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Esfacelada, CTNBio deverá sofrer nova intervenção

Trava-se ali uma batalha entre os defensores da biotecnologia e do meio ambiente

Criada em 1995 para formular regras e regular atividades com organismos geneticamente modificados no país, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) está desde sua fundação no centro de interminável batalha entre os entusiastas da biotecnologia e os defensores do meio ambiente, agricultura familiar, direitos do consumidor e dos trabalhadores.

Em meio a acusações mútuas de "sabotagem" política, o colegiado deve sofrer uma nova intervenção do governo para acelerar a análise dos processos de liberação comercial de transgênicos no país.

O governo avalia a troca de representantes dos ministérios mais "aguerridos" nos debates internos e negocia com parlamentares e indústrias do setor o fim do quórum qualificado de dois terços dos membros exigidos para a liberação comercial.

Prevista para depois das eleições, as mudanças podem ocorrer ainda neste ano.

Pressionado pelos empresários do setor, o presidente Lula fará uma reunião de emergência do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), composto por 11 ministros, para determinar um nova dinâmica ao governo.

Deve exigir agilidade e dar um "puxão de orelha" nos ministérios do Meio Ambiente, Desenvolvimento Agrário e Secretaria da Pesca, principais trincheiras dos opositores da liberação comercial de transgênicos.

O lobby das empresas e dos ruralistas no Congresso cresceu nos últimos meses.

Insatisfeitos com a demora na análise das liberações dos transgênicos, os lobbies estão preocupados com os claros sinais de desânimo emitidos pelos cientistas que integram o colegiado.

O principal sintoma é o desligamento de cinco membros da comissão desde o início do ano, inclusive do vice-presidente, e a baixa participação dos demais componentes da CTNBio.

Entusiasmadas com a nova Lei de Biossegurança, aprovada em 2005, as empresas apostavam que teriam mais facilidade para aprovar suas pesquisas. Não foi o que aconteceu.

A nova lei ajudou a emperrar a tramitação dos projetos e criou vários recursos administrativos que protelam as decisões finais. O processo estabelecido pela Lei nº 11.105 pode resultar numa demora entre 290 dias (quase dez meses) e 590 dias (quase vinte meses).

Além disso, a nova lei aprofundou as reclamações sobre a precariedade do modelo institucional da CTNBio. Apêndice do Ministério da C&T, a comissão não tem funcionários próprios e sofre com as pressões extremadas, excesso de trabalho, desgaste pessoal e diárias insuficientes para pagar despesas com transporte, hospedagem e alimentação dos 54 membros titulares e suplentes.

Em maio, ganhou a vigilância do Ministério Público, o que gerou muitas polêmicas e acirrou os ânimos dos membros.

"Não é uma reunião agradável. Além do excesso de trabalho, tem uma briga política importante", acusa o geneticista Horácio Schneider, ex-vice-presidente da comissão.

Ele pediu afastamento por entender que a CTNBio "não é só uma comissão técnica e científica, mas política também". "Se continuar esse panorama, a tendência é sair mais gente", diz Schneider.

Ex-presidente da CTNBio entre 2001 e 2003, o neurocientista Ésper Cavalheiro afirma que na raiz do problema está a baixa representatividade dos membros do governo.

"Isso passa imagem de fragilidade porque não traduzem o pensamento de cada ministro", critica. Segundo ele, a CTNBio deveria ser um órgão assessor direto do presidente da República.

"Assim, não há riscos de posições partidárias. E o presidente reconheceria os membros".

Também pediram desligamento da comissão o botânico José Antonio Peters (UFPel), a médica Ada Ávila Assunção (UFMG) e promotor paulista Vidal Serrano Nunes Junior.

O agrônomo Francisco Caporal, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, também teria comunicado sua intenção. O quórum da CTNBio vem caindo mês a mês. Em fevereiro, 35 dos 54 membros estiveram presentes.

Em maio, foram 30. Em junho, apenas 23 participaram das discussões. Além disso, o Itamaraty até hoje não indicou seus representantes e muitos membros não participam dos debates rotineiros.

Os ambientalistas, porém, já reuniram dados para mostrar que não há paralisia na CTNBio.

Segundo o grupo, foram aprovados 185 processos nas últimas quatro reuniões. Antes, tiveram que discutir regimento interno e distribuição de processos.

Na próxima reunião, que terá três dias neste mês, devem ser analisadas a maioria dos 60 processos de liberação experimental de transgênicos.

"Se há divergência, alguma coisa não estava contemplada. Quando se atende, aprovamos por consenso, como fizemos com cerca de 95% dos processos", defende Rubens Nodari, do Ministério do Meio Ambiente.


Data: 02/08/2006