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Artigo - A nossa Constituinte miúda

Wagner Braga Batista

 

 

Dia 5 de outubro celebramos 25 anos da promulgação da Constituição cidadã.

 

Em ilustrativo artigo, Luiz Gonzaga Belluzzo nos leva ao desconforto de usar a razão em meio às celebrações.[1]

 

Ao invés do discurso laudatório, rememora antecedentes autoritários e analisa o atual legado crítico da Constituinte, fruto de acordos pontuais, da atropeladora ação do Centrão e das propostas regradas por conveniências de parlamentares, em totak desrespeito à coerência de preceitos legais. 

 

Graças a este ritual fomos levados a crer que abolimos o entulho autoritário, porém nos deparamos com a supressão de leis que nunca foram aplicadas e convivemos com vários dispositivos que, até hoje, não foram regulamentados. Houve avanços democráticos, no entanto lidamos, no presente momento, com expressivos retrocessos politicos.

 

Belluzzo ao invés de exaltar mudanças e propaladas conquistas democráticas,  deplora a continuidade de estruturas arcaicas, que subsistiram neste cenário pantanoso, graças aos chamados governos de coalisão, às espúrias alianças políticas, reprodutoras do Centrão, capitaneado por forças conservadoras que desaguariam na campanha de Collor. Este conglomerado que anunciava o direito à educação para promover a legitimação do ensino privado.

 

Convivemos com celebradas e vetustas biografias, infensas ao exercicio crítico da História, cultivadas por indefensável  troca de deferencias, que incensam personalidades abjetas e atentam contra a sociabilidade. Convalidam o patrimonialismo, as práticas consuetudinárias e políticas economicas, concebidas como caudais da especulação e da espoliação financeira.

 

Com muita propriedade, Belluzzo assinala:

 

A estrutura de classes no Brasil é muito original: na cúspide, os predadores que disputam os despojos da riqueza velha; no meio, os trouxas e os espertalhões ideológicos das camadas falantes semi-ilustradas; lá embaixo, os "ferrados" que tentam desesperadamente emergir da miséria.

 

Temos uma constituição cidadã, que discrimina direitos, porém não assegura a cidadania. Estabelece deveres do Poder Público,  mas não prevê a existencia de  instrumentos formais que imponham sua efetivação.

 

Estes poderes, chamados públicos, abrigam elites parasitária e seus serventuários de escalões subalternos, que se utilizam do aparelho de Estado para viabilizar o patrimonialismo por meio da secular exproriação do patrimonio público e da sonegação de direitos sociais.

 

No aparelho de Estado, as elites instalam suas casamatas Servem a si  próprias e a remanescentes do regime militar, que ainda nos ameaçam. Não abrigam apenas seus agentes, escondem seus métodos execráveis.

 

Deste modo, assistimos a conciliação permissiva que integra opostos, forças inconciliáveis.. Vale-se de conceitos e palavras ambiguas, para nos confundir e enganar. Para viabilizar práticas que atentam contra nossos direitos.

 

As  casamatas das elites, ainda estão erguidas no aparelho de Estado, por meio dela são exercidos os poderes que nos intimidam e nos aviltam.  Servem à deplorável corrupção e ao clientelismo promiscuo. Foram reconstruídas e pavimentadas pela licensciosidade de gestores públicos, sequiosos de se manter em suas funções a qualquer custo.

 

Dependentes dos beneficiários de seus favores, não hesitam em promover a degradação do espaço publico em prol de seus interesses restritos.

 

Pois bem, na UFCG também tivemos a nossa Constituinte. Tivemos expressivos avanços democráticos, mas também lidamos com retrocessos. Porém o mais grave é que preservamos a nossa estrutura de classes.

 

Na universidade, que se pretendia nova e disputava uma estrutura administrativa inovadora realizamos a nossa Estatuinte nos idos de 2002. Pouco conseguimos mudar.

 

No entanto, até hoje, eximimo-nos de realizar balanço crítico desta significativa experiência democrática,  que se converteu num dos marcos institucionais da UFCG.  Por que tememos avaliá-la ?

 

Recordamo-nos que, ao final da Estatuinte, insistiíamos  em que se desencadeasse  processo de avaliação sistemática, que nos permitisse continuamente identificar aspectos críticos, superá-los coletivamente e aprimorar atividades realizadas na universidade. Este processo estaria centrado na inusitada figura Pró-Reitoria de Avaliação. 

 

O que temos? Absolutamente, nada.

 

Acrescente-se que a auto-avaliação é processo obrigatório em instituições de ensino superior do país. As universidades públicas devem realizá-las regularmente para aferição de seus planos institucionais, seus objetivos, suas diretrizes e seus compromissos sociais.

 

Convivemos a duras penas com entulhos, provenientes da grande política, e nossos escombros miudos, provocados por sequelas da nossa própria atividade acadêmica Apesar da  Constituinte e  nossa efervescente Estatuinte, não nos sentimos no gozo da democracia participativa, da efetividade da função pública da UFCG, que tanto defendemos.

 

Na universidade pública, também há práticas que não foram regulamentadas, porém mantêm estruturas de poder,  hierarquias administrativas e vícios funcionais,  similares aos que questionamos no cenário político atual,  que depõem contra a nossa consciência, contra a democracia postulada em anos precedentes e na atualidade.

 

Resquicios de licenciosidade e de clientelismo ainda consomem as virtualidades desta instituição pública destinada à educação. Posperam por meio de liturgia velada que instrui ações administrativas. Exercitada por meio de concessões, de acordos complacentes, da oferta de comendas, de deferencias mútuas, que asseguram a autolegitimação, favorecem o absenteismo, a privatização miuda e o desprezo à educação pública, gratuita e de qualidade.

 

Na universidade pública, assim como na grande política, picadas da mosca azul  infligiram-nos dolorosas perdas. ( Frei Betto).  Reduziram o vigor da consciência crítica, do empenho e do comprometimento com a defesa  da educação pública.

 

Celebramos a Constituinte e nossa efervescente Estatuinte, que proporcionaram algumas conquistas, porém nos deixaram rescaldos amargos. Assistimos à universidade pública sofrer reveses, operados por métodos controversos, que se credenciam por meio de apelos à democracia ambigua.

 

No entanto, é preciso que se diga, precisamos derrubar nossas casamatas.

 

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG

 



[1] BELLUZZO, L.G. A Constituinte e os donos do Brasil Valor Economico URL :

http://www.valor.com.br/opiniao/3289206/constituinte-e-os-donos-do-brasil#ixzz2gSGtrQo6 em 01 de outubro de 2013


Data: 04/10/2013