topo_cabecalho
Artigo - Promessa é dívida

Wagner Braga Batista

 

A um palmo do nariz, nada se via.

As névoas tenebrosas tinham coberto a manhã do Rio de Janeiro, neste dia 26 de agosto de 2010.

O General Garrastazu e as hordas fascistas conspiraram noite inteira para entristecer o Rio.

Queriam impedir outro dia de sol no Rio de Janeiro. Urdiam mais um funesto complô.  Após o calamitoso plano da semana anterior, quando seqüestraram Muricy Ramalho e clonaram todo o time do Fluminense, maquinavam outra ação sinistra. Insatisfeitos com a ascensão das grandes massas, queriam interditar a felicidade coletiva e a alegria das torcidas, especialmente da imensa torcida tricolor.

Mais uma vez, ver-se-iam frustrados.

À véspera o Fluminense vencera mais uma partida.  Dera um show de bola. Ganhou apenas de três a zero para não tripudiar do adversário.

 Irados com a vitória tricolor, General Garrastazu, seus sequazes e torcionários, tentaram uma cruel retaliação contra os humildes. Investiam covardemente contra inocentes mulheres, idosos, trabalhadores, desempregados, excluídos e marginalizados que estavam a mercê deste plano sinistro. Queriam imergir, novamente, no frio do inverno todo o povo do Rio. De forma solerte, pretendiam lançar a cidade inteira no reino das sombras. Sem perspectiva democrática, valiam-se do terror e do voluntarismo. Como alternativas, restavam-lhes apenas o obscurantismo, as trevas e as névoas tenebrosas que barravam o sol e cobriam a manhã do Rio.

Mas o Fluminense fez, novamente, o sol brilhar. Cedeu sua luz ao sol, fez renascer o futebol e a alegria no Rio.

Times brasileiros, europeus e latinoamericanos entraram pânico. Apavorados com a iminência da derrota prevista, mudavam as cores da camisa, de nome e até de país. Recusavam-se subitamente a jogar futebol. Com medo do Fluminense transformaram-se em ONGs, em franquias religiosas e agências de produção de mentiras.  Sentiam-se derrotados de antemão. Como dizia Mario Vianna, com dois enes, viam-se  como perus e porcos, aves que morrem de véspera.

Meus amigos, o futebol está perdendo a graça. Com tanta vitória anunciada de véspera.

Nas bolsas de valores, agiotas e especuladores estão angustiados. Não conseguem fabricar incertezas. Posto que o time do Fluminense ao pisar nos gramados aboliu definitivamente especulações e incertezas.

Porém, este time vitorioso está se tornando deselegante e mal educado.  Convidado à casa de adversários, comporta-se inadequadamente. Não é cerimonioso e modesto, serve-se à mesa e não pede licença para varrer a casa. Comporta-se no campo dos seus adversários como se estivesse no seu quintal ou na sua cozinha. Pior, bate sem nenhum respeito ou misericórdia nos anfitriões. Por cinco vezes consecutivas, como visitante, como se estivesse em seu domicilio, fez barba e bigode na casa de anfitriões.

Muricy Ramalho, um homem de palavra, filho de família honrada e de bons modos, com sua serenidade peculiar, já admoestou o jovem time do Fluminense. Pacientemente, deu vários conselhos aos seus atletas: Não abusem da hospitalidade e nem batam nos anfitriões.

Mas nesta manhã no Rio, dia 26 de agosto, o sol, como o Fluminense na véspera, se impôs.

Nada de névoas, lamúrias ou choro.

A nova vitória do Fluminense revitalizara o Rio. Arrastou botequins e subúrbios para o lugar dos shoppings. O povo para sua verdadeira história. Vestiu o Rio com verde, vermelho e grená. Alegrou a cidade desolada com o longo período de frio. Trouxe calor, aqueceu as almas e cordialidade às ruas. Animou homens que sentiam frio e a conversa fiada nos bares, esquinas e praças.

A décima primeira vitória tricolor disseminou a cordialidade por todo  Brasil.  Em Campina Grande, Caruaru e Caratinga, velhinhos comunistas saíram em passeata. Homenageavam o ressurgimento da cordialidade. 

Em Bodocongó,  caçotes e cururus, coaxaram dias e noites em louvor à gentileza do Flu.

Com as luzes e o calor do Fluminense,  o Brasil se regozijava. O calor voltara à alma do povo que sentia orgulho de ser brasileiro.

Eu, agnóstico por ofício, aproveitei o belíssimo dia e fui a trezentas e quarenta e duas igrejas, bem como a cento e três terreiros,  pagar promessas. Lembrem-se, amigos, promessa é divida. Mesmo aquelas que se  faz calado, que se murmura para ninguém ouvir ou se diz com os dedos cruzados, ficam registradas. Tem que ser pagas.

Graças às promessas e às orações, as tramas do general Garrastazu não surtiram efeito e estavam sendo anuladas. Os juízes ladrões saíram de cena.Houve o irreversível ascenso das massas. E o Flu caminha célere para novas vitórias.

Por conta deste compromisso inarredável, levei meus olhos agnósticos, meus ouvidos incrédulos e meus joelhos marxistas  para pagar promessas.

Lá estava eu, genuflexo, subindo os mais de trezentos degraus das escadarias da igreja da Penha, com os joelhos, materialistas por convicção,  em carne viva. As promessas doendo e sangrando aos borbotões.

A dor era intensa, mas a alegria era muito maior do que a dor. Ao meu lado, milhões de comunistas, socialistas e anarquistas, também genuflexos, subiam as escadarias da Penha para pagar promessas.

Irmanados na torcida do Fluminense e no pagamento de promessas, não perdíamos de vista nossos compromissos históricos, o vigor crítico e a perspectiva de mudanças revolucionárias para 2011... depois que o Fluminense se sagrar campeão brasileiro de 2010.

 

Wagner Braga Batista é professor aposentado da UFCG


Data: 26/08/2010