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Inclusão e cotas raciais e sociais - Artigo de Matilde Ribeiro

Todas as políticas de desenvolvimento devem conter a dimensão de superação das desigualdades raciais

Matilde Ribeiro - Mestre em psicologia social, é ministra da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República.


Os caminhos trilhados pelo Brasil em direção à eqüidade ganharam reforço inédito do governo federal nos últimos três anos com a adoção de políticas de inclusão, cujos efeitos são determinantes para diminuir as desigualdades sociais no país.

Com essa perspectiva, o desenvolvimento de cotas sociais e raciais já contribui decisivamente para que o crescimento econômico sustentável resulte em ampliação do acesso aos serviços sociais e ao mercado de trabalho de segmentos populacionais empobrecidos e historicamente discriminados em nosso país.

A criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), em 21 março de 2003, incrementou essas iniciativas e possibilitou sua ramificação em várias áreas, com efeitos práticos visíveis na sociedade brasileira.

Na educação, o Prouni (Programa Universidades para Todos) oferece 203 mil bolsas de estudo para que alunos oriundos de escolas públicas possam estudar em instituições privadas - entre eles, 63 mil negros e indígenas.

Somadas a ele, 30 Universidades públicas já adotam o sistema de reserva de vagas para negros e indígenas.

E a implantação da lei nº 10.639, que torna obrigatório o ensino de história afro-brasileira nas escolas, ajuda a valorizar a contribuição dos imigrantes africanos e seus descentes à cultura e à economia brasileiras.

Um orçamento da ordem de R$ 2 milhões anuais está designado no Plano Plurianual (PPA 2004-2007) para a implantação da Política Nacional de Saúde da População Negra.

Em dezembro de 2004, foi lançado o "Projeto Afroatitude", que, em 2005 e 2006, concedeu bolsas de iniciação científica para pesquisas sobre Aids e saúde da população negra a 1.050 estudantes cotistas negros em 11 Universidades públicas.

O Plano Setorial de Qualificação de Trabalhadores Domésticos, do Ministério do Trabalho e Emprego, é uma ação que atende demandas específicas desses profissionais, como elevação de escolaridade no ensino fundamental, ampliação da proteção social e fortalecimento da representação e melhoria das condições de trabalho.

É um exemplo de ação afirmativa, pois a categoria agrega cerca de 6 milhões de brasileiros, dos quais 96% são mulheres - 57% delas são negras.

Entre as iniciativas que consolidam o Brasil como nação comprometida com a superação das desigualdades raciais está o projeto de lei nº 73/99, que estabelece reserva de vagas nas Universidades públicas para alunos de escolas públicas, considerando a porcentagem de negros e indígenas nas unidades da Federação.

E também o Estatuto da Igualdade Racial.

Fruto de um processo de debates entre políticos, pesquisadores e, sobretudo, representantes do poder público e do movimento negro, o estatuto é um projeto amplo, de orientação no sentido de que todas as políticas de desenvolvimento econômico e social devem conter a dimensão de superação das desigualdades raciais.

O texto apresentado em 1988 foi revisto no relatório de 2002, analisado e acompanhado durante dois anos por um grupo de trabalho interministerial, composto por vários órgãos do governo e coordenado pela Seppir e pela Casa Civil.

Posteriormente, em novembro de 2005, o resultado desse trabalho foi aprovado no Senado.

Em seus capítulos, são dispostos temas como pesquisa, formas de prevenção e combate de doenças prevalecentes na população negra, direito à liberdade religiosa e de culto, especialmente no que diz respeito às religiões afro-brasileiras, reconhecimento e titulação das terras remanescentes de quilombos e inclusão no mercado de trabalho por meio de contratação preferencial de profissionais negros na administração pública, entre outros itens.

Não se resume, portanto, ao sistema de cotas em Universidades.

O
projeto de lei nº 73/99 e o Estatuto da Igualdade Racial possuem o mérito de combinar critérios raciais e sociais e não divergem das ações afirmativas em curso no Brasil.

Ao contrário, elevam essas ações ao patamar de políticas de estado, o que garante sua perenidade, e constituem uma orientação necessária para que as políticas universalistas contemplem também os grupos discriminados.


Data: 21/08/2006