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Opinião - UFCG: 5 anos de existência (parte II)

Wagner Braga Batista

Professor da UFCG

 

A UFCG é uma realidade. Um projeto controverso, ainda assim disputado por todos aqueles que defenderam sua criação. Como assinalado anteriormente, o autor do artigo esteve em campo oposto, defendeu a manutenção da integridade e da estrutura multicampi da UFPB, então a sexta maior universidade do país.

 

O processo de privatização do ensino superior avançava célere, impulsionado por política de governo. Suas conseqüências saltam aos olhos.

 

Em 2004, entre as dez maiores instituições de ensino superior por número de matrículas, 7 eram privadas e as outras três públicas, universidades estaduais: USP, UEG e UEPi. Duas apresentando redução do número de matrículas. Dessas três, a universidade paulista mantinha elevado padrão de desempenho, as outras duas, encontravam-se entre as piores. 

  

 

Instituição

 

Al. 2004

 

Al. 2003

 

Cresc %

A e B no provão %

D e E no provão  %

Universidade Estácio de Sá

104346

100617

3,7

29,1

14

Universidade Paulista

92210

92023

1,3

13,1

38

Universidade Luterana do Brasil

47883

41450

15,5

35,2

18,2

Universidade Salgado Filho

47557

34719

33,1

12,5

51

Universidade de São Paulo

46114

44281

4,1

74,8

18,6

Centro Universitário Nove de Julho

39931

29374

35,9

14,6

22,9

PUC (MG)

36903

36749

0,4

53,8

5,3

Universidade Presidente Antonio Carlos

35755

27791

28,7

22,8

26,6

Universidade Estadual de Goiás

33431

34113

-2,0

14,5

43,4

Universidade Estadual do Piauí

33268

35683

-6,8

3,0

64,8

 

 

Frente a esse registro, o que podemos indicar?

 

Há instituições privadas, a exemplo da Estácio de Sá, Barra da Tijuca, RJ, que oferecem o quarto turno, de madrugada. Outra dispõe de programas de educação a distância com um número de estudantes matriculados superior ao da UFCG, ULBRA, Canoas, RS.  Cursos de fins de semana, seqüenciais e especializações ampliam esse menu de oportunidades de acesso ao ensino superior. Há mecanismos de cooptação de estudantes que usam a isenção de taxas, bolsas parciais, facilidades de crédito, para provocar a migração de alunos. Têm como resultados o aumento do índice de evasão e o preenchimento de vagas ociosas em instituições privadas. As metas apresentadas pelo MEC visando reduzir a evasão, estimada em 40%, e aumentar o número de formados, projetando para 90% dos matriculados no prazo de 10 anos, parecem-nos insólitas. Prevêem a criação de dispositivos para coibir esses estratagemas utilizados pela rede privada?

 

Por essa via, democratização do acesso não significa necessariamente inclusão. Não promove a cidadania. Não valoriza a educação, nem tampouco estrutura um sistema educacional consistente.

 

Por outro lado, instituições públicas de ensino superior mostram-se refratárias a iniciativas que poderiam fazer frente à escalada privatizante, entre elas a criação de cursos noturnos.

 

A luta em defesa da ampliação do ensino público e gratuito é indissociável da melhoria de seus padrões de qualidade. Senão pode se constituir num embuste proporcionado pelo aumento da cobertura de matrículas efetuado graças ao empobrecimento das condições educacionais e ao rebaixamento dos padrões de ensino.

 

O uso de dados quantitativos é um recurso bastante empregado para escamotear deficiências educacionais. A quantidade pode ser um critério de qualidade, porém a quantidade tem que ser qualificada, senão converte-se num artifício para mascarar o ensino de baixa qualidade, banalizando a formação educacional.

 

Esse expediente, utilizado abusivamente no governo FHC, particularmente no ensino fundamental, pode estar sendo reeditado na atual conjuntura com o ensino público superior. Vamos deixar essa reflexão para outra oportunidade.

 

No processo que culminou com a prevalência do desmembramento da UFPB, duas teses centradas em aspectos acadêmicos apresentaram-se no debate. A primeira, fixava-se na defesa da excelência acadêmica da nova instituição, enxuta, auto-suficiente e autônoma da UFPB. Seu modelo de desenvolvimento era inspirado no antigo CCT. A segunda, centrada em argumentos conjunturais, enfatizava as diretrizes políticas do governo FHC, defendia o caráter público e a  estrutura multicampi da universidade passível de desmembramento. Advertia para as implicações da divisão de universidade de porte, periférica, isolada, num contexto político bastante adverso, marcado pela escalada da privatização da educação pública.

 

Os argumentos dos que contextualizavam a proposta de criação da UFCG chamavam a atenção para o momento político de clara emulação ultraliberal. Questionavam a tentativa de se referendar no campo educacional pressupostos ultraliberais num quadro de vulnerabilidade de instituições públicas. Alertavam para o significado de postulações competitivas, de auto-suficiência, do empreendedorismo, da diferenciação de instituições de ensino, de áreas de conhecimento e do magistério, bem como da mudança de regimes de trabalho.

 

A análise conjuntural apontava a influência de diretrizes de agências financeiras multilaterais propondo o constrangimento do ensino público superior, a dissociação de suas atividades básicas ( ensino / pesquisa e extensão), a fragmentação de instituições de ensino e a valorização do produtivismo. Não é demais observar, que algumas destas diretrizes hoje estão embutidas na metodologia de avaliação das instituições de ensino utilizadas pelo Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior- SINAES.

 

Seduzido por esse discurso, seleto grupo de professores doutores apresentava-se informalmente como interlocutor preferencial para tratar de assuntos afetos à criação da UFCG. Pretendia-se baluarte de um futuro centro de excelência, polarizado pelo CCT. Imbuído de prerrogativas, conferidas pela titulação, sentia-se no direito de se sobrepor aos seus pares e a outros segmentos da comunidade universitária para definir diretrizes institucionais.

 

Após a criação da UFCG, essa conduta restritiva também iria se manifestar na definição de perfis e em normas eleitorais que alijavam integrantes da comunidade do processo democrático. Visualizando horizontes desenhados pela ideologia da globalização, esse grupo de professores não atentava para a vulnerabilidade de instituições públicas isoladas e situadas em região periférica.

 

Seu paradigma, a universidade de primeiro mundo, abandonara o projeto humboltiano, a educação propedêutica, concebendo o ensino superior à luz de competências exigidas para a integração ao mercado de trabalho globalizado. Despojada de horizontes críticos, a universidade de países periféricos tornar-se-ia um elemento estratégico da economia globalizada e da integração passiva aos ritmos de desenvolvimento de seus setores dinâmicos. Áreas de conhecimento que não se encaixassem nessa estratégia estariam condenadas à inanição.


Data: 17/04/2007