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Ensino débil explica desigualdade do país, dizem economistas

Em debate na "Folha de SP", Paes de Barros e Pochmann defendem abordagens diferentes para reduzir abismo entre ricos e pobres O primeiro acha que se deve direcionar mais recursos ao ensino, enquanto o segundo diz que antes é preciso maior crescimento do PIB.

A debilidade do ensino no Brasil está na origem da desigualdade social do país, concordaram os economistas Marcio Pochmann (Unicamp) e Ricardo Paes de Barros (Ipea) em debate promovido anteontem pela "Folha de SP" com mediação do jornalista Gilberto Dimenstein.

Os dois porém discordam sobre as soluções ao problema. "A educação explica grande parte da imensa desigualdade que reina no Brasil", avalia Paes de Barros. A diferença de condições de vida entre profissionais especializados e analfabetos "é gigantesca", diz ele.

"Para fazer reduzir as desigualdades pela educação, o país precisa incluir 10 milhões de jovens, contratar 1 milhão de professores e construir cem mil escolas", diz Pochmann.

Mas, ao apontar soluções, os dois divergem. Para Paes de Barros, a educação é a chave mestra para transformar o Brasil em um país mais justo.

"Temos de reduzir a disparidade de educação. Assim, o diferencial de salário vai cair." Para Pochmann, os investimentos em educação são necessários e urgentes, mas não podem ser a base para a solução das disparidades de renda.

"O apelo à educação é fantástico, mas isso é retórica no Brasil. Por que não se está fazendo escolas, postos de saúde, hospitais? Porque não temos dinheiro. Precisamos crescer para aumentar a renda."

Desigualdade salarial

Comparando a desigualdade de remuneração do trabalho no Brasil e nos EUA, Paes de Barros argumenta que o desnível de educação dos indivíduos impacta muito mais nas diferenças salariais do mercado de trabalho brasileiro do que no americano.

"Quando se compara as desigualdades por raça, gênero, entre a agricultura e a indústria, entre o norte e o sul, a desigualdade brasileira não é muito diferente da americana. É alta tanto aqui quanto nos EUA."

Segundo ele, os dois países têm situações diferentes quando calculada a diferença salarial entre trabalhadores de nível educacional diferente. Lá, o desnível entre salários de profissionais mais educados e dos que têm menor escolaridade é bem menor que no Brasil.

"Aqui, a diferença explica 93% das disparidades salariais. O que faz a desigualdade de remunerações no Brasil ser maior é nossa maior desigualdade educacional."

A desigualdade de renda no país é maior porque "somos educacionalmente muito mais desiguais", afirma.

"A nossa força de trabalho tem 12% de pessoas com Universidade completa e 12% de analfabetos. Nos EUA, não há isso. Além disso, o valor que o mercado dá à educação é muito maior no Brasil que nos EUA."

Isso é resultado da "escassez educacional" do país, explica. Além disso, argumenta, como temos pouca educação, ela é muito valorizada.

"Porque existe uma escassez de pessoas qualificadas, o salário das pessoas qualificadas fica lá em cima", diz Paes de Barros.

Ele defende que a redução da desigualdade social no Brasil passa pela redução do diferencial entre as remunerações das pessoas com muita educação e as das que têm pouca.

"Isso quer dizer que o salário relativo dos médicos e professores vai cair? Têm de cair", afirma, negando em seguida que a idéia propicie a "desvalorização" de profissionais especializados.

"Para que a sociedade tenha acesso ao conhecimento, o preço do conhecimento precisa cair", explica.

Além disso, Paes de Barros defende contenção dos aumentos de salário mínimo e ajustes na Previdência e a flexibilização das leis do trabalho.

"No combate à desigualdade, emprego é mais importante que salário. Estamos interessados em direitos que reduzam a pobreza e a desigualdade. Prefiro poder negociar uma queda de salário, com sindicato presente, para preservar empregos."

Na sua análise, o Brasil deve ajudar os idosos, mas está direcionando muito mais recursos para o setor que para os jovens, perpetuando assim a discrepância social.

"Se tivéssemos aumentado o salário mínimo menos e tivéssemos aumentado mais o benefício do salário-família, esse dinheiro chegaria mais às crianças e menos aos idosos, e teríamos uma sociedade menos desigual."

Inclusão custosa

Já Pochmann calcula que um amplo processo de inclusão social, com metas de melhora até 2020, custaria ao país R$ 7,2 trilhões, o equivalente a mais de três PIBs brasileiros.

Para ele, o país precisa de amplos investimentos em setores como saúde e educação, mas isso não é possível sem crescimento.

Para exemplificar o custo da inclusão pela educação, Pochmann comparou o Brasil com outros países. O Chile, disse, tem 85% dos jovens de 15 a 17 anos matriculados no ensino médio. No Brasil, eles são apenas 35%.

No ensino superior, apenas 8% dos jovens entre 18 e 24 anos estão matriculados. Na Espanha, o índice é de 42%. "Mas não temos 50 mil salas de aula para por esses jovens. Não temos 500 mil professores para ensinar essas crianças."

O economista estima que o processo de inclusão dos jovens que estão fora do ensino para que o Brasil se equiparasse aos níveis chilenos e espanhóis custaria R$ 1,7 trilhão.

"Não há como incluir essa gente porque não há recursos para isso."


Data: 25/09/2006