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Grupo "cria" agressividade em laboratório

Cruzamento seletivo de moscas-das-frutas indica 80 genes que parecem estar na base dos comportamentos violentos. Machos da espécie ficaram até 30 vezes mais agressivos que o normal; estudo ajuda a entender violência em animais e no ser humano

Cientistas conseguiram produzir agressividade em laboratório e começam agora a analisar sua origem genética. Mas não em seres humanos -não parece haver necessidade de reproduzir mais agressão humana -, e sim em moscas.

Os pesquisadores criaram uma linhagem de moscas macho trinta vezes mais agressiva do que o comum. As cobaias foram as tradicionais drosófilas, nome científico Drosophila melanogaster, as mosquinhas mais estudadas pela biologia pela facilidade de reprodução e por terem material genético de fácil visualização e análise.

Mais importante do que a mera produção dessas mosquinhas agressivas foi a identificação dos genes potencialmente envolvidos no comportamento.

Como lembram os autores, o comportamento agressivo é constante em todo o reino animal, mas ainda se sabe muito pouco sobre sua base genética.

Trata-se da primeira análise molecular abrangente da agressão em um ser vivo. O estudo está na revista científica "Nature Genetics" e é de autoria de Ralph Greenspan e Herman Dierick, do Instituto de Neurociências de San Diego, na Califórnia (oeste dos EUA).

Comparando as moscas mais pacatas e as mais belicosas, os pesquisadores descobriram que cerca de oitenta genes tinham ação mais intensa ou mais fraca -eram "expressados" de forma distinta.

"Os seres humanos têm genes semelhantes, alguns dos quais, assim como nas moscas, abelhas e camundongos, estão envolvidos no processamento do odor. Se isso é relevante à agressão humana? Difícil saber. Eu diria que pode ser importante em mamíferos que dependem mais do seu olfato", disse Greenspan à Folha.

Gladiadoras

Para produzir a linhagem agressiva, os pesquisadores usaram uma técnica que nada deveria à dos antigos romanos na seleção dos seus gladiadores. Assim como os combatentes do Coliseu, as mosquinhas foram colocadas em "arenas".

Vinte pares de machos eram postos em arenas separadas. Os machos mais agressivos eram selecionados e se reproduziam com fêmeas escolhidas ao acaso.

Depois de dez gerações, já era possível notar um substancial aumento da agressividade. Depois de 21 gerações, o índice de agressividade dos machos aumentara trinta vezes.

"Nós sabemos que as moscas na vida selvagem são mais agressivas que as moscas de laboratório e que elas perdem essa agressividade depois de diversas gerações em cativeiro. O fato de que nós conseguimos reverter isso tão rapidamente significa, na minha opinião, que há diversas maneiras de aumentar a agressividade geneticamente -o que significa que um bom número de genes pode influenciá-la", afirma o pesquisador americano.

É muito simplista dizer que há um "gene da agressividade", ou de qualquer outro comportamento animal, seja ele ligado à gula, ao homossexualismo ou à admiração de pinturas.

Mas, em seres menos complexos, um ou mais genes podem ter papel predominante.

No caso da Drosophila melanogaster, um dos oitenta genes, o Cyp6a20, na versão mutante, foi o que teve o maior efeito sob o comportamento agressivo. Mesmo em drosófilas, a interação com outros genes e com o ambiente deve ser complexa.

Em insetos machos, a agressão ocorre durante a competição por recursos -fêmeas ou comida -, em geral ligada à defesa de territórios.


Data: 14/08/2006