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Haddad defende lei de responsabilidade no ensino

Para o ministro da Educação, ação poderá ser contemplada no futuro; na entrevista, Haddad defende ainda o Inep após correção de erros em pesquisa

A
divulgação das medidas do PDE (Plano de Desenvolvimento da Educação) e dos resultados do Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), novo indicador de qualidade do ensino, evidenciou mais uma vez a necessidade de reformulação no setor com a constatação de que apenas 0,8% dos municípios têm, hoje, patamares de qualidade considerados ideais.

O principal personagem do novo plano - o ministro da Educação, Fernando Haddad, 44- afirma que alguns pontos que receberam críticas de especialistas podem ser contemplados em ações futuras. Um deles é a criação de uma Lei de Responsabilidade Educacional que, assim como faz a Lei de Responsabilidade Fiscal, crie mecanismos de punição a prefeitos que não investirem adequadamente no setor.

"É do interesse do MEC discutir a criação de uma lei de responsabilidade educacional. A sociedade poderá amadurecer a idéia com nosso apoio", disse o ministro da educação em entrevista à Folha.

Ele defendeu também o Inep, órgão responsável pela divulgação das estatísticas educacionais, das críticas por causa da revisão da média de algumas cidades, especialmente São Paulo, na Prova Brasil (exame do MEC que avalia qualidade). Segundo Haddad, houve um erro na leitura de algumas provas, o que levou o MEC a corrigir as notas e informar as cidades.

Veja a entrevista

- Uma das críticas ao plano é que os municípios que aderirem ao plano receberão mais recursos, mas o prefeito que não se mover por causa dos maus resultados não sofrerá nenhuma conseqüência. Não está na hora de criar uma Lei de Responsabilidade Educacional, como já sugeriu o ex-ministro da educação Cristovam Buarque?

- Já existe um mecanismo em nossa Constituição, no capítulo que trata da intervenção da União em Estados e municípios, que diz que um dos fundamentos para que essa ação ocorra é o não cumprimento do investimento mínimo de 25% da receita de impostos em educação. É preciso lembrar que, pela primeira vez, condicionamos [com o PDE] a transferência de recursos adicionais da União a metas bem claras a serem atingidas. É um passo muito importante e que pode evoluir para uma Lei de Responsabilidade Educacional. Isso é algo que o MEC tem interesse em discutir e que a sociedade poderá amadurecer com nosso apoio. Não há nada que impeça que o Executivo ou o Legislativo proponham um projeto de lei nessa direção, mas acredito que nosso papel nesse momento é criar antes um ambiente social favorável à mudança.

- Sabe-se, por meio de vários estudos, que os alunos que passam mais tempo em sala de aula aprendem mais. Por que o MEC não foi mais incisivo e propôs ampliação da carga horária mínima, que hoje é de apenas quatro horas?

- Essa crítica desconsidera que, pela primeira vez, as regras de repartição do Fundeb [fundo que distribuirá verbas de acordo com o número de alunos em todo o ensino básico] prevêem uma indução da escola em tempo integral. O fundo prevê remuneração adicional para cada matrícula em escolas de tempo integral. É óbvio que podemos discutir uma proposta de expansão da escola de tempo integral, mas dizer que o plano não prevê mecanismos indutores é desconsiderar um dos elementos mais ricos da regulamentação do Fundeb e que não constava do Fundef [fundo criado em 1996 e restrito ao ensino fundamental, que antecedeu o Fundeb].

- Outra crítica é a previsão de construção com recursos federais de apenas 400 creches ou pré-escolas por ano. Especialmente em relação às creches, parece insuficiente, já que hoje 13% das crianças de 0 a 3 anos estudam. Por que tão pouco?

- É preciso considerar que neste ano, pela primeira vez, o ministério terá um programa específico para a ampliação da oferta de educação infantil pela construção de novas unidades. Além disso, o Congresso, em comum acordo com o executivo, inclui no Fundeb a proposta de incorporar no rateio dos recursos as creches conveniadas [não administradas diretamente pelas prefeituras], desde que sejam gratuitas, tenham condições iguais de acesso a todos e sejam creches comunitárias. O investimento previsto para este ano, de R$ 200 milhões, pode sofrer alterações na elaboração do Plano Plurianual. Estamos aguardando o Congresso finalizar a regulamentação do Fundeb para, a partir daí, estabelecermos projeções mais adequadas para a ampliação da educação infantil.

- Com relação à remuneração do professor, há quem defenda que o piso salarial leve em conta o desempenho do docente. Outros criticam a idéia de vincular ao menos parte do salário ao mérito. Qual sua posição?

- Eu concordo com a idéia de que o piso seja incondicional. Sugerimos o valor de R$ 850 para esse piso após resgatar um compromisso assumido pelo governo em 1994 de fixar um patamar mínimo de R$ 300. Corrigindo para valores de hoje, chegamos aos R$ 850 por uma jornada de 40 horas. Hoje, 39% dos professores recebem menos do que isso. Para professores em início de carreira, esse percentual chega a 55%.

E quanto à remuneração, para além do piso, que leve em conta o desempenho?

- Essa é uma questão que deve ser tratada no momento de discussão das diretrizes do Plano de Carreira. Há hoje um projeto tramitando no Congresso sobre esse assunto e é este o local adequado para discutir essa questão.

- O MEC divulgou, no ano passado, ano eleitoral, dados errados na Prova Brasil a respeito do desempenho das redes municipais de SP, Porto Alegre e Belo Horizonte, entre outras. O que aconteceu? Isso não trouxe prejuízo político?

- Os dados que foram revistos nada têm a ver com a posição do sistema estadual de SP na Prova Brasil. Eu me lembro bem que o que se questionou na eleição [ao candidato Geraldo Alckmin, do PSDB] foi a não participação integral de SP na Prova Brasil e o desempenho do sistema estadual paulista, que nada tem a ver com a rede municipal da cidade de São Paulo. Quanto ao erro, o Inep recebeu da instituição que aplicou as provas [a Fundação Cesgranrio] os dados das provas e fez a divulgação. A informação que eu obtive da instituição do RJ foi que houve erro na leitura ótica de alguns cartões de resposta, o que fez com que o sistema não considerasse algumas respostas corretas, ou porque havia rasura ou porque a máquina que processava os cartões dos alunos [da 4ª série] não conseguiu ler as respostas adequadamente. Quando o erro foi constatado, foi feita uma releitura de todas as provas e foi possível ao Inep divulgar as médias corretas aos sistemas.

- Mas essa correção só veio à tona porque a Folha detectou o erro. Por que isso não foi comunicado à imprensa?

- Esse erro só foi constatado no final do ano passado, e ainda não sabíamos ao certo o grau de correção que seria feito. Os sistemas, no entanto, foram informados da correção.

- Os dados de aprovação em algumas cidades também parecem ter erros, o que prejudicou a posição delas. A cidade com menor Ideb, Ramilândia (PR), tinha segundo o censo uma taxa de reprovação de 93% dos alunos, o que parece praticamente impossível. Como evitar distorções como essas?

- Estamos alterando profundamente o Censo Escolar. Hoje, ele é feito por meio de um preenchimento de um formulário em papel. No caso dessa cidade, a prefeitura reconheceu que houve erro no preenchimento, ou seja, não foi um equívoco do Inep. Estamos reformulando o censo, que passará a ser feito por aluno. Em vez de a prefeitura informar apenas quantos alunos estão matriculados e qual a taxa de reprovação, ela terá que informar também o nome de cada aluno, o que permitirá o acompanhamento individual e praticamente afastaremos o risco de erros.

- Para melhorar sua posição, não há o risco de prefeituras aprovarem automaticamente os alunos?

- Na minha opinião, o Ideb foi construído de maneira justamente a evitar que isso ocorra [o índice é calculado a partir das taxas de aprovação e do desempenho das escolas na Prova Brasil]. Se uma prefeitura aprovar automaticamente seus alunos, o desempenho dela vai ficar prejudicado quando eles forem avaliados.


Data: 30/04/2007