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Comunidade internacional aborda aquecimento global com lentidão

"Precisamos agir com mais presteza e adotar compromissos significativamente maiores. Não dá para manter a postura tradicional"

Na última sexta-feira, dia 2, os principais climatologistas do mundo anunciaram que o aquecimento global é algo "inequívoco", e previram uma catástrofe caso as emissões provocadas pela atividade humana não sejam reduzidas por meio de rápidas respostas políticas.

Representantes de 113 nações endossaram as conclusões do relatório. Mas as tentativas de traduzir esse apoio unânime em ação política já estão enfrentando fortes resistências.

De acordo com cientistas e grupos ambientais, a redução das emissões de carbono exige mudanças fundamentais na maneira como as pessoas vivem e implica em risco financeiro para as indústrias poderosas, incluindo empresas aéreas, fabricantes de carros, fazendas em escala industrial e construtoras.

Até mesmo os políticos "verdes" podem ter dificuldade em concretizar as suas boas intenções.

Um dia após a divulgação do relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima, três dos dez maiores emissores de gases que provocam o efeito estufa - China, Alemanha e EUA - deixaram claro quais são os limites do seu sacrifício.

Autoridades dos EUA, o maior produtor do mundo de gases geradores do efeito estufa, elogiaram o painel, mas reiteraram a antiga oposição do governo Bush a qualquer limite sobre as emissões.

Qin Dahe, a principal autoridade chinesa do setor climático e co-diretor do painel sobre o clima, anunciou na terça-feira, dia 6, que seu país estabeleceu o objetivo de reduzir as emissões dos gases de efeito estufa em 4% ao ano durante os próximos cinco anos.

Mas ele acrescentou que a China - o segundo maior emissor desses gases - carece de dinheiro e de tecnologia para a tarefa, quando comparada às nações mais desenvolvidas.

A chanceler Angela Merkel, da Alemanha, o segundo maior emissor do planeta, disse que apóia a redução de emissões de veículos, mas rejeitou a imposição de limites de velocidade nas auto-estradas e limites obrigatórios de emissão para os automóveis.

Catherine Pearce, porta-voz de mudança climática da organização Friends of the Earth International, afirma:

"Sempre há uma desculpa. É realmente desapontador. A messagem do relatório é que nós sabemos qual é o problema, e agora necessitamos de uma solução. Precisamos agir com mais presteza e adotar compromissos significativamente maiores. Não dá para manter a postura tradicional".

Os cientistas advertem que uma abordagem leniente do problema da redução das emissões não possibilitará a contenção do aumento da temperatura da Terra e todos os seus efeitos devastadores - da elevação dos níveis dos mares a tempestades mais freqüentes e violentas.

"Fico desapontado ao ouvir comentários como esse", afirma Julian Allwood, especialista em manufatura sustentável e professor da Universidade de Cambridge.

"Mudanças graduais não surtirão efeito. Teremos que promover uma alteração dramática na maneira como vivemos e fazemos negócios".

Ele citou como exemplo o relatório feito pelo Instituto de Recursos Mundiais que alerta que 3,8% das emissões mundiais de carbono são provenientes da utilização do cimento, um material que não pode ser reciclado.

"Precisamos pensar grande e nos perguntarmos: podemos viver sem cimento? Construir sem cimento? Ninguém está pensando em como seria um mundo com pouca utilização de carbono".

As autoridades ambientais da União Européia, que têm defendido uma agenda agressiva para a contenção das emissões, informaram que esperam usar o relatório climático como um instrumento para forçar a tomada de ações.

"Este é um instrumento muito útil para nos ajudar a implementar as nossas políticas e nos auxiliar a anunciar a urgência do problema", diz Barbara Helfferich, porta-voz de Stavros Dimas, o ministro do Meio-Ambiente da União Européia.

"Muita gente deixou de encarar esta questão com seriedade. Agora nós esperamos que os Estados membros individuais participem. Veremos como eles responderão quando as indústrias tiverem que fazer sacrifícios".

Ela disse que Dimas irá a Washington na semana que vem para discutir a alteração climática, levando a mensagem de que "os Estados Unidos não podem seguir sozinhos - temos que caminhar juntos".

Ao contrário da União Européia, os EUA se recusaram a assinar o Protocolo de Kyoto, que exige que as nações desenvolvidas respeitem limites impostos para emissões.

As empresas ocidentais de aviação, automóveis e petróleo fizeram um forte lobby contra os limites de emissões, alegando que teriam dificuldade em competir com produtos de países que não contam com padrões ambientais rígidos.

Em resposta ao relatório divulgado na sexta-feira, o secretário da Energia dos EUA, Samuel Bodman, declarou que Washington está "preocupada" com a possibilidade de os limites para emissões "causar a transferência de empregos e de indústrias para o exterior".

Mas um relatório divulgado nesta semana pela Lehman Brother Holdings recomenda que todas as companhias, em todos os setores industriais, invistam em energia sustentável para continuarem competitivas, até porque é muito provável que os governos imponham regulamentações ambientais mais duras e impostos gradativamente pesados sobre a poluição.

"Aqueles que não investirem em fontes renováveis de energia sairão perdendo", afirma Helfferich, do departamento ambiental da União Européia. "E isso inclui a indústria automobilística alemã".


Data: 09/02/2007