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As lições do Enade, editorial de O Estado de SP

Dos 5.511 cursos universitários que o último Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) avaliou, 27% receberam os conceitos máximos, 20% foram reprovados e 53% ficaram na média

Editorial publicado nO Estado de SP



O teste foi aplicado a 277.476 alunos escolhidos por amostragem, entre os estudantes que ingressaram e os que se formaram em 2005, e os resultados acabam de ser divulgados pelo Ministério da Educação (MEC). Com isso, completam-se dez anos de avaliação regular do sistema educacional brasileiro.

O Enade é o teste que o atual governo criou para substituir o antigo Provão, uma das mais bem-sucedidas iniciativas do governo anterior.

Além de ter incluído 20 novas áreas de conhecimento, na avaliação realizada em 2005 o Enade introduziu o Indicador de Diferença entre o Desempenho Objetivo e o Esperado (IDD), que mede o quanto uma universidade contribui para a formação do aluno, ampliando seu nível de conhecimento e sua competência profissional.

A introdução do conceito de "valor agregado", pelo Enade, deu maior nitidez à radiografia do ensino superior, contribuindo para acabar com o mito de que toda universidade pública é boa e o ensino superior privado é sempre ruim.

"Há instituições que pegam alunos bons e não sabem o que fazer com eles e há outras que pegam o mais fraco e o melhoram", afirma o economista Cláudio Moura Castro, um dos mais conceituados especialistas em avaliação de ensino no País.

Os resultados do Enade mostram que, no conjunto, os alunos das instituições públicas tiveram, como vem ocorrendo desde o tempo do Provão, um desempenho melhor do que os das instituições privadas, confessionais e comunitárias.

No entanto, graças ao novo indicador, o Enade apurou que 41,8% das universidades federais tiveram um Indicador de Diferença entre o Desempenho Objetivo e o Esperado negativo. Ou seja, a avaliação constatou que quase metade da custosa e extensa rede de ensino superior mantida pela União não conseguiu agregar o valor que se esperava a seus alunos.

No âmbito das universidades privadas, cujos alunos em sua maioria vêm da rede pública do ensino médio, têm uma educação de baixa qualidade e precisam de cursos mais curtos para ingressar logo no mercado de trabalho, 53,5% das instituições avaliadas pelo Enade apresentaram um IDD positivo.

A descoberta do Enade é surpreendente. Ela revela que uma parte significativa das universidades particulares vem conseguindo formar adequadamente os seus alunos e que a distância dessas instituições das universidades federais é menor do que se imaginava.

Até o ministro da Educação, que sempre demonstrou ter algum preconceito contra as instituições privadas, acusando muitas delas de "mercantilizar o ensino", não escondeu sua surpresa com essa constatação.

Com isso, as autoridades educacionais agora não têm mais pretexto para tratar o setor privado como vilão, nem para continuar tentando submeter todas as instituições públicas, privadas e confessionais de ensino superior existentes no País a um modelo único, como é o objetivo do projeto de reforma universitária que o governo enviou ao Congresso.

Os resultados do Enade deixaram claro que, num País tão heterogêneo como o nosso, cada uma dessas instituições tem uma clientela específica e um espaço acadêmico próprio para atuar.

Em outras palavras, a avaliação mostrou que, diante da complexidade da sociedade brasileira, o modelo mais adequado é o de um multissistema de instituições de ensino superior, a exemplo do que ocorre nos EUA.

Lá, ao lado das universidades de ponta, existem os Liberal Art Colleges, que não fazem pesquisa, mas têm ensino de qualidade e recrutam bons alunos, os colleges, que atendem os alunos vindos de famílias mais pobres, e os community colleges, que oferecem cursos mais curtos e absorvem milhões de alunos com ensino técnico voltado para o mercado de trabalho.

Criado há dez anos, o sistema de avaliação do ensino superior finalmente se consolidou, revelando-se capaz de fazer diagnósticos precisos do setor.

O mérito do último Enade foi mostrar que, embora os gravíssimos problemas de qualidade ainda persistam, o governo estava errado ao superestimar as universidades públicas e desprezar o papel e a importância das universidades privadas na formação das novas gerações.


Data: 14/08/2006