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Pesquisadores criam cérebro computadorizado na Suíça

Dez mil chips de computador atuam como células nervosas reais

Uma rede de nervos artificiais cresce em um supercomputador na Suíça - que deverá simular um cérebro natural, célula por célula. Os pesquisadores que trabalham no "Blue Brain" [Cérebro Azul] prometem novas percepções sobre as origens da consciência humana.

A máquina é linda quando acorda - as células nervosas reluzem na tela em tons pastel, correntes elétricas brilham através de um labirinto de sinapses.

Logo depois de ligado, o cérebro parece um pouco sonolento, mas suaves surtos de corrente o despertam totalmente.

Essa peça de hardware inédita consiste em cerca de 10 mil chips de computador que atuam como células nervosas reais.

Para simular um cérebro natural, parte do córtex cerebral de ratos jovens foi minuciosamente replicado no computador, célula por célula, juntamente com a estrutura das sinapses, em forma de árvore.

A simulação foi criada na Universidade Técnica de Lausanne, Suíça, onde 35 pesquisadores participam da manutenção desse cérebro artificial.

Ele funciona em um dos supercomputadores mais poderosos do mundo, mas em breve até este ficará pequeno demais. O objetivo é construir uma máquina eletrônica pensante muito maior, que em última instância replicaria o cérebro humano.

Um projeto tão ambicioso teria sido ridicularizado alguns anos atrás. "Hoje temos os computadores de que precisamos", diz o biólogo Henry Markram, 44, diretor do projeto. "E sabemos o suficiente para começar."

Markram sabe dos problemas que seu grupo deverá enfrentar. "Mas se não construirmos o cérebro nunca saberemos como ele funciona", diz.

Na verdade, houve avanços formidáveis na pesquisa cerebral nos últimos anos, mas as respostas para as grandes perguntas são tão vagas quanto sempre foram.

Como se desenvolve a consciência na orquestra elétrica das células? Como exatamente um lampejo de inteligência se acende da interação entre os genes, proteínas e substâncias mensageiras?

O modelo de Lausanne é a tentativa mais radical já feita de investigar o mistério da consciência.

A idéia é sedutoramente simples: determinar como a mente surge da biologia e replicar a biologia. É uma tarefa que exige enorme paciência e atenção aos detalhes, um processo que significa copiar a natureza uma molécula de cada vez.

Embora o primeiro cérebro artificial possa parecer simples, será um modelo útil. Os pesquisadores poderão usá-lo para reproduzir as funções do órgão real e testar suas teorias.

Conforme eles acrescentam novos processos, o modelo torna-se cada vez mais detalhado - uma espécie de projeto "wiki" da mente.

Ele também apresenta uma vantagem importante em relação ao cérebro natural, pois permite que os pesquisadores monitorem cada uma das atividades mentais simuladas na máquina.

Mas houve atividade mental?

O Blue Brain recém-nascido surpreendeu os cientistas por sua disposição desde o primeiro dia.

Mal lhe haviam fornecido impulsos elétricos quando estranhos padrões começaram a surgir na tela, com os clarões semelhantes a relâmpagos produzidos pelas células que os cientistas identificam com os processos de pensamento reais.

Grupos de neurônios começaram a sintonizar-se até que começaram a disparar ritmadamente. "Isso aconteceu totalmente por conta própria", diz Markram. "Espontaneamente."

Construindo o cérebro eletrônico

Dez mil células nervosas artificiais foram entrelaçadas em Lausanne, e os pesquisadores pretendem aumentar o número para um milhão até o fim do próximo ano.

Isso não significa que eles estejam satisfeitos: o trabalho está previsto para durar até 2015 ou mais.

Então, a menos que o projeto seja considerado demasiado ambicioso, Markram e sua equipe pretendem estar prontos para seu objetivo principal: um modelo de computador do cérebro humano completo - o que neste momento é quase uma fantasia, diante das cem bilhões de células que eles teriam de fabricar.

Os céticos se perguntam qual o objetivo de replicar coisas com tanta dificuldade, se os cientistas têm tão pouca compreensão de seu objetivo e função.

De fato, num futuro previsível ninguém saberá o que acontece exatamente nos circuitos do cérebro replicado, a não ser que parece sedutoramente autêntico para um observador externo.

Talvez os únicos que poderiam saber são os ratos que continuam existindo como sombras nesse supercomputador.

Os pesquisadores abriram milhares de crânios de ratos ao longo dos anos, retiraram seus cérebros e os cortaram em finas fatias que mantiveram vivas.

Então dirigiram pequenos sensores para cada neurônio. Eles escutaram as células disparando neurônios e interceptaram as respostas que vinham das células adjacentes.

As fatias de cérebro foram expostas a variados impulsos elétricos. Os impulsos refletiam os estímulos que podem ter sido recebidos pelos cérebros dos ratos de laboratório quando os animais cheiravam queijo ou eram assustados por uma forma.

As células reagiam - assim como faziam quando os ratos estavam vivos - enviando correntes elétricas pelo neuroplexo. Os equipamentos de medição dos pesquisadores registraram todos os sinais até que as fatias de cérebro expiraram.

No final, os pesquisadores do laboratório de Markram coletaram todo o repertório de comportamento de centenas de tipos de células em todas as situações concebíveis na vida de um rato - e o armazenaram em tabelas intermináveis.

Essa enorme pilha de dados permitiu que os cientistas começassem a construir seu substituto digital.


Data: 23/02/2007