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Artigo - Racismo pernicioso

Benedito Antonio Luciano

 

Recentemente, li um livro sobre George Washington Carver, um dos maiores cientistas norte-americanos. Ao terminar a leitura, me ocorreu uma indagação: por que os feitos de um homem da dimensão dele são tão pouco difundidos no Brasil? Seria o fato de ele ter nascido escravo, negro e filho de escravos?

 

Impressionante como o racismo é pernicioso. Países como o Brasil e os Estados Unidos, que têm um débito histórico para com os escravos trazidos da África e seus descendentes, ainda mantém uma forte intolerância com relação às pessoas de pele negra. No Brasil, o racismo é dissimulado, subterrâneo e por isso é tão difícil de ser erradicado. Aqui, ele se esconde lá no fundo da caverna do chamado inconsciente coletivo, aflorando em momentos de competição, como no futebol, por exemplo.

 

Mas, voltemos a George Washington Carver. Quem foi ele? Nascido em 1864, durante a guerra civil norte-americana, na fazenda de Moses e Susan Carver, perto de Diamond Grove, no estado de Missouri, ele e a mãe Mary foram raptados por assaltantes e levados para o estado de Arkansas. Moses Carver, o fazendeiro, contratou um mateiro e conseguiu recuperar o bebê, mas sua mãe nunca foi encontrada. Moses e Susan criaram George, dando-lhe o sobrenome. Como ele era miúdo demais para o trabalho pesado da fazenda, lavava e passava roupas e cuidava dos jardins.

 

Na adolescência, Carver saiu de Diamond Grove para estudar e tinha quase 25 anos de idade quando completou o segundo grau. Ele ganhou uma bolsa para a Universidade Highland, em Kansas, mas foi recusado por ser negro. Em 1889, entrou para a Faculdade Simpson, em Iowa, e em 1891, transferiu-se para a Faculdade Agrícola no mesmo estado, onde se formou em 1894 e concluiu o mestrado em ciências agrícolas em 1896. Juntou-se, então, ao corpo docente da faculdade, mas deixou o cargo para trabalhar com Booker T. Washington, no Instituto Tuskegee, no Alabama.

 

No Instituto, com pouquíssimos recursos, ele montou um laboratório agrícola. Lá, ele descobriu que, no lote de terra alocado para a sua fazenda experimental, o algodão vinha sendo plantado por tantos anos que o solo estava completamente exaurido de nutrientes. Percebeu, também, que os fazendeiros pobres do Sul enfrentavam o mesmo problema e decidiu desenvolver métodos para restaurar o solo. Carver, então, descobriu que o amendoim e a batata-doce cresciam no solo empobrecido e, como essas plantas tinham a propriedade de fixar o nitrogênio em torno de suas raízes, restauravam os nutrientes do solo. Sabendo que o cultivo de nenhuma das duas plantas era rentável economicamente, ele procurou remediar a situação, desenvolvendo produtos que poderiam ser feitos à base delas. Assim, ele desenvolveu cerca de trezentos produtos feitos com o amendoim, como queijo, manteiga, tintas, corantes e plásticos. Com a batata-doce, ele criou mais de cem produtos, inclusive melado, borracha sintética e cola.

 

No decênio de 1930, Carver já era reconhecido como um dos maiores cientistas botânicos do mundo. Ele publicava boletins anuais com conselhos agrícolas e também montou uma sala de aula portátil em um vagão para levar suas recomendações aos fazendeiros pobres.

 

Durante sua vida profissional ele se manteve no Instituto Tuskegee com o salário de mil e quinhentos dólares por ano, recusando ofertas de trabalho muito bem remunerado de outras organizações. E lá permaneceu até sua morte, em 5 de janeiro de 1943, vítima de complicações decorrentes de uma anemia perniciosa, tão perniciosa quanto o racismo do qual ele foi vítima ao longo de sua vida.

 

 

Benedito Antonio Luciano é professor da UFCG


Data: 08/09/2014