetivo de transformação dessas estruturas arcaicas e de integração de amplos contingentes de trabalhadores rurais, ao seu modo, examinam singularidades do desenvolvimento do capitalismo no campo visando apontar alternativas revolucionárias. Sem perder esse foco, Raimundo analisa criticamente as formulações de Caio Prado Jr, Alberto Passos Guimarães e Ivan Ribeiro.

 

Sob esse viés, oferece uma linha de continuidade à pesquisa de intelectuais orgânicos na luta pela reforma agrária. O compromisso político desses analistas deve ser ressaltado quando muitas vezes questões dessa natureza são tratadas de modo intermitente, ficando sujeitas a estímulos pecuniários, à abertura de editais e à captação de verbas públicas. Essa prática diletante tem instruído o produtivismo estéril e tende a desprezar acúmulos teóricos e históricos, torna-se freqüente no meio acadêmico e norteia algumas ONGs. Vale enfatizar que operalidade da teoria sobre o mundo rural era imperativa na formulação dos agraristas militantes.

 

Os ensaios, ora apresentados por Raimundo Santos, tem como escopo resgatar não só a contribuição teórica desses intelectuais, mas também seu compromisso militante.

 

No segundo livro, Raimundo Santos condensa a obra de Caio Prado Jr. A coletânea pode ser vista como a consolidação do material de pesquisa utilizado para redigir outro livro de sua autoria, “Caio Prado Jr na cultura brasileira” ( Mauad, 2001). Esse trabalho reabriu a discussão sobre a tese sobre a revolução brasileira formulada em 1966.

 

Intelectual engajado, Caio Prado divergia das formulações do PCB sobre a existência de resquícios de estrutura feudal no Brasil. Argumentava que desde a colonização, a formação socioeconômica brasileira exercia papel complementar nas relações mercantis européias.

 

Caio Prado Jr, assim como outros intelectuais, a exemplo de Otávio Ianni, Francisco Wefffort, Florestan Fernandes, argüirá os móveis da ação política sob a égide do populismo e questionará a passividade do PCB, após o golpe de 64. Algumas de suas objeções ao programa e à linha de ação política do PCB instruíram correntes de esquerda que buscavam alternativas ao reformismo, no final da década de 60.

 

Em 1969, professor da USP, será cassado e aposentado por decreto. Na década de 70, foi condenado por proferir palestra para estudantes sendo acusado de incitamento à luta armada.

 

Na década de 30, Caio Prado Jr, assim como Leôncio Basbaum, procurou interpretar a dinâmica do capitalismo periférico aplicando método de análise marxista. Sua ótica enfatizará relações comerciais como fatores preponderantes na formação socioeconômica brasileira, colidindo com a visão clássica marxista que acentua o papel da produção material e das classes que dela se originam. Sua hermenêutica marxista indicará singularidades da produção social, da sociedade civil e do Estado nascentes. Sem ser citado, influiu decisivamente na obra de Celso Furtado, “Formação econômica do Brasil” (Fundo de Cultura, 1959) e, servindo como contraponto, em outra trabalho impactante, “O escravismo colonial”, de Jacob Gorender.( Editora Atica, 1978)

 

Intelectual e militante político, ao longo de sua vida participou ativamente das lutas sociais no Brasil. Sofreu privação de direitos, exílio e prisão em várias oportunidades, falecendo em 1989.

 

O livro “Caio Prado Jr : Dissertações sobre a revolução brasileira” revisita textos clássicos distribuídos em quatro seções: a formação social, a revolução periférica, a política contemporânea e a reforma do mundo rural. Precedidos por uma extensa introdução de Raimundo Santos, ensaios de Caio Prado são cotejados com os novos horizontes que se descortinam para a esquerda após o colapso do socialismo real.

 

No ano do centenário de seu nascimento, Raimundo Santos presta justa homenagem a esse intelectual. Outra obra de significativa importância para a compreensão do pensamento de Caio Prado, também está sendo lançada em 2007. Trata-se do livro de Paulo Teixeira Iamutti, “Caio Prado Jr.: uma trajetória intelectual”, editado pelo Brasiliense. Assim como Raimundo Santos resgata o vigor crítico e a altivez da figura pública desse valoroso militante da esquerda brasileira.


Data: 10/12/2007