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Opinião - UFCG: 5 anos de existência (parte III)

Wagner Braga Batista

Professor

 

Hoje, a UFGC apresenta enormes descompassos. Esses hiatos não serão identificados apenas por intermédio do discurso laudatório e da análise quantitativa. Essa análise é precária porque não aprofunda o exame dos dados apresentados.

 

Pouco contribui para a identificação e verificação da dinâmica ambígua da universidade (instituição pública que viabiliza interesses privados). Não esclarece seus móveis e dificulta a percepção de suas reais diretrizes e obstáculos. Com isso impede que virtuais beneficiários da educação extraiam significação dos objetivos da universidade, mantendo-se na órbita de projetos e de ações efetuadas em seu nome, mas que não lhes conferem resultados proveitosos. A análise dos objetivos da universidade deve ser efetuada a partir dos seus resultados sociais. Ou seja, do alcance de projetos educacionais aos quais esses objetivos estão relacionados. Senão estaremos nos deixando levar pelo doutrinarismo ou por expedientes publicitários de seus proponentes.

 

A UFCG desenvolve-se em meio à permanente tensão entre objetivos públicos e privados. Ressaltamos que projetos educacionais não devem ser aquilatados pelo significado que lhe atribuem seus autores, mas pelos direitos que facultam aos seus beneficiários na sociedade. Sob essa ótica, a proposta de expansão da UFCG torna-se mais cristalina. Se antes fazíamos ressalvas à perspectiva de ampliação do ensino público, hoje reconhecemos que, apesar de suas distorções, essa proposta deve ser apoiada criticamente. Não podemos ser reticentes em relação à ampliação e à melhoria da educação pública em todos os níveis.

 

Contudo, se falamos em melhoria do padrão educacional, em condições de trabalho insuficientes e em deficiências do alunado, faz-se oportuno falar também de avaliação acadêmica.

 

Um dos problemas básicos da UFCG é a falta avaliação de seus objetivos e de suas atividades. Avaliação que não se limite a ser uma radiografia ou um registro contábil, uma simples homologação do que está sendo feito.

 

Sentimo-nos muito à vontade para tocar nesse assunto polêmico, posto que de longa data insistimos nessa tese. Em educação, os primeiros a ser avaliados devem ser os educadores. Essa formulação não é recente, foi feita em meados do século XIX.

 

Grosso modo, a UFCG enfrenta os mesmos problemas e limitações que todas as instituições públicas de ensino superior. Tem potencialidades e deficiências assim como outras instituições similares. A depender da ótica, tal ou qual problema é enfatizado ou desfocalizado. Graças a esse artifício são destacadas e valorizadas soluções tópicas e cosméticas ao gosto dos que administram a universidade. Enquanto isso problemas crônicos permanecem obscurecidos.

 

Como toda universidade emergente, a UFCG carreou expectativas de diferentes tipos. De criação de uma universidade nova, bem como de superação de vícios e de ranços trazidos da UFPB. Porém, a autonomia conquistada ainda não logrou esse intento. Ainda há centralização administrativa, favorecimento e disparidades entre as unidades que compõem a UFCG.

 

O desmembramento, apesar de polêmico, não foi traumático. Contando com a paradoxal anuência dos dirigentes da UFPB, teve algumas complicações posteriores provocadas pela partilha do patrimônio. As maiores dissensões estavam por eclodir. Ocorreram devido à reivindicação da paternidade e da administração da nova universidade.

 

Nos bastidores e nos colegiados superiores, desenvolveu-se uma luta sem quartel pela nomeação do reitor pro-tempore. Parlamentares e ex-dirigentes foram mobilizados por articulações que desconsideraram a autonomia da universidade e a perspectiva da eleição direta do novo reitor. Daí a nomeação do Reitor pro-tempore ter ocorrido somente um mês após o decreto de criação da UFCG.

 

As diatribes não cessaram. No período subseqüente à nomeação ocorreu o travamento da universidade. Não aquele observado habitualmente pelo absenteísmo ou pelos atrasos a compromissos, mas por estratégias de obstrução intencional da universidade, para creditá-lo à má administração.

 

À tática da obstrução se somou a falta de recursos orçamentários durante alguns meses após sua criação. Várias ações administrativas ficaram paralisadas, prejudicando o funcionamento da universidade. Não estamos convalidando objetivos de ações administrativas, mas, isto sim, assinalando a irracionalidade do boicote. Como numa luta de foices no escuro, todos saímos perdendo.

 

Embora tensões e refregas tenham sido atenuadas, dissensões decorrentes da criação e da implantação da universidade ainda persistem. Podem ser consideradas salutares, contudo parecem-nos pouco substantivas, posto que não estão ancoradas num projeto de universidade. Sob esse prisma, são capazes de esporadicamente mobilizar grupos de professores, funcionários e alunos, mas não preenchem um grande vazio na universidade provocado pela falta de um projeto coletivo. É sensível a falta de projeto de coletivo e de envolvimento da comunidade universitária na sua construção.

 

Os tempos são outros. Tempos de adesões circunstanciais e de fisiologismo. Essas práticas também penetram a universidade pública.

 

Projetos de maior alcance social e educacional, aos poucos foram deixados de lado. Tornaram-se peças doutrinárias, sacadas eventualmente por entidades de representação. Não se consubstanciam em compromissos efetivos no dia a dia da universidade. Não se traduzem de forma cristalina no trabalho docente, nem na militância sindical. Subsistem por meio de intervenções residuais em meio à maré montante do corporativismo e do individualismo que campeiam no atual contexto.

 

É forçoso reconhecer que após um longo período de conquista de direitos sociais, vivemos uma conjuntura regressiva. Estimula inclinações pessoais e vantagens restritas, em detrimento de direitos sociais, de reivindicações mais abrangentes. Há um vácuo que separa professores. Afasta professores de alunos. Cria enormes distâncias entre professores e funcionários.

 

Na falta do projeto coletivo, prosperam as estratégias e expedientes de subsistência individual que impedem a formação de linhas de convergências mais coerentes. Dificultam a criação de identidades mais sólidas centradas na realização de objetivos educacionais.

 

Atualmente temos a convicção de que a tendência de modernização conservadora é dominante. Tem sido bafejada e aliviada pelos ventos de uma política de coalizão e de cooptação praticada pelo governo Lula. Essa tendência tem como signo, o adesismo. Falaremos disso adiante.

 

Dissensões internas estão fundamentadas na perspectiva de ascensão de grupos de interesses, não têm lastro político-ideológico, nem tampouco um projeto acadêmico consistente para a universidade pública. Portanto, vicejam ao sabor das circunstancias e de embates ocasionais por questões secundárias.

 

A eleição para reitor, realizada em 2005, revelou esse traço. Postulações dos candidatos majoritários não se diferenciavam substancialmente. Ambos apelaram à eficácia gerencial, fragilizada diante da contemporização de problemas internos, tanto no âmbito da UFCG como no CCT. Beneficiando-se de assépticas normas do processo eleitoral, os candidatos habilmente esquivaram-se da comparação de seus programas. Nenhum questionou a fundo diretrizes políticas governamentais que constrangiam a educação e a universidade pública.

 

Como dirigentes universitários de longa data, recorreram à atualização do discurso e à modernização gerencial, contraditada pelas práticas administrativas correntes.

 

Nenhum ousou atacar um dos pontos nevrálgicos da educação pública: a falta de avaliação criteriosa e sistemática. Posto que adotar essa postura, pra valer, teria sérias implicações. Seria tocar o dedo na ferida da UFCG, ameaçando relações de coexistência com setores bastante problemáticos. A avaliação substantiva poderia comprometer acordos tácitos, bem como a imagem de realizações capitalizadas por meio de estratégias de marketing. Pior, colocaria em risco o apoio de segmentos da universidade beneficiários da complacência administrativa, provocando a ruptura de delicadas alianças, preciosas para assegurar a eleição dos candidatos.


Data: 18/04/2007