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Artigo - Salvemos o Riacho Piabas

Wagner Braga Batista

 

 

Na década de 1990, em sintonia com reflexões e propostas formuladas em eventos na área de saúde pública, um grupo de professores da Faculdade de Medicina, da Universidade Federal de Minas Gerais- UFMG, defendeu que a saúde humana não deveria ser objeto exclusivo da medicina. Assinalou precariedades nas  condições socioeconômicas da população, na educação e na cultura de seus segmentos , bem como no entorno ambiental para sugerir a ampliação do escopo da saúde pública. Aduziu que indicadores da saúde coletiva poderiam ser analisados além da anatomia, fisiologia e psicologia humana, ou seja, nos contextos socioeconomico e ambiental que o envolvem.

 

Reafirmando este pressuposto, à guisa de exemplo, integrantes deste grupo  identificaram que indicadores da bacia hidrográfica do Rio das Velhas, em avançado estado de degradação, poderiam fornecer elementos sugestivos para a aferição da saúde coletiva de populações circunvizinhas.

 

Naquele contexto, uma proposição singular articulou três importantes dimensões do ensino/aprendizado da Medicina, quais sejam, a enfase na saúde preventiva, o foco nas condições de vida da coletividade e a perspectiva integradora, gerada por projeto de extensão que aproximasse  estudantes de medicina de contingentes populacionais ,alvos de sua atenção, e os  sensibilizasse para examinar suas condições adversas de vida.

 

Daí surgiu o projeto de resgate e de revitalização do Rio das Velhas.

 

Batizado de Projeto Manuelzão, em homenagem ao vaqueiro Manuel Nardi, personagem de Guimarães Rosa, teve inicio no momento em que a Lei Federal 9433/97 definiu que a gestào das águas deveria ser efetivada por comitês de bacias hidrográficas.

 

Desde então, várias iniciativas foram desenvolvidas visando prover este objetivo e fornecer visibilidade às drásticas condições de vida das populaçòes ribeirinhas, afetadas pela contínua degradação do Rio das Velhas, primeira via de acesso ao interior do país.

 

Convém assinalar que o leito do Rio das Velhas reveste-se não só de importância ambiental, mas também histórica. A partir do século XVIII, propiciou a penetração e o povoamento do recondito sertão do Brasil.

 

Com a finalidade de recuperar a memória deste sitio histórico e fornecer evidências do processo de degradação da sua bacia hidrográfica, em 2003, os mentores deste projeto organizaram expedição que percorreu o rio da sua nascente a sua foz no Rio São Francisco.Este percurso, com 803 KM de extensão, foi realizado por três canoeiros, no período de 29 dias, e contou com o apoio logístico de outras 70 pessoas. À época, foi fartamente documentado e divulgado por programa televisivo de alcance nacional.

 

Graças à repercussão alcançada por estas iniciativas, houve adesão formal de entidades, de parlamentares e de instiuições públicas a esta causa, bem como foram firmados compromissos políticos com  governantes locais. O mais emblemático deles asseverava que se poderia nadar nas águas do Rio das Velhas, em 2014.

 

Guardadas as devidas proporções e peculiaridades dos projetos, em 2011, um conjunto de entidades se mobilizou para lograr objetivo semelhante: frear a célere poluição e revitalizar o Riacho Piabas. Com este intuito tentou sensibilizar poderes públicos locais e segmentos organizados da sociedade civil de Campina Grande.

 

O patrimonio ambiental e cultural é elemento visceral, contituinte da unidade, da identidade e da continuidade histórica de todos os povos.

 

Não é demais salientar que o povo que despreza sua origem e sua História estará inevitavelmente condenado à submissão ou ao desaparecimento.  Pobre do povo que se mostra incapaz de resguardar sua identidade, seu patrimonio cultural e ambiental.

 

A origem de Campina Grande está associada ao Rio Piabas. Às potencialidades deste manancial que abasteceram populações nativas, os indios Arius e Cariris,  com água, vegetais, caça e pesca, bem como, posteriormente, os tropeirosque contribuiram para sedimentar o vilarejo, embrião desta cidade.

 

O festejo do sesquicentenário de Campina Grande enseja a retomada deste projeto. Impõe que as forças vivas e instituições públicas desta cidade, especialmente as suas universidades, demonstrem empenho em despoluir e revitalizar a sub-bacia do Riacho Piabas, resgatar este patrimônio ambiental  e a remissão a um sitio histórico.

 

Fazemos votos que estas ações, impostergáveis, sejam traços marcantes do processo de recuperação da memória e enaltecimento dos 150 anos de fundaçâo de Campina Grande.

 

Wagnar Braga Batista é professor aposentado da UFCG 


Data: 18/12/2013