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Geração Y causa mudanças em relações no trabalho

Novos perfis desafiam empresas a repensarem modelos de gestão

 

Mesmo faltando um ano e meio para encerrar o contrato de estágio numa montadora automobilística, Felipe Schiavo, 22 anos, estudante de Ciências Contábeis da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), decidiu partir para uma nova oportunidade. O objetivo era buscar algo que lhe garantisse maiores chances de crescimento. Seguiu para PWC (PricewaterhouseCoopers) - multinacional do segmento de auditoria e assessoria tributária e empresarial - e, num prazo de um ano e dois meses, conseguiu a promoção de trainee para assistente.

 

Schiavo conta que ingressou na PWC pelo interesse no plano de carreira que a empresa oferecia. "Ela oferece cursos de inglês, auxílio para universidade e oportunidades de trabalho no exterior. Além disso, tenho liberdade para propor novas ideias e dar minha opinião", destaca o estudante, que se demonstra bastante satisfeito com seu desenvolvimento dentro da organização. Ele espera, no entanto, que esse crescimento continue com a mesma rapidez.

 

A postura de Schiavo é característica do grupo responsável por uma série de mudanças nos modelos de gestão dentro das empresas: a chamada Geração Y. Com modo diferenciado de aprender, trabalhar e se comunicar, esses novos profissionais desafiam o mercado de trabalho a se reposicionar e repensar suas estratégias de organização e motivação. É o que garante João Baptista Brandão, professor da FGV-EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas). "Essa geração se inicia a partir de 1980, quando começam a surgir crianças e jovens centrados em tecnologia", resume Brandão.

 

Hélvio Tadeu Cury, professor de administração da PUC Minas (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais) aponta a influência das tecnologias, bem como a grande quantidade de informação da vida contemporânea no dia a dia da nova geração. De acordo ele, essa familiaridade com o ambiente virtual é o divisor de águas entre essa e as gerações anteriores. "Eles têm facilidade em trocar informações e experiências por meios virtuais e isso faz com que se comportem de uma forma diferente das outras gerações, que nunca na história tiveram essa oportunidade", explica Cury.

 

Diferenças que, segundo Brandão, também estão relacionadas ao panorama do mercado de trabalho. Ele diz que a geração antecessora - nomeada de Geração X - passou por períodos agudos de instabilidade no mercado de trabalho e teve de batalhar por segurança na carreira e na vida financeira. Em contra partida, os jovens da Geração Y, na opinião do professor, ganharam a autonomia que seus pais não puderam usufruir. "Os pais tinham propósitos centrais de oferecer aos filhos o que não tiveram. Essas crianças foram educadas com liberdade muito grande e acesso à tecnologia, sendo capazes de realizar várias tarefas simultaneamente", afirma ele.

 

Aliado às tecnologias, o acesso à informação também adicionou à Geração Y uma forte característica questionadora. "Desde a infância, essas pessoas não aceitam ser contrariadas sem motivo. Se elas ouvem não, querem entender o motivo dessa negação", acrescenta Brandão. Por sua vez, o professor de administração da PUC Minas explica que a interação por meio dos meios virtuais e a globalização expandem a forma de se comunicar, negociar e aprender, o que muda radicalmente o comportamento dos jovens. "A abrangência não é mais limitada. Onde tem informação, esses jovens estão. Eles aproveitam os conteúdos porque não estão restritos à região, cidade ou país em que atuam", diz Cury.

 

Mercado de trabalho

 

Outra particularidade da geração Y apontada pelo professor da PUC Minas é a maior associação entre a teoria e prática. "O que possibilita a atração de novas possibilidades dentro e fora do mercado de trabalho", enfatiza Cury. As mesmas características desenvolvidas no convívio familiar e social, segundo Brandão, são transportadas para o mercado de trabalho, quando esses jovens iniciam suas carreiras. Ele indica que as pessoas da Geração Y, também chamadas de Millennials ou Geração da Internet, esperam encontrar no ambiente corporativo a mesma liberdade de questionamento e de comunicação que utilizam na vida pessoal, o que muda as relações hierárquicas e os métodos de trabalho. "Em consequência do rápido desenvolvimento tecnológico que vivenciam, a Geração Y está acostumada a mudanças frequentes e buscam resultados mais rápidos", aponta o professor da FGV.

 

Brandão destaca ainda que essa é uma das maiores diferenças de atuação das gerações X e Y. Enquanto os trabalhadores de 31 a 45 anos tendem a enxergar a empresa como uma família e costumam trabalhar por mais tempo numa mesma instituição, a parte da Geração Y que já se iniciou profissionalmente com idade entre 20 e 30 anos - enxerga o trabalho como parte da vida. "Almejam resultados e crescimento dentro de curtos períodos de tempo, o que culmina em maior mobilidade profissional", completa ele.

 

A Geração Y também pretende diminuir a rigidez e a formalidade dos padrões hierárquicos, pois, de acordo com Brandão, espera de seus gestores um diálogo mais aberto. "Se a relação com o chefe não é adequada, esse profissional deixa a empresa. O que faz com que eles permaneçam num emprego é o ambiente, a figura de um chefe com quem possa se comunicar de igual para igual", esclarece ele, que aponta também a forma como as características de questionamento e imediatismo chegam aos projetos profissionais. "Esse colaborador quer encontrar sentido no trabalho. Sua concepção de futuro é diferente e ele espera resultados imediatos", acrescenta o professor.

 

Imediatismo também confirmado por Cury, que relaciona a característica ao aumento da tendência da mobilidade. Segundo ele, esse público é ambicioso e busca sair da estabilidade para buscar novos desafios constantemente. "A Geração Y aposta na mudança como uma possibilidade de crescimento. Esses profissionais não querem ficar 20, 30 anos numa empresa. Eles renovam seu currículo com freqüência e querem ganhar dinheiro rapidamente, pois são consumidores natos", ressalta o professor. Além de crescimento rápido, Brandão cita que os jovens esperam ainda retornos contínuos dos gestores. "Querem saber se correspondem ou não às expectativas da empresa. Caso não, buscam compreender o que podem fazer em relação a isso", diz ele.

 

Com todas essas mudanças, a tendência do mercado de trabalho é dar preferência a profissionais com esses perfis. É o que diz Cury. Isso porque, segundo ele, os jovens não têm medo de investir na carreira e sabem se desenvolver em períodos de dificuldade. "A Geração Y ganha valorização porque aposta na crise e na instabilidade. Onde há escassez, esse tipo de profissional consegue produzir". Brandão afirma ainda que atualmente o principal desafio das empresas é desenhar novos modelos de gestão. "As lideranças, geralmente de outras gerações, não estão preparadas para lidar com esses jovens. Algumas, no entanto, já se reorganizam, até porque esses profissionais possuem bons conhecimentos e preparação, com potencial para gerar resultados importantes", analisa ele.

 

A convivência de gerações

 

A Geração Y surgiu num contexto diferente de sua antecessora. Enquanto a X presenciou períodos de crise econômica e altos índices de desemprego, a Y se adaptou ao risco da crise e se familiariza com esse contexto. Acostumada com as mudanças, tem interesse em se atualizar e conhecer vários tipos de tecnologia e áreas de atuação. "A geração anterior ficou com medo de empreender e arriscar o emprego porque pensava que pudesse perder as oportunidades, mas esses jovens não têm medo de arriscar. Eles perceberam que têm possibilidades que antes ninguém teve e isso dá a eles mais coragem", conta Brandão.

 

O professor da FGV indica outro ponto de distanciamento entre as duas gerações. "A X construiu sua carreira em torno da empresa, ao contrário da Y, que se preocupa em construir a carreira a partir de conhecimento prático. Os jovens trabalham querendo antever se seu esforço poderá trazer algum resultado concreto", compara Brandão.

 

O aprendizado também é diferenciado entre ambas as formações. De um lado, a Y que aprende pela descoberta, estuda um pouco e parte para a prática. Do outro, a X que se baseia amplamente em teoria e pensa em hipóteses para depois se lançar para o desenvolvimento na prática. "A atual geração é pouco disciplinada para cumprir trabalhos mais intensos e extensos, porque sua capacidade de atenção contínua é menor em relação à geração anterior e seu processo cognitivo é menos introspectivo", ressalta Brandão. Ele aponta que, dessa forma, a Geração Y trabalha melhor em projetos de curto prazo.

 

Cury finaliza destacando o benefício da convivência entre gerações diferentes. Segundo ele, é possível aproveitar o caráter questionador e a pró-atividade da nova geração para inovar a troca de conhecimento. "O choque de gerações se transforma numa possibilidade de novas buscas e novas abrangências. É possível aproveitar esse questionamento para gerar novas experiências", enfatiza ele.

 

GERAÇÃO X

 

- Testemunhou o surgimento da tecnologia e de novas ferramentas de trabalho que desenvolveu e implementou

- Presenciou um período de instabilidade no mercado de trabalho. Arrisca-se menos

- Dedica mais tempo para pesquisa e preparação teórica

- Sente-se parte da empresa

- Preocupa-se mais em representar a empresa

- Valoriza a empresa que oferece cursos e qualificação

- Trabalha por muitos anos na mesma empresa esperando por promoção

- Consegue se dedicar por muito tempo num mesmo projeto

- Aprendeu a seguir direcionamentos e cumprir ordens

- Como a comunicação com o chefe era mais limitada, não está acostumada a receber feedbacks

 

GERAÇÃO Y

 

 - Cresceu cercada da tecnologia desenvolvida pela geração anterior e está familiarizada com a informação globalizada e interatividade virtual

- Aprendeu a conviver com a crise e enxerga a instabilidade como uma oportunidade. Busca sempre novos desafios

- Reduz o tempo de pesquisa e prefere aprender a partir da descoberta

- Enxerga o trabalho como parte da vida

- É mais voltada para a própria carreira

- Valoriza a empresa que incentiva seus anseios profissionais e lhe oferece liberdade para se aperfeiçoar

- Tem mobilidade maior e almeja evoluir hierarquicamente em curto tempo

- Realiza várias atividades ao mesmo tempo e prefere se dedicar a projetos de curto prazo que tenham resultados mais rápidos

- Questionadora, procura entender o sentido das atividades em que está envolvido

-Quer diálogo aberto com o chefe para que possa opinar, propor soluções e receber feedbacks.

 

(Universia)


Data: 15/07/2010