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Artigo - Dia do servidor público- A defesa da educação e a ardilosa hipertrofia dos serviços públicos

Wagner Braga Batista

 

 

Na década de 1990, a escalada ultraliberal resultou na desregulamentação da economia e na privatização de empresas públicas. Comprometeu a capacidade de intervenção estratégica do Estado brasileiro e afetou duramente a qualidade dos serviços prestados à população.  

 

Injustificável argumento, que investimentos e gerenciamento privados melhorariam os padrões de  desempenho de serviços essenciais, não se confirma pelo exame das condições de funcionamento da educação, da saúde, dos transportes coletivos no país, entre tantas outras atividades indispensáveis à população.

 

Na era FHC, os serviços públicos, quando não privatizados, foram levados à inanição ou, então,  submetidos a vexatório sucateamento e hipertrofia.

 

Este tendência, no campo educacional, será revertida parcialmente nos governos Lula. Contudo as políticas de coalisão de interesses afetaram duramente programas de governo aplicados ao ensino superior.

 

 

Após vertiginosa expansão e irradiação regional do ensino pago, percebe-se a retração do ritmo de crescimento de instituições privadas e a redução da oferta de matrículas, possivelmente acarretadas pelas elevadas mensalidades, altas taxas de inadimplencia e de evasão.

 

Diante destes contingenciamentos, o financiamento público do setor privado tornou-se  mola mestra da política educacional no Brasil. Sua coluna dorsal: o Programa Universidade para Todos- PROUNI, criado em 2004.

 

Por seu intermédio consolidou-se a homologia entre acesso ao ensino pago e democratização da educação. Ou seja, a democratização tornou-se possivel mediante o financiamento de mensalidades, cujo pagamento seria impraticável para grande parte da população. A superação deste impasse se evidencia pela enorme adesão ao PROUNI, pela sua visibilidade como tábua de salvação de instituições privadas e de estudantes carentes. 

 

O álibi da democratização, que viabilizara a mercantilização do ensino, foi incorporado ao  discurso do governo, que renovou e ampliou expediente utilizado por políticas educacionais desde o regime militar.  No final da década de 1960, assim como atualmente, este estratagema aliviou pressões em prol da expansão e da melhoria do ensino público superior.

 

O PROUNI conjuga interesses díspares, aparentemente coincidentes.

 

Diante da ociosidade de vagas no ensino privado, o governo promoveu seu preenchimento com aporte de recursos públicos. Favoreceu  setor empresarial que constantemente questiona a exigência de avaliação e se mostra refratário a qualquer tipo de intervenção no ensino privado, bem como se arroga a defesa de Estado mínimo,  que não iniba  a iniciativa privada na realização de empreendimentos, até poucos anos, afetos ao poder público.

 

Por meio desta ação salvacionista, o PROUNI converte a privatização do ensino num patamar da proclamada universalização de direitos educacionais.  Esta convergência do poder público com a iniciativa privada cria uma relação obsequiosa,  impensável em contexto precedente, no qual se defendia a educação pública como dever do Estado e direito irredutivel de todos.  Em pauta se mantinha a destinação de verbas públicas  exlusivamente para instituições públicas.

 

Apesar de se mostrar atraente para amplas parcelas da população, reféns da precariedade do ensino público fundamental e das barreiras interpostas para o acesso à universidade pública, são visíveis as inconsistências do PROUNI,

 

Os discursos laudatórios, não confirmam virtualidades deste programa meia sola.

 

O PROUNI  não logra a cidadania e a inclusão social, como apregoam muitos de seus defensores. Reportam-se a demandas da negritude e da pobreza, em oposição ao perfil branco e elitizado da universidade pública, para legitimar crescentes exigencias da mercantilização do ensino superior.

 

O PROUNI anuncia a  ascensão social e a inserção no mundo do trabalho, mas não rompe o circulo vicioso no qual se mantêm grande parte de seus aderentes, submetidos a trabalhos terceirizados,  a empregos voláteis em atividades comerciais de alta rotatividade e confinados em cadeias do telemarketing.

 

É recomendável que a análise deste programa supere o recorrente uso de sofismas, a exemplo dos que lhe atribuem a responsabilidade pela precarização do ensino público superior e, sob outro viés, que se constituiu numa ponte capaz de transpor dificuldades de acesso às universidades públicas.

 

Ainda que insuficientes, as matrículas em instituições públicas de ensino superior no Brasil, dobraram nos últimos dez anos. 

 

Esta tendência também pode ser observada em escala mundial. Na primeira década do século XX,  as matriculas ensino superior quase duplicaram, saltando de cerca de 2,7 milhões para 5,1 milhões.  Segundo dados do INEP/ MEC, o crescimento mais vigoroso das matrículas ocorreu nos últimos cinco anos.

 

O Censo da Educação Superior (2012) revela-nos que houve um pequeno acréscimo nas matriculas em relação ao ano precedente, 4,4%.  Há, no entanto, uma enorme disparidade entre a participação do setor público, 1.087.413, diante das 5.140.312 matriculas registradas na rede privada. Ainda assim é oportuno ressaltar que o crescimento foi maior, 7% nas instituições públicas, do que os 3,5% observados nas entidades privadas.

 

No Brasil, a retração do crescimento das matrículas nos últimos anos foi compensada pelo avanço do ensino a distância. Porquanto o ensino presencial responda pelo acréscimo de apenas 3,1%, no último ano, a educação a distância apresentou expressivo crescimento de matrículas,  igual a 12,2%.

 

Cabe-nos registrar que há mais do que sete milhões de estudantes matriculados na educação superior e outros tantos pleiteando o acesso a este nível de ensino..

 

Ao invés de fazer coro com mercadores do ensino e convalidar o injusto preço pago por  pobres e negros para assegurar o direito à educação- em muitos casos, de péssima qualidade- deveríamos nos empenhar em exponencializar a educação pública, facultando que  seja  direito insofismável e  irredutível de todos brasileiros

 

Se os últimos governos capitalizaram a criação de 11 universidades e de meia centena de campi universitários, podemos cobrar a continuidade destas ações, exigindo que construam muito mais. Deste modo, estarão cumprindo seu dever público.

 

A expansão desordenada do ensino público superior requer criteriosa avaliação da comunidade universitária. Este indispensável trabalho se impõe como contraponto de arremedos, alguns claramente publicitários, efetuados pelo MEC.

 

Limitadas à reprodução de quantitativos, avaliações desta natureza tendem a mascarar lacunas da educação pública e servem para legitimar baixos padrões de desempenho de instituições privadas.

 

A falta de sistemática e meticulosa avaliação dificulta a defesa e a ampliação da educação pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada em nosso país..

 

Na passagem de mais um dia dos servirores públicos, devemos celebrar os laços que unem professores a todos aqueles que se empenham em minorar as inúmeras dificuldades da população brasileira. São dignos da condição de servidores públicos.

 

A educação pública é nossa trincheira.

 

Professores, comprometidos com a educação pública, somos os maiores responsáveis pela sua efetivação. Não podemos declinar deste compromisso e nos abster de avaliar sistemática e democraticamente o produto do nosso trabalho coletivo.

 

 


Data: 29/10/2013