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Saiba como está o mercado de trabalho para pesquisadores brasileiros

A taxas anuais de 12%, o Brasil tem visto crescer o número de doutores titulados. Para se ter uma idéia, apenas em 2006, 10 mil acadêmicos completaram o doutorado. No entanto, o número, que parece atender satisfatoriamente a necessidade da nação, não agrada plenamente ao governo e à própria academia. Especialistas reconhecem que, para promover o desenvolvimento do País, é preciso ainda mais. Para a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), é preciso alcançar, em médio prazo, uma meta de 16 mil títulos concedidos por ano.

 

O que ocorre é que, se pensarmos em iniciativas efetivas de desenvolvimento no País, ainda apresentamos um déficit, se comparado ao perfil de outras nações. "Na verdade, a proporção entre o número de doutores titulados e a população é muito baixa, inclusive, com relação ao PNB (Produto Nacional Bruto). Além disso, o índice de pesquisadores com tal titulação é bastante inferior se comparado a países em estágio de desenvolvimento similar", diz o presidente da Capes, Jorge Guimarães. "Desta forma, 10 mil é uma realidade modesta para os desafios do Brasil."

 

Ao contrário do que aconteceu em governos anteriores, o governo Lula investiu na expansão das universidades federais. Com isso, tais instituições passaram a absorver mais doutores em seus quadros de funcionários. Com o tempo, a academia passou a concentrar grande parte desta mão-de-obra e, na opinião de especialistas, oferece, hoje, as melhores oportunidades para profissionais com tal qualificação. "Desde 2004, o MEC (Ministério da Educação) já abriu nove mil vagas só nas federais", ressalta Guimarães.

 

O presidente da Capes reforça que mesmo com o crescimento anual de doutores, na academia - em especial nas universidades federais, ainda existem áreas, principalmente as relacionadas à Licenciatura, com déficit desta mão-de-obra. "A UFABC (Universidade Federal do ABC) - mais nova universidade federal do País -, abriu mais de 500 concursos públicos no ano passado e algumas áreas, inclusive, não foram preenchidas por falta de candidatos. As vagas para Matemática tiveram que ser preenchidas por profissionais de Física", afirma Guimarães. "É claro que em já há excessos em alguns setores, mas nenhum deles atingiu um ponto de saturação. Ainda há mais demanda do que profissionais", assegura.

 

Pesquisadores, no entanto, reclamam da deficiência no processo de absorção dos doutores no meio acadêmico. Há mais de três meses, a recém-doutora em climatologia pela Unesp (Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho), Juliana Ramalho Barros, 32 anos, espera pela abertura de concursos públicos que contemplem o seu perfil. "Atualmente, para me sustentar, dou aula em uma faculdade particular e trabalho como pesquisadora associada na UnB (Universidade de Brasília). Ou seja, para seguir com a pesquisa, que é o que gosto, tenho que me submeter a trabalhos voluntários ", conta. "E esse não é um problema de exclusividade minha. Muitos outros pesquisadores estão na mesma situação", diz.

 

Para o Ph.D em Economia pela Universidade de Southampton, na Inglaterra, Wilson Luiz Rotatori Correia, de 34 anos, a má distribuição dos doutores pelo território é outro complicador. "Há, sim, a possibilidade de vagas. O problema é que a maioria dos jovens recém-titulados quer permanecer no Sudeste ou do Sul do País, onde a concentração de mão-de-obra qualificada é maior. Sou de Minas Gerais e tenho consciência de que tive muita sorte de conseguir uma vaga aqui mesmo", confessa Correia, pesquisador e professor da UFJS (Universidade Federal de São João Del-Rei). Em sua opinião, deveria haver incentivos para que regiões como Norte, Nordeste e Centro-Oeste, carentes de profissionais titulados, pudessem atrair os doutores.

 

Fora da academia

 

Grande parte dos doutores brasileiros segue, sim, para o meio acadêmico. No entanto, essa não é a única alternativa para quem quer seguir carreira como pesquisador. Segundo o presidente do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Erney Camargo, uma das opções é a atuação sem vínculo empregatício, por meio de programas de bolsas de pós-doutorado e desenvolvimento científico oferecidas pelo próprio Conselho, pela Capes e outras fundações estaduais. "Trata-se de uma alternativa que tem auxiliado muitos pesquisadores a darem continuidade a seus trabalhos", explica.

 

Foi este o caminho escolhido pelo doutor em Farmacologia pela Unesp, Daniel Barbosa Queiróz, 30 anos. "Poderia, sim, ter terminado o doutorado e seguido para o mercado. Mas decidi continuar com a pesquisa, sendo bolsista de pós-doutorado, o que não deixa de ser um trabalho, já que recebo para isso", conta. Como a vaga é provisória, Queiróz já faz planos para o futuro. "As oportunidades no meio acadêmico são sazonais, por isso pretendo partir para a iniciativa privada, que acredito ser financeiramente mais rentável."

 

Pensando no desenvolvimento do País, que fundamentalmente depende de inovação e de investimentos pesados em P&D, é justamente na indústria que, na opinião de especialistas, deveriam estar as melhores oportunidades para os doutores. "O investimento da indústria neste tipo de mão-de-obra já acontece no Brasil, mas está muito aquém de nossas reais necessidades", afirma o diretor científico da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), Carlos Henrique de Brito Cruz.

 

E não é preciso ir muito longe para entender porque a presença de pesquisadores no mundo empresarial pode trazer ganhos não só do ponto de vista científico, mas também, econômico. Hoje, o Brasil é o maior exportador de suco de laranja do mundo. No entanto, ainda precisamos importar ácido cítrico, um dos principais componentes para sua produção. Enquanto gastamos com importação, poderíamos investir em mão-de-obra qualificada e tecnologia para suprir tal carência. "O pesquisador não tem veia empreendedora e muito menos dinheiro para criar seus próprios negócios. Daí a importância da indústria perceber nossos gargalos e investir para deixarmos para trás uma relação de dependência internacional", diz Guimarães. Na opinião do presidente, outros setores que também têm enorme potencial do ponto de vista científico e tecnológico para absorver mão-de-obra qualificada na indústria são: Biotecnologia, Gás e Petróleo, Botânica, Zoologia, Tecnologia de Alimentos e Computação.

 

Na opinião de Correia, pesquisador da UFJS, em curto prazo, uma boa alternativa seria estimular as parcerias entre universidade-empresa, a fim de aproximar a indústria da realidade dos pesquisadores e despertar seu interesse pelos investimentos em P&D. O diretor da Fapesp, por sua vez, acredita que apesar de útil, tal medida não é suficiente e lembra a importância de ações do governo em prol do interesse da indústria pela pesquisa e o desenvolvimento. "É essencial intensificar a atividade de P&D em empresas brasileiras e para isso é preciso maior apoio por parte do governo", destaca Brito.

 

Atento a esta questão, Guimarães defende que o governo vem criando políticas públicas para que a indústria perceba a necessidade e o benefício que é investir em inovação. Segundo ele, já estão sendo desenvolvidas ações de apoio para que o seguimento empresarial atraia profissionais qualificados para que, conseqüentemente, haja mais opções de trabalho para os pesquisadores. Como exemplo, ele cita a criação da PITCE (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior), a Lei de Inovação e, ainda, os auxílios oferecidos pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e pela Finep (Financiadora de Estudos e Projetos). "Empresas e doutores podem e devem trabalhar juntos para a criação de novos produtos e para a capacitação na concorrência do mercado internacional", conclui Guimarães.


Data: 12/02/2007