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Aula Magna proferida pelo professor Lynaldo Cavalcanti

Aula Magna proferida pelo professor Lynaldo Cavalcanti, Secretário Executivo da Associação Brasileira da Instituições de Pesquisa Tecnológica – Abipti, durante a inauguração do Centro de Educação e Saúde – CES, campus de Cuité, nesta sexta-feira, 1º de setembro de 2006.

 

"Sinto-me honrado em estar aqui em Cuité, hoje, prestigiando a inauguração do novo Campus da Universidade Federal de Campina Grande. Para mim, que há décadas acredito que a interiorização do conhecimento continua sendo um dos maiores desafios a serem superados para que o pleno desenvolvimento das regiões brasileiras seja possível, esse momento é de grande importância. Desde a minha gestão, há 30 anos atrás, à frente da universidade Federal da Paraíba (UFPB), defendi e iniciei, no Estado, a interiorização das universidades. Continuo, ainda hoje, defendendo, portanto, a presença de unidades universitárias no interior, onde se ministra o ensino e se fazem a pesquisa e extensão, de modo sistemático.  Pois, somente com isso, o processo comprometedor de esvaziamento dessas regiões, em favor dos grandes centros urbanos, poderá ser atenuado.

 

A proposta de interiorização das universidades, iniciada na década de 1970, na Paraíba, quando eu era reitor da UFPB se deu pelo diferencial que o Estado tem com relação à maioria das Unidades da Federação, pois guardava características peculiares, na distribuição da sua população. Possuí cidades de porte médio – Campina Grande, Patos, Sousa, Cajazeiras, Guarabira, etc. – que desenvolveram-se no interior, o que fez com que o seu conhecimento não se concentrasse demasiadamente na capital.

 

O parque industrial da Paraíba já era, à época, relativamente modesto e recente. E a economia se baseava, também, na agricultura. O quadro geográfico era composto por minifúndio, presente na maior parte da sua extensão. O Estado apresenta razoável variação de solos e climas. Na zona litorânea e na região do brejo, as condições se aproximam das tropicais, enquanto que as do agreste, cariri, curimataú, seridó e alto serão, com pequenas variações, caracterizam-se como regiões semi-áridas. Seus solos são férteis. A proposta de interiorizar as ações da Universidade vinha ajustar-se, perfeitamente, a este quadro geográfico. A população universitária na Paraíba aproximava-se, na época, dos 30 mil alunos. Já os números do último censo do IBGE, realizado em 2000, constatam que 38.940 estudantes freqüentavam cursos de graduação no Estado.

 

A estrutura da UFPB, já então implantada, facilitaria neste sentido e criaria possibilidades de beneficiar mais o Estado do que poderia fazê-lo um único campus localizado na capital, a exemplo do que ocorre com a quase totalidade das Universidades Federais. Com isso, partia-se para a descentralização das atividades, distribuindo os seus resultados e benefícios, por todo o território paraibano. O objetivo buscado naquela época permanece, ainda hoje, como uma das formas de tentar minimizar os efeitos de polarização de populações jovens nas capitais, que têm as universidades exercido, no país.

 

A diretriz para essa ação tem como base duas orientações, identificadas ainda naquela época: o fortalecimento dos campi já existentes, nas cidades do interior e, de outro lado, buscando alternativas para ampliar as suas bases de trabalho acadêmico regular para outras localidades interioranas, com destaque para as situadas na região semi-árida. Como entendimento básico, impunha-se o tratamento adequado a cada um dos campi, de modo a respeitar e garantir suas peculiaridades. Mais do que isto, os trabalhos em cada campus deveriam ser fomentados e, sobretudo, ativados racional e estrategicamente, como parte de um todo, nunca como segmentos isolados e independentes. O apoio a cada um se daria no sentido de garantir a complementariedade das suas ações, minimizando rivalidades prejudiciais a seus propósitos e às suas relações com os demais. Dessa forma, foi identificado que a sede da UFPB, localizada em João Pessoa, deveria guardar a característica de campus pleno, eclético, enquanto que os demais campi teriam a sua ampliação e fortalecimento observadas as especificidades de cada um e em conformidade com as suas naturais vocações. Salientei, na época, que a diretriz, consubstanciada na idéia de a UFPB estender de forma incisiva, suas atividades ao longo do território paraibano, não poderia representar qualquer restrição ao desenvolvimento do seu campus principal. Nesta linha, identificamos que o campus de João Pessoa deveria se desenvolver através da ampliação do seu leque de atividades, na busca da diversificação.

 

Foram criados, então, os campi de Patos, Souza, Cajazeiras, que se juntaram aos já existentes de Areia e Campina Grande. E, posteriormente, ao de Bananeiras, que de simples colégio agrícola criado em 1924 e incorporado à UFPB em 1967, é elevado à condição de campus universitário, com a criação do curso superior de Cooperativismo. Conforme reconhecido pelo então deputado Evaldo Gonçalves de Queiroz, em 1982, na ocasião em que recebi o título de Cidadão Benemérito do Estado da Paraíba, “João Pessoa e Campina Grande, mais do que qualquer outro centro universitário, sabem o que representou para si essa exemplar descentralização do ensino superior, em termos de desafogo de uma demanda de vagas que, a cada ano, se tornava mais e mais preocupante. Por outro lado, os novos centros universitários criados (...) têm hoje a consciência de quanto estão valorizados, do ponto de vista da facilidade maior de qualificação de sua própria mão de obra e, consequentemente, aproveitamento local.

 

Atualmente, a Universidade Federal da Paraíba está estruturada com o Campus I, na cidade de João Pessoa, compreendendo os seguintes Centros: Centro de Ciências Exatas e da Natureza - CCEN; Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes - CCHLA; Centro de Ciências da Saúde - CCS; Centro de Ciências Sociais Aplicadas - CCSA; Centro de Educação - CE; Centro de Tecnologia - CT e Centro de Ciências Jurídicas - CCJ; Campus II, na cidade de Areia, compreende o Centro de Ciências Agrárias - CCA e o Campus III, na cidade de Bananeiras, abrange o Centro de Formação de Tecnólogos - CFT.

 

Ainda de acordo com os dados do Censo 2000, 2.069 alunos conseguiram chegar à pós-graduação em instituições da Paraíba. O Censo ainda identificou que no mesmo ano, mais de 800 mil estudantes cursavam o ensino médio no Estado, enquanto que 6.240 alunos estavam matriculados em cursos pré-vestibulares, no mesmo período. Esses dados demonstram a necessidade de se ampliar o alcance dos alunos do interior do Estado às universidades.

 

Na década de 1970, identifiquei que a efetivação da interiorização da UFPB deveria se dar no decorrer de toda a gestão, com observância de fatores e oportunidades conjunturais, e de natureza técnica e política, que as viabilizassem e sem que pudessem por em risco ou mesmo prejudicar o andamento das atividades sobre as quais a Universidade já mantinha. Elas deveriam, isto sim, se processar de modo concatenado com o que vinha se realizando nos campi já existentes, sob pena de provocarem descompassos indesejáveis à harmonia do conjunto.

 

Como forma de garantir a implementação e a indispensável irreversibilidade, as ações pretendidas, neste campo, deveriam estar secundadas por medidas de natureza administrativa e organizacional, consubstanciadas em adaptações estatutárias e regimentais que se fizessem necessárias de forma a garantir respaldo às unidades novas que fossem implantadas. A UFPB passaria à condição de universidade verdadeiramente multicampi, com uma sede principal e um conjunto de campi espalhados pelo interior do Estado; tudo atuando harmonicamente, dentro de uma mesma orientação geral.

 

Ao término do meu mandato como reitor da Universidade Federal da Paraíba, em 1980, a interiorização, por mim iniciada, foi interrompida e 18 anos depois (1997), quase uma geração, três novos cursos foram criados em João Pessoa, enquanto o campus de Souza continuava oferecendo apenas o curso de Direito e o de Patos matinha, até então, os mesmos cursos da época de sua criação.

 

No caso da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), desde sua criação, em 2002, ela já era estruturada em multicampi. A cidade de Campina Grande, sede da Reitoria, conta com o Centro de Humanidades (CH), o Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), Centro de Engenharia Elétrica e Informática (CEEI), Centro de Tecnologia e Recursos Naturais (CTRN) e Centro de Ciências Tecnológicas (CCT). Em Cajazeiras situa-se o Centro de Formação de Professores (CFP); em Sousa, o Centro de Ciências Jurídicas e Sociais (CCJS); e em Patos, o Centro de Saúde e Tecnologia Rural (CSTR).

 

A UFCG foi pioneira, como a primeira universidade federal do interior nordestino e, ao longo desses anos, as unidades que a compõem e que trabalham com a inclusão social e o desenvolvimento econômico da região sempre estiveram em destaque.

 

E, este ano, como parte do Programa de Expansão do Sistema Federal de Educação Superior do Ministério da Educação, o município de Cuité foi contemplado com esse campus que hoje está sendo inaugurado.

 

No Brasil, durante décadas, só houve interiorização de universidades na área de ciências agrárias. Esta realidade ganhou um forte e indispensável indutor para modificá-la. O atual governo federal tomou para si, finalmente, a decisão de criar um programa para promover e investir na interiorização. Este Campus, que tenho a satisfação de participar da inauguração, oferecerá cursos de Licenciatura em Matemática, Biologia, Química e Física e de Bacharelado em Enfermagem e Farmácia e Bioquímica. Quando plenamente implantado, o campus atenderá 2.000 alunos.

 

Esse fato que hoje presenciamos faz parte da iniciativa do MEC que, no início de agosto, anunciou que ampliou de 41 para 48 os projetos de interiorização e expansão de universidades públicas no país, até 2007, para atender às demandas regionais. A UFCG também será expandida com um Campus em Pombal, graças à iniciativa do MEC. Em Pombal serão oferecidos cursos de agronomia, engenharia de alimentos, administração rural e economia rural. A UFPB também foi contemplada nessa ampliação com o campus de Litoral Norte-Mamanguape e Rio Tinto, que contará com cursos de ciências contábeis, secretariado, hotelaria, sistemas de informação, pedagogia: especialização em educação de jovens e adultos e gestão de negócios.

 

Gostaria, no entanto, de solicitar aos presentes que resgatem o projeto de criação do campus da UFCG em Sumé, que já havia sido discutido nos últimos anos e que, infelizmente, não foi contemplado com o programa do MEC.

 

Em meados de agosto, o ministro da Educação anunciou que o programa de expansão da educação superior pública contará, em 2007, com uma verba adicional de R$ 62 milhões, que se somam aos R$ 238 milhões que já estavam previstos para serem liberados em 2007. Em 2005, o MEC repassou R$ 192 milhões às instituições federais de ensino superior (Ifes) e, em 2006, já foram liberados R$ 150 milhões. Esses valores não representam o ideal, mas um avanço na interiorização do conhecimento. Essa é uma bandeira que defendo há décadas, essencial às políticas de educação em âmbito federal.

 

Mas para finalizar, gostaria, também, de frisar que a interiorização das universidades na Paraíba, a exemplo da UFCG, não pode ser feita em detrimento da excelência. O Estado da Paraíba começou a construir o seu pólo de conhecimento e tecnologia com a criação da Escola Politécnica de Campina Grande pelo governo do Estado, na gestão do governador José Américo de Almeida, que em 1955 a incorporou à Universidade Estadual. Este é um marco do início da interiorização. Em 1960, a Universidade Estadual foi incorporada ao Sistema Federal de Ensino Superior juntamente com outras instituições situadas em diversos Estados. Fui professor fundador da Poli, a partir de 1957, tendo sido depois seu diretor e reitor da UFPB no período de 1976/1980. Campina Grande, com a criação da pós-graduação, strictu senso, em engenharia a partir de 1970, destacou-se no desenvolvimento científico e tecnológico, se tornando um centro de referência na região Nordeste e no Brasil. A Universidade Federal de Campina Grande deve sim investir na interiorização do conhecimento, uma característica que já possui pelo fato de ser uma cidade do interior, mas deve manter o desenvolvimento da inovação, da excelência e da pós-graduação. Quero reforçar que a vocação de pólo tecnológico da cidade sede desta universidade não será mantida somente pela tradição em estudos e pesquisas na área tecnológica. A mobilização de toda a sociedade paraibana em prol desse objetivo, incluindo universidades, instituições de ciência, tecnologia e inovação como a Fundação Parque Tecnológico da Paraíba, as incubadoras e outras é de fundamental importância.

 

Lynaldo Cavalcanti de Albuquerque"


Data: 01/09/2006