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Educação enlatada, editorial de O Estado de SP

As chamadas escolas de lata foram instaladas emergencialmente para atender provisoriamente à demanda por vagas na rede, mas havia o compromisso de substituí-las em prazo curto

Editorial publicado no O Estado de SP


No Estado mais rico do país, considerável número de alunos da capital e de várias cidades do interior continuam estudando em salas de aula improvisadas em contêineres ou em escolas feitas de metal, num padrão condenável de construção para esse fim.

No verão, as salas parecem fornalhas; no inverno, congeladores. Quem se senta no fundo das salas não ouve o que o professor diz diante do quadro-negro. Se chove, só se escuta o barulho da chuva.

 Crianças passam mal durante as aulas por causa da falta de ventilação. Promessas e mais promessas de substituição das chamadas escolas de latinha ou de latão foram feitas nos últimos anos. Houve número idêntico de anúncios de adiamentos dos prazos para cumprir as promessas.

Na rede municipal de ensino da capital na gestão Celso Pitta (1996-2000) foram instaladas 154 salas de aula em contêineres ou feitas de aço modular, que chegaram a abrigar quase 11 mil alunos.

As chamadas escolas de lata foram instaladas emergencialmente para atender provisoriamente à demanda por vagas na rede, mas havia o compromisso de substituí-las em prazo curto.

Esse prazo se arrastou. O governo Marta Suplicy pouco fez e, no início da administração Serra/Kassab, ainda havia 51 escolas e 192 salas de aula de lata em funcionamento, estas formando "puxadinhos metálicos" nos prédios de alvenaria.

Há dias, o candidato ao governo do Estado José Serra anunciou que havia acabado com as escolas de lata na capital.

Não acabou, embora tenha realizado em curto período o que não se fez em anos. Ainda funcionam 7 escolas de lata e 72 salas de aula metálicas.

As escolas, conforme assegurou o secretário municipal da Educação, Alexandre Schneider, serão substituídas até o fim do mês, livrando 7 mil alunos dos desconfortos a que estão sendo submetidos.

Outros 7 mil que estudam nos "puxadinhos de lata" só ganharão salas de alvenaria em 2007.

Se cumprido esse novo prazo, terão se passado 11 anos para livrar os alunos dos prejuízos ocasionados por uma solução "emergencial".

Na rede estadual, a situação se repete, com uma agravante: não tem prazo para acabar. Lá, as escolas de lata ganharam um rótulo oficial mais imponente: são escolas do padrão Nakamura.

Para os especialistas, não passam de estruturas metálicas absolutamente impróprias para o uso a que foram destinadas. Para os alunos, são escolas de latão.

Em outubro, medições realizadas em Ribeirão Preto por técnicos da USP de São Carlos demonstraram que a temperatura no telhado de zinco desse tipo de escola chega a 60 °C.

É uma das provas de que o padrão Nakamura - nome do fabricante das estruturas - é totalmente inadequado para abrigar crianças durante horas seguidas.

Entre 1998 e 2002, 150 escolas no padrão Nakamura foram construídas em todo o Estado para substituir as escolas de latinha - os contêineres -, instaladas entre 1978 e 1996.

O ex-governador Geraldo Alckmin havia prometido que todas as salas de lata seriam substituídas até julho de 2003, mas deixou o cargo quando ainda funcionavam 76 unidades "provisórias". O custo da substituição de cada escola é de R$ 1,5 milhão.

Segundo o governo do Estado e a Prefeitura, o problema maior para cumprir o prometido não são os recursos, mas a dificuldade de encontrar terrenos adequados para as escolas, nas proximidades das residências dos alunos.

Na capital, a maioria das escolas de latinha e de lata foram instaladas em áreas de mananciais, para atender a população dos loteamentos irregulares. Das escolas de metal da rede do Estado, 40 estão em áreas de preservação onde a lei proíbe construções de alvenaria, mas não de metal.
Prefeitura e Estado, no entanto, permitiram que loteamentos irregulares ocupassem as áreas de mananciais.

Agora precisam encontrar uma forma de, sem transgredir a lei, oferecer serviços públicos de saúde e educação a milhares de famílias que moram em locais onde não deveria haver construções.

O poder público não passaria por essa situação abstrusa se tivesse impedido, oportunamente, a invasão das áreas de proteção ambiental.


Data: 13/09/2006