Artigo - O ensino superior e a regulamentação da profissão de designer (Parte I) Wagner Braga Batista A análise de qualquer processo social exige a recuperação histórica de sua origem e de seu transcurso. Este procedimento nos permite contextualizar o que estamos analisando, bem como fazer projeções, realizar prognósticos e indicar possíveis tendências deste processo. O grupo social que despreza sua História incapacita-se para constituir identidade e coesão orgânica. Esta advertência é relevante para desenhistas industriais e designers ao se defrontarem com o processo de regulamentação da profissão. Enfatizamos que o processo de regulamentação da profissão, ora tramitando na Câmara dos Deputados, está sujeito a condicionamentos históricos que nos remetem a alguns desafios e questões, entre elas: Como se formou e se moldou este campo profissional? Quais suas peculiaridades? O que identifica o profissional desta área? Não podemos nos eximir da tentativa de respondê-las. Observamos que a nossa atividade se insere no amplo espectro das profissões liberais. Para exercê-las exige-se que os profissionais tenham formação superior. Donde se infere que, uma vez regulamentada a profissão, seu exercício implicará em que todo profissional seja graduado nesta área de atividade. Profissionalização e educação formal caminham juntas. Ao examinarmos os nexos que se estabelecem entre a formação e a prática profissional, partimos do pressuposto que a qualidade da atuação profissional é indissociável da qualidade da formação educacional. Quando falamos de requisitos essenciais para o reconhecimento e a regulamentação da profissão não podemos ignorar as práticas profissionais vigentes e os padrões de qualidade dos cursos de desenho industrial e de design. Estes indicadores de desempenho são imprescindíveis para fundamentar a defesa da regulamentação da profissão. Com este objetivo, procuraremos articular indicações de avanços no campo educacional com a conquista da visibilidade e do reconhecimento da atividade profissional. Levantamento feito em abril de 2012 no cadastro de cursos do EMEC- Banco de dados do INEP, ofereceu-nos o seguinte quadro:
Fonte: BATISTA, Wagner- Contribuição para a análise dos processos de avaliação dos cursos de Desenho Industrial e Design , Anais do X Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, São Luis, UFMA, 2012. Em setembro do corrente, algumas mudanças quantitativas já se faziam notar. Pudemos constatar a existência de 779 cursos de bacharelado e tecnológicos cadastrados neste Banco de Dados do INEP, sendo 698 de design e outros 81 de desenho industrial. Destes, 178 encontram-se extintos ou em processo de extinção. Estes cursos, realizados em regime presencial, estão distribuídos em todo país, salvo nos estados do Acre e Tocantins, nos quais são oferecidos apenas na modalidade a distância. Concentram-se na região sul / sudeste, com maior densidade no Estado de São Paulo, que responde pela oferta de 255 cursos, 32, 7 % deste total. Se por um lado é significativa a expansão do ensino de graduação, que oferece lastro para a atividade profissional e fortalece a defesa da regulamentação da profissão, por outro lado há que se reparar a deficiente qualidade dos padrões educacionais, expressos pelo desempenho insatisfatório de 8,47 % dos cursos existentes, sinalizado pelo Conceito Preliminar de Curso- CPC igual a 2 ou 1. Ou seja, há expressiva indicação de disparidades, de lacunas e de deficiências na formação de desenhistas industriais e designers. O quadro da pós-graduação também é deveras significativo. Oferece indicações bastante positivas do aprimoramento da formação acadêmica e da pesquisa em nossa área de atividade em sintonia com a expansão da pós graduação strictu senso no Brasil.
CAPES URL: http://conteudoweb.capes.gov.br/conteudoweb/ProjetoRelacaoCursosServlet?acao=pesquisarRegiao Data Atualização: 19 de setembro de 2012 Legenda: M - Mestrado Acadêmico D - Doutorado F - Mestrado Profissional M/D - Mestrado Acadêmico/Doutorado Ainda que os programas de pós-graduação estejam concentrados na região sudeste, o que provoca enormes dificuldades para a capacitação de profissionais de estados do norte e nordeste, torna-se auspiciosa a existência de centenas de doutores e mestres distribuídos em todo o pais, bem como o registro de 8 programas de pós graduação em desenho industrial e design e 20 cursos específicos ou congêneres neste nível de qualificação.
Data Atualização: 19/09/2012 Legenda: M - Mestrado Acadêmico D - Doutorado F - Mestrado Profissional M/D - Mestrado Acadêmico/Doutorado O avanço do ensino de graduação e a subsequente formação de 8 programas de pós-graduação específicos e duas dezenas de cursos congêneres, refletiram-se no desenvolvimento de projetos de pesquisa e de extensão, consolidados em resultados que fornecem visibilidade a esta área de conhecimentos. Oferecem, também, a percepção de que esta atividade não é apenas empírica e operacional, uma vez que requer contínuo e sistemático aprofundamento teórico e científico. Sou de uma geração, que sofreu um abrupto corte em sua formação provocado por medidas repressivas e pela influencia ideológica dos articulistas do regime militar. Fomos induzidos a supor que os estudantes e profissionais de desenho industrial e design não gozavam de modo pleno de suas faculdades mentais e estavam proibidos de pensar. Neste contexto, prevaleceu a lógica empirista que condenou o design a ser refém de manuais técnicos e do empirismo que inibiam a reflexão, a pesquisa e a elaboração teórica. A defesa da regulamentação da profissão é indissociável da melhoria dos padrões de qualidade do ensino de Desenho Industrial e Design. A expansão vertiginosa do ensino privado na década de 1990 e as limitações do precário Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior- SINAES contribuem para a existência de enormes hiatos no desempenho educacional. Atualmente há 767 cursos de Desenho Industrial e Design, implantados em todo território nacional. Cursos de Design a distância, com padrões de qualidade questionáveis, são ofertados em quase todo país, exceto no Estado do Paraná. Sob outro prisma, a existência de 93 cursos em processo de extinção, 23 de Desenho Industrial e 70 de Design, bem como de 94 extintos, 13 de Desenho Industrial e 71 de Design, revelam grandes disparidades no ensino. A análise da expansão desordenada dos cursos evidencia a inexistência ou fragilidade de política educacional e de estratégias de planejamento em instituições de ensino superior. Face à quantidade de cursos e a estimativa de formandos ao final de cada semestre letivo somos levados a presumir que a cada ano 7 mil desenhistas industriais e designers ingressem no mercado de trabalho. O impacto sobre mercado de trabalho saturado e permeável a relações profissionais adversas é visível. Egressos de cursos deficientes encontram barreiras maiores e se veem na contingencia de desenvolver atividades incompatíveis com sua formação, além de se sujeitarem a condições de trabalho que depõem contra estatuto profissional desejado. A consolidação do processo de regulamentação impõe a definição de padrões de qualidade educacional compatíveis com o elevado nível que se almeja para o exercício da profissão. Em que pesem estas advertências convém enfatizar o que é proeminente e positivo em nosso campo de atividades. É salutar que tenhamos alguns excelentes cursos de graduação, programas de pós-graduação consolidados, teses e dissertações com reconhecido padrão de qualidade, centenas de grupos de pesquisa formados, periódicos científicos indexados, eventos técnicos científicos sendo realizados desde 1994, entre outras evidencias que comprovam a qualificação profissional de alto nível, exigência basilar para o exercício legal desta profissão. A nosso ver, uma vez aprovada no Poder Legislativo e sancionada pelo Poder Executivo, a efetividade da regulamentação profissional estará apoiada num tripé: 1- A qualidade da formação educacional; 2 - A proficiência técnica dos profissionais; 3 - O aprimoramento do senso crítico e ético dos integrantes desta área de atividades. Toda formulação esquemática, presumidamente didática e de fácil assimilação, é limitada. Porém adotamos este procedimento porque, a nosso ver, duas dimensões do processo de regulamente são imperativas. Uma que precede a regulamentação, a consistente formação propedêutica dos estudantes. Outra que nos remete a uma visão prospectiva, a prevalência do senso crítico e ético no tratamento de questões afetas ao exercício da profissão regulamentada. A luta pela regulamentação da profissão não se iniciou ontem. Temos um amplo legado de experiências que deve ser recuperado e valorizado a bem da história do desenho industrial ou design no Brasil. Passadas algumas décadas, quase meio século de tentativas de regulamentação da profissão , desde a formulação do Estatuto da Associação Brasileira de Desenho Industrial- ADI, em 1963, podemos registrar sete experiências das infrutíferas de aprovação de sete projetos de lei com este objetivo. Quadro sinóptico
BATISTA, Wagner- Contribuição para a análise dos processos de avaliação dos cursos de Desenho Industrial e Design Anais do X Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design, São Luis, UFMA, 2012 No momento, defrontamo-nos com uma situação auspiciosa. Encontra-se na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania- CCJC, da Câmara Federal, o Projeto de Lei 1391, de autoria do deputado José Luiz Penna, que nos oferece novo horizonte na luta em defesa da regulamentação da profissão. Esta sinalização requer a sensibilidade, o compromisso, o envolvimento e a mobilização de todos estudantes e profissionais de nossa área. É mais um aceno e um passo na direção de um cenário que pode se configurar na melhoria nas condições de trabalho, a exigência de qualificação profissional e a imposição de preceitos éticos que dignifiquem o exercíico profissional. Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG Data: 15/10/2012 |