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Opinião - O difícil acesso

José Edílson de Amorim

Vice-reitor e pró-reitor de Assuntos Comunitários da UFCG

 

 

Uma constatação óbvia: o vestibular só existe porque existem mais estudantes que concluem o ensino médio do que vagas nas universidades públicas. A competição se intensificou tanto que todos os elementos que a envolvem são questionados – a universalização do ensino médio sem padrão universal de qualidade; a elitização da universidade cujas vagas são conquistadas pelos mais ricos; os cursinhos que estimulam o modelo de seleção informativo e memorizador.

 

Tudo isso tem gerado a inversão perversa já diagnosticada pelos inúmeros gestores educacionais: os alunos pobres não entram na universidade pública porque os que podem pagar escolas caras, no ensino médio, açambarcam as poucas vagas que esta oferece. No caso particular da UFCG, é bom lembrar que a inversão apontada não é universal; há um percentual considerável de estudantes pobres em seus cursos.

 

De qualquer forma, não se trata de fazer uma resolução simplista dessa equação, ou seja, capacitar os alunos da escola pública para que eles conquistem as vagas na universidade e, assim, deixem de fora os alunos da escola privada. Se a equação fosse linear assim, somente exacerbaria a competição: o número de alunos com potencial competitivo cada vez mais aumentaria para disputar o mesmo número de vagas.

 

A situação exige, como primeira medida, o aumento das vagas na universidade pública. Como esse aumento não ocorre no mesmo ritmo da demanda, buscam-se fórmulas para diminuir as mazelas da concorrência brutal.

 

Nessa busca, o ENEM aparece como alternativa. Os que defendem o aproveitamento deste processo de avaliação se baseiam na concepção das suas provas, tidas como qualitativamente melhores do que as provas dos vestibulares: em vez do apelo à informação e à memorização, o ENEM investe em um modelo reflexivo e interpretativo, mais apto a perquirir a formação do aluno.

 

Para uns, entretanto, o ENEM poderia ser aproveitado com um complemento: após selecionado, o aluno entraria em um processo seletivo por área ou por curso. Em qualquer dos casos, o ENEN não poderia estar sujeito às vicissitudes jurídicas e aos humores da conjuntura política imediata embora devesse ser revisto a cada ano.

 

Mas a simples adoção desses mecanismos de seleção não resolve o problema central: o gargalo que se cria entre médio e a universidade. A hibridização do ensino médio, com a formação geral que habilita para o acesso à universidade mais um ano de formação profissionalizante, talvez contribuísse para distribuir no tempo a demanda hoje concentrada logo após a conclusão do terceiro ano. Isso porque a necessidade de trabalhar mais cedo levaria parte dos concluintes a buscar, primeiro, o trabalho e, depois, a universidade. Ou mesmo aumentaria a demanda por cursos noturnos, a qual, se atendida, começaria a resolver o problema.

 

Todas essas preocupações visam à melhoria da qualidade dos processos seletivos. Essa melhoria começa com o amadurecimento das relações institucionais e pedagógicas entre a escola de nível médio e os cursos universitários. A administração universitária poderia pensar na instalação de uma coordenação de ensino médio em suas pró-reitorias de graduação. Quem sabe o amadurecimento dessas relações inibisse a voracidade com que os cursinhos estimulam a educação fast food da juventude.

 

Pensamos que as iniciativas apontadas aqui indicam uma direção: a ampliação das vagas no ensino superior no rumo da universalidade do acesso a todos que estão aptos a ingressar na universidade.

Algumas novidades em curso, na estrutura curricular da graduação, interessam ao debate do tema: na UFABC, recentemente criada, os alunos foram selecionados pelo desempenho no ENEM; ingressaram todos em um Bacharelado Interdisciplinar de 03 (três) anos; quem quiser parar aí, receberá um certificado de Bacharel em Ciências da Natureza por exemplo. Para o aluno que quiser prosseguir, o acesso a uma formação profissional específica será por meio de um processo que avaliará o seu desempenho durante os três anos do Bacharelado Interdisciplinar, considerando a performance nas disciplinas vinculadas à formação pela qual o aluno está optando.

 

A UNB está discutindo formatação parecida a partir do que é entendido com resgate da proposta original de estrutura curricular elaborada, quando de sua implantação, por Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro.

 

A elaboração mais detalhada sobre mudanças na graduação, no entanto, está sendo formulada pelo reitor da UFBA, professor Naomar Monteiro de Almeida Filho, a partir do Projeto Universidade Nova, apresentado em seminário que esta universidade realizou, conjuntamente com a ANDIFES e o MEC, em dezembro de 2006.

 

No final de março, a UNB realizará seminário para discutir as novas idéias. Pode ser que as propostas do ABC, da Bahia e de Brasília se encontrem nessa ocasião.

 

O MEC, por sua vez, está receptivo às idéias postas em discussão e já formulou a minuta de um Plano Universidade Nova de Reestruturação e Expansão das Universidades Brasileiras. Esse é um novo atalho da reforma universitária. Precisamos discutir.

 


 

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edilson@reitoria.ufcg.edu.br


Data: 21/03/2007