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Filosofia e sociologia são disciplinas obrigatórias no ensino médio. E agora? Foi uma vitória?

"Não temos que medir a importância da disciplina pelos seus professores"


Paulo Ghiraldelli Jr. - Filósofo

 

Estou em contato direto com Brasília exatamente agora! E neste momento o Conselho Nacional de Educação acabou de decidir, por unanimidade, que as escolas de Ensino Médio devem oferecer as disciplinas filosofia e sociologia. Finalmente, não há mais "senão". Foi para valer a vitória nesta sexta feira, dia 7 de julho.

É difícil acreditar que o ministro da Educação não homologue o resultado. O Governo já havia se manifestado favorável e, enfim, incentivou a atitude do Conselho que, por sua vez, já era para ter feito tal votação há bem mais tempo.

Vencemos. Aqueles que no interior da Universidade e fora dela torceram contra, ou que se diziam a favor mas não davam um passo na colaboração com o movimento, podem torcer o nariz. Perderam.

Perderam mesmo?

Não! Ainda não! Eles vão voltar a atacar. Quando? Ah! Daqui um ano ou menos. Vão dizer que os professores que estão na rede são poucos, que são ruins, que a maioria lida com auto-ajuda.

Alguns vão dizer que os professores são "marxistas demais" e outros irão dizer que não passam de picaretas lidando com "filosofia clínica" ou que são "pastores caça níqueis". Terão razão? Infelizmente, em parte, sim.

Mas isso não vai invalidar a lei. Não mais? Não! Contra esse pessoal que irá tentar desqualificar a aula de filosofia, acusando alguns de não ter o domínio do assunto, só pode haver uma resposta: temos de montar uma estratégia de trabalho.

Só que essa estratégia não passa por aqueles que querem, na Universidade, se tornar donos do Ensino Médio, inventando uma coisa chamada "ensino de filosofia".

Não existe "ensino de filosofia" como área acadêmica ou como disciplina ou como campo de estudo. Quem faz isso é picareta. Quer se aproveitar do momento para fazer currículo na Universidade.

O que existe é a filosofia - só. Ou se é familiarizado com ela ou não se é familiarizado. E em geral os que lidam com "ensino de filosofia" como uma pretensa área de estudo, não são.

O curso de filosofia, seja ele de bacharelado ou de licenciatura, termina formando o filósofo que, entre outras coisas, irá trabalhar com filosofia ou no Ensino Médio ou na Universidade - ensinando. Não há didática ou programa para ensinar filosofia.

O que há é o bom filósofo, que leu os clássicos e que acompanha a filosofia contemporânea (tanto continental quanto analítica), que escreve, que debate, que está na mídia e nos livros avançados e nos manuais, que não se transformou em porta-voz de governo ou de oposição.

Para ser um desses não há fórmula. É uma questão de índole e de formação. Ter um desses como professor é ter sorte. Se a garotada não tiver um assim, isso não significa que a filosofia terá de ser retirada da escola, pois também na matemática ou em português ou geografia teremos professores que não valerão uma moeda de cinco centavos.

Não temos que medir a importância da disciplina pelos seus professores. Temos de olhar para o futuro.

Ver se conseguimos não deixar que os professores de filosofia, tanto do Ensino Médio quando da Universidade, sejam as múmias mal amadas que vemos por aí, querendo mais pisotear alunos que qualquer outra coisa, e nem que sejam as borboletas oba-oba que também já vimos por aí.

Começo agora, imediatamente, a terminar meu livro sobre Sócrates, para a Editora Girafa. Pois penso que é com Sócrates, aquele com o perfil corajoso e que nunca cedeu nem aos poderosos nem tinha resposta para tudo é que precisamos pensar em filosofia - principalmente agora. Não tenho um pouco de razão?

Vamos começar uma nova era?


Data: 10/07/2006