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EUA questionam educação superior

Crise e falta de emprego para quem sai da universidade fazem maioria dos americanos achar que ela não compensa gastos. No país, ensino público não é gratuito; em 25 anos, mensalidades subiram 467%, ante uma inflação de 107%

 

Na esteira da crise econômica, os EUA vivem uma mudança de paradigma no que se refere à importância conferida à educação superior. Cada vez mais gente questiona se vale a pena investir na qualificação acadêmica.

 

Esse questionamento se espalhou tanto que já foi criado o termo "bolha educacional" para descrever os efeitos da cultura generalizada de que todo mundo deveria ir para a faculdade.

 

"Essa tendência de rever a "síndrome da universidade para todos" não é nova", disse à Folha o economista Robert Lerman, que estuda educação e emprego no Instituto Urban de Washington. "Mas, com o desemprego em 9,1%, a atenção a ela aumenta."

 

Por um lado, o mercado não dá conta de absorver as hordas de formandos nas faculdades; por outro, a dívida adquirida para pagar universidades caríssimas já ultrapassa a de cartões de crédito para americanos -deve chegar a US$ 1 trilhão em 2011.

 

Em 2010, 68,1% dos que terminaram o ensino médio se matricularam em universidades no ano seguinte, segundo o Birô de Estatísticas do Trabalho. Entre 1972 e 1980, essa taxa era de 50%.

 

No entanto, só 56% dos que se formaram em universidades em 2010 tiveram ao menos um emprego até agora. Outros 22% estão desempregados, e 22% estão em empregos para os quais não necessitam do diploma.

 

"O grande problema é que não desenvolvemos alternativas de alta qualidade para quem não tem diploma superior", diz Lerman. "Isso é ruim para os estudantes e para a produtividade do país."

 

Valor

 

A mudança de atitude já é visível nas pesquisas. Estudo do instituto Pew deste mês mostra que mais da metade (57%) dos adultos americanos acham que a educação superior não vale o que é preciso gastar para se formar.

 

O ceticismo se alia à explosão dos preços de cursos. Enquanto a inflação para o consumidor subiu cerca de 107% de 1986 até o fim de 2010 nos EUA, mensalidades de universidades aumentaram 467% no mesmo período.

 

De acordo com o Conselho de Faculdades dos EUA, para cursos de quatro anos, um diploma universitário custa em média US$ 30 mil para quem vai a instituições públicas (que não são gratuitas) e US$ 109 mil para as privadas.

 

Apesar do debate, os dados ainda mostram que quem tem curso superior se dá melhor no mercado americano. O desemprego para esse grupo, 4,5%, é menos da metade em relação aos que têm só ensino médio (9,7%).

 

Bolsa incentiva quem deixa faculdade por 2 anos

 

Nos EUA, já há quem invista contra a crença de que todos devem ir à universidade.

 

Peter Thiel, cofundador do PayPal e um dos primeiros investidores do Facebook, anunciou no fim de maio 24 vencedores de bolsas criadas por ele para desenvolver empresas de inovação tecnológica: cada um ganha US$ 100 mil, com a condição de que larguem os estudos superiores por pelo menos dois anos.

 

As bolsas foram criadas no ano passado e receberam mais de 400 inscrições. Entre os vencedores estão Laura Deming, 17, que desenvolve terapias antienvelhecimento, e John Burnham, 18, que trabalha para extrair minerais de asteroides e cometas.

 

Thiel diz que sua iniciativa aborda dois problemas dos EUA: a "bolha da educação superior" e a lentidão no desenvolvimento de tecnologias inovadoras.

 

"Não estamos dizendo que todo mundo deveria abandonar a faculdade. Mas o problema é que, em nossa sociedade, a regra é que todo mundo tem que entrar nela."

 

Segundo ele, a "bolha educacional" se parece com a imobiliária e a tecnológica -duas que já estouraram, com enorme prejuízo para o país. "Há uma bolha sempre que algo é supervalorizado."

 

Grandes nomes do aglomerado tecnológico do Vale do Silício são usados como exemplos de gente que se deu bem sem concluir faculdade, entre eles Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, e Bill Gates, da Microsoft.

 

Burnham ganhou a bolsa e deixou os estudos, com a aprovação dos pais. "O programa dá a muita gente que talvez não conseguisse entrar em Harvard a chance de participar de algo tão seletivo e valioso quanto -e tão educacional quanto", afirmou.

 

Jovens entre 16 e 24 anos enfrentam nível de desemprego de quase o dobro do resto da população, chegando a 18,4%. É o pior número nos 60 anos em que o Instituto de Políticas Econômicas recolhe os dados.


Data: 13/06/2011