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Artigo - O drama de um hospital universitário e os seus atores

Hiran de Melo

 

Como professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) tenho a obrigação de prestar a minha colaboração nas questões precípuas da nossa instituição, em particular nas que dizem respeito ao ensino. Desta forma, como a adesão da UFCG à Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), a meu ver, afeta a qualidade do curso de Medicina e não se constitui tema pacífico, como a própria história desta adesão já registra, não há como não problematizar.

 

A adesão à Ebserh significa que os hospitais universitários vinculados à UFCG passarão a ser administrados por esta empresa, portanto em conformidade com o Modelo Assistencial já descrito em outro artigo.

 

Dentre as possíveis consequências, destaco um fortalecimento ao atendimento em massa dos pacientes, tão comum nos hospitais que atendem pelo Sistema Único da Saúde (SUS). Em oposição a um atendimento seletivo, focado em pacientes cujas patologias se constituem desafios aos corpos docentes do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS) e do Centro de Formação de Professores (CFP) onde estão instalados os nossos cursos de Medicina.

 

Patologias que exigem um esforço de cura, além de uma simples receita, e requerem, muitas vezes, pesquisas de novos tratamentos, gerando, assim, novos conhecimentos e aprofundando a acuidade necessária à prática da Medicina. Nestes casos, o modelo Acadêmico, também apresentado no artigo já citado (*), é o apropriado.

 

Em linhas gerais, seria esta a questão: escolha entre dois modelos. Todavia, não é só isso. Para ilustrar, escolho o Hospital Universitário Alcides Carneiro (HUAC). Penso que esta unidade hospitalar não foi construída para atender as finalidades do ensino de ciências médicas.

 

 Ela é uma "herança" do Ministério da Saúde destinada, na sua origem, ao atendimento assistencial à comunidade carente. Como herança, a universidade também herdou os funcionários vinculados àquele ministério.

 

 Ao longo dos anos, o hospital foi ampliando a sua capacidade de atendimento e incorporando os docentes do CCBS que, na medida do possível, ministram aulas práticas nesse hospital "universitário". Porém, devido ao caráter assistencial de origem, a demanda por serviços aumentaram e a universidade se viu obrigada a nomear, e até contratar, novos profissionais da saúde, técnico-administrativos e mesmo pessoal de apoio.

 

 Observem, não foram as demandas de ensino e pesquisa que proporcionaram o crescimento, ou inchaço para alguns, do HUAC, mas as demandas dos atendimentos emergenciais de populações carentes do município de Campina Grande e circunvizinhança.

 

 Como a universidade não dispunha, e nem dispõe, de recursos orçamentários suficientes para atender essas demandas crescentes, foi se tornando, cada vez mais, dependente de recursos do SUS para propiciar o funcionamento do HUAC. E dos caprichos do Ministério da Educação (MEC)  na liberação de novas nomeações.

 

 O problema já é grande, todavia, não é só deste tamanho. A administração do HUAC vem sofrendo mutações. A atual consiste em um superintendente que é eleito pelos que fazem, trabalham, no HUAC. Este nomeia a sua diretoria. E, na prática, administra o hospital com ampla autonomia. Mas, esta autonomia não livra a reitoria de responder pelas ações judiciais que exigem mais atendimento assistencial.

 

Então, aí está o problema: um hospital dito universitário que não está voltado prioritariamente para os objetivos precípuos da universidade, e sim para o assistencialismo, sem que a UFCG disponha de recursos suficientes para atendê-lo plenamente e, ainda, sem que a reitoria tenha ingerência efetiva na sua administração. Entretanto, sendo responsabilizada política e judicialmente pela não efetividade no atendimento da clientela externa.

 

O que diz sobre a questão a comunidade acadêmica do CCBS? O que diz sobre a questão a comunidade acadêmica do CFP? Sendo elas as células principais da universidade interessadas na existência de hospitais universitários. Exige-se que se saiba das suas posições, para que assim se possa ter um referencial acadêmico que oriente a busca da solução.

 

Por fim: já sabemos o que o sindicalismo tem dito sobre a questão da adesão, já sabemos o que disse no passado próximo o Conselho Pleno, já sabemos a posição do MEC, e assistimos o sacrifício do Magnífico Reitor. Falta saber o que os corpos docente e discente diretamente envolvidos têm a dizer sobre o que é o ensino de ciências médicas e em que condições mínimas ele pode se realizar. Tudo isso sem perder de vista que devemos sempre buscar a excelência e não nos contentarmos em ser atores simplórios de um drama.

 

 

Hiran de Melo é professor da UFCG

 

 

(*) Artigo - Modelo Assistencial X Modelo Acadêmico

(http://univernecessaria.blogspot.com.br/2014/03/modelo-assistencial-x-modelo-academico.html)


Data: 07/04/2014