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Artigo - Marcos André-Quito

Wagner Braga Batista

 

 

A Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas-FACISA, durante o período de 28 a 30 de setembro do corrente, durante a Semana de Arquitetura, apresenta vários trabalhos de seus alunos e homenageia o professor Marcos André, in memorian, com uma mostra de seus desenhos.

 

É uma justa homenagem que deve ser valorizada.

 

Conheci Marcos André Guimarães, ou Quito (1957- 2009 ), como era carinhosamente chamado, quando  eu ainda lecionava no curso de Desenho Industrial, da UFCG.

 

Quito foi estudante do Programa de Pós Graduação de Sociologia e professor substituto do Curso de História da UFCG. Posteriormente, lecionou na FACISA.

 

Conversamos muitas vezes, por longo tempo. Reportou-se a suas viagens, a trabalhos realizados em cidades européias e me falou sobre vários aspectos do planejamento urbano. Com mais detalhes discorreu sobre cidades litorâneas e os portos que tivera a oportunidade de conhecer. Com a curiosidade de um leigo, pude observar que Quito sentia-se fascinado com esta experiência.

 

Essas conversas tornavam-se incomuns, numa universidade minada pelo empobrecimento cultural, pela obsessão imediatista e pelo pragmatismo.

 

Depois, enveredou por outra seara, onde também arrisco alguns passos. Seu interesse pelo cinema e pelo rico acervo da locadora de vídeos KF, localizada na Feira Central, também botou lenha e acrescentou tempo as nossas conversas.

 

Em outra oportunidade, prestava assistência a um aluno. Novamente Quito teve uma atitude inusitada. Entrou na minha sala e se utilizando de uma folha de papel, com grande destreza e rapidez, representou vários planos em projeção, facilitou enormemente a explicação que pretendia fornecer ao estudante.

 

Aos poucos, descobria as suas inúmeras aptidões. Nesta oportunidade, revelava-se o desenhista Quito.

 

Podemos dizer que arquitetos e desenhistas industriais ou designer têm grandes afinidades. Não necessariamente são portadores de habilidades semelhantes. Alguns tendem a valorizar algumas aptidões em detrimento de outras. Mais ou menos racionalistas, têm maior ou menor sensibilidade para as razões do projeto. Uns valem-se do traço seco, outros da poesia.

 

Paradoxalmente, cada vez menos arquitetos e designers ocupam-se de desenhar. Quito não era um deles.

 

Legitimamente, socorrem-se de recursos técnicos ao seu alcance. Encontram soluções compatíveis com  exigências de seus projetos. Nada mais. Ganham em eficiência técnica, perdem em criatividade. Involuntariamente despojam-se de sensibilidade. Perdem ao não perceber as infinitas possibilidades de cada desenho e as inúmeras descobertas que advém da meticulosa concepção de cada projeto.

 

Quito mostrou-se avesso às facilidades e às inevitáveis formalidades acadêmicas. Aos currículos prenhes de referencias fantasiosas sem correspondência com resultados tangíveis. Aos discursos que nos remetem a realizações que pouco têm em comum com seus autores. Às deferências que exacerbam o produtivismo vazio e a esterilidade de tantas titulações e certificados. Parecia alheio e indiferente a estas formalidades.

 

Com a habilidade, característica de quem se sente acima destas vicissitudes, flutuava acima de terrenos pedregosos. Como um anjo chapliniano,  bailava com esmerado mister sobre diferentes áreas de conhecimento. Com a elegância de um dançarino que sabe o que faz e não esmorece, apesar das circunstancias adversas.

 

Pois bem, Quito prematuramente se foi. Deixou em todos nós significativas lembranças.

No íntimo, creio que tenha feito uma clara opção em sua vida.

 

Há uma comparação, feita pelo poeta Mario Quintana, que me parece bastante lúcida e pertinente. Ilustra com fidelidade a vida de Quito.

 

Para Quintana, há dois traçados na vida. A linha reta, o percurso mais seguro e insípido para alcançar um objetivo. Segundo o poeta, a linha sem imaginação. Há também os desafios impostos pelas linhas sinuosas. Que exigem criatividade e talento. Impõem dúvidas e hesitações. Criam embaraços.

 

No entanto, arremata Quintana, a linha curva é mais fecunda. É o caminho mais prolífico e agradável entre dois pontos.

 

Quito preferiu percorrer este caminho.

 

 

Wagner é professor aposentado da UFCG


Data: 28/09/2010