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Rede mundial liga computadores ociosos para pesquisar câncer

Programa aproveita capacidade de processamento de micros pessoais comuns sem atrapalhar seu desempenho

Qualquer pessoa pode ajudar os cientistas a desvendarem o câncer. Com essa premissa um novo projeto integra o World Community Grid, ferramenta que usa o tempo ocioso dos computadores pessoais para processar dados científicos.

O projeto, chamado Help Defeat Cancer (em português, ajude a derrotar o câncer), foi lançado no fim de julho e se baseia na computação de grade.

Ela divide as informações que precisam ser processadas em pequenos "pacotes", distribuídos entre centenas ou milhares de colaboradores unidos em rede - no caso, a internet. Cada um resolve uma parte do problema.

Para participar, basta entrar no site (http://www.worldcommunitygrid.org) e baixar o programa de graça. Ele vai automaticamente trazer para o computador um dos pacotes, que será analisado sem atrapalhar qualquer atividade do dia-a-dia. Quando o processamento estiver terminado, o pacote será devolvido para a central e substituído por outro.

O aplicativo roda em qualquer PC e Mac, em Windows e Linux, e, como fica isolado na máquina, não corre o risco de contaminar qualquer programa caso infectado por um vírus.

Foco

Neste caso são analisados tecidos cancerosos de mama, cabeça e pescoço. Eles são escaneados e digitalizados na Universidade de Medicina e Odontologia de New Jersey, nos Estados Unidos, e transformados por técnicos da empresa IBM, que administra o World Community Grid, em uma língua que o programa entende.

O objetivo é identificar assinaturas deixadas nos tecidos por marcadores biológicos do câncer, como alterações genéticas ou presença de certas proteínas. A informação é comparada com o tipo de tumor, estágio da doença e resposta ao tratamento.

"Essa tecnologia nos permite rodar mais experimentos do que seria possível normalmente. Em um dia processamos a mesma quantidade de dados que tomaria mais de cem anos pelo método tradicional", explica o coordenador do projeto, David Foran.

Ele espera terminar esta fase em três meses. Cerca de 4 mil imagens retornam para a central por dia - o único problema que a equipe de cientistas enfrenta é manter o ritmo acelerado do programa.

"Ele nos permite procurar pistas para prognósticos, que levarão a terapias mais refinadas para os pacientes." Outros tipos de câncer podem ser incluídos depois, com financiamento dos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos.

Versatilidade

Este é o terceiro projeto do World Community Grid: o primeiro, lançado em novembro de 2004, mapeia as proteínas humanas e já está na segunda fase.

O segundo projeto, de novembro de 2005, busca drogas candidatas a combater o vírus da aids. Os coordenadores dos projetos, para usar a ferramenta, concordam em deixar os dados na Internet, para quem quiser ver.

Essa não é a única iniciativa que junta ciência e computação de grade. A primeira vez que ela foi usada em larga escala, com a participação de usuários pelo mundo, foi no projeto Seti@Home, que vasculha o universo em busca de sinais extraterrestres.

Em 2003, um grupo identificou 44 tratamentos potenciais para a varíola em apenas três meses - algo que levaria mais de um ano pelo procedimento normal.

No dia 1º deste mês, a Universidade da Califórnia em Berkeley deu início ao Stardust@Home, que analisa dados de uma sonda espacial que intercepta partículas microscópicas de poeira interestelar.

O estudante Leandro Biondo, de 22 anos, migrou do Seti@Home para o World Community Grid. "Não acho que procurar ETs seja mais importante do que a pesquisa biológica." Ele participa de um grupo que reúne mais de 200 brasileiros e 500 máquinas neste projeto.

Alguns grupos competem: quem conseguir processar mais dados, que abastecem um ranking no site, ganha. "Há pessoas que só participam para ver os pontos correndo, principalmente os mais jovens", diz Biondo.

Mas há quem apenas simpatiza com a idéia. "Ela pode ou não dar resultado, como qualquer pesquisa, mas pelo menos a gente faz alguma coisa."

Segundo Cezar Taurion, gerente de Novas Tecnologias Aplicadas da IBM Brasil, ainda há potencial de crescimento para a ferramenta. O processador de um micro usa normalmente de 1% a 2% de sua capacidade. E há mais de 800 milhões de computadores pessoais no mundo.

Além do caráter filantrópico, Taurion acha que a computação de grade poderá ser usada em modelagem financeira e prospecção geológica, por exemplo, com lucro para a empresa.

"Queremos mostrar sua viabilidade, amadurecê-la. A tecnologia é uma das forças que transformam a sociedade."


Data: 08/08/2006