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Novo manual de psiquiatria é lançado em meio a críticas

Reportagem da Folha de S. Paulo diz que 'Bíblia' americana dos transtornos mentais é recebida com decepção por não usar biologia em diagnósticos 

 

O livro que orienta a atividade de psiquiatras do mundo inteiro ganha amanhã uma nova versão num lançamento com certo sabor de derrota.

 

A quinta edição do DSM (Manual de Estatísticas de Diagnósticos), da APA (Associação Psiquiátrica Americana), promete tornar mais coerentes os critérios de definição de transtornos mentais, mas deve deixar de nortear pesquisas que conectam a prática clínica à ciência de ponta feita nessa área.

 

A festa de lançamento do livro ocorre no encontro anual da APA, que começa amanhã em São Francisco, nos Estados Unidos.

 

A declaração que criou um clima de desconforto para o evento, porém, partiu da periferia de Washington, onde fica o NIMH (Instituto Nacional de Saúde Mental), principal órgão de financiamento à ciência psiquiátrica nos EUA.

 

Às vésperas do encontro, o diretor da instituição, Thomas Insel, disse que pretende distanciar do DSM o esforço de pesquisa básica em saúde mental. O objetivo é criar, no longo prazo, um novo sistema diagnóstico dentro de um projeto capitaneado pela instituição, o RDoC (Critérios no Domínio da Pesquisa, sigla em inglês).

 

A ideia é tentar tornar a psiquiatria um ramo da medicina mais objetivo, mais científico e baseado na biologia.

 

"Não podemos ter sucesso se usarmos como padrão ouro' as categorias do DSM", escreveu Insel no blog do instituto duas semanas atrás. "O sistema de diagnóstico tem de ser construído sobre dados de pesquisas emergentes, não sobre as categorias atuais baseadas em sintomas."

 

A declaração provocou reação por parte da APA, que reconhece ter sido incapaz de criar um sistema diagnóstico baseado em neurobiologia, promessa que vinha sendo feita desde a década de 1970.

 

As alterações da quinta edição do DSM em relação à quarta não contemplam esse objetivo.

 

Apesar de alguns transtornos terem sido excluídos e outros criados (veja quadro nesta pág.), a base do manual ainda são os sintomas, e não a neurobiologia.

 

Segundo a associação, é preciso manter a prática clínica tradicional enquanto não há ciência suficiente para uma transição cuidadosa.

 

"Esforços como o RDoC são vitais para o progresso de nossa compreensão coletiva sobre transtornos mentais, mas não podem nos servir aqui e agora", escreveu David Kupfer, chefe da força-tarefa do DSM. "Devemos entregar a nossos pacientes uma outra nota promissória dizendo que algo vai acontecer alguma hora?"

 

Referência

 

Anteontem, a APA e o NIMH tentaram aplacar o clima de animosidade emitindo um comunicado conjunto, dizendo que suas missões são "complementares".

 

As entidades também ressaltaram a importância de uma referência sólida de critérios para ser usada por planos de saúde e por governos. O Brasil usa a Classificação Internacional de Doenças, da Organização Mundial de Saúde, semelhante ao DSM.

 

Um dos motivos para a decepção com o manual foram os testes de campo para a criação de novos transtornos propostos durante a fase de elaboração do DSM.

 

Os testes falharam em dar suporte à existência de algumas categorias, como o "transtorno misto de ansiedade e depressão" e a "autoagressão não suicida". Nenhum desses deve entrar na nova edição do manual.

 

Além de receber críticas por parte de quem defende uma psiquiatria mais biológica, o DSM será lançado em meio a ataques de entidades de classe de psicólogos.

 

Uma petição que pedia a adoção de uma abordagem mais humana e menos farmacológica na psiquiatria ganhou a assinatura de 14 mil profissionais de saúde.

 

(Folha de S.Paulo)


Data: 17/05/2013